30 de março de 2012

L.I.V.R.O.

Por Millôr Fernandes, 1923-2012
(Como homenagem ao genial Millôr Fernandes, nada melhor do que reproduzir um texto genial dele mesmo)
Um novo e revolucionário conceito de tecnologia de informação

Na deixa da virada do milênio, anuncia-se um revolucionário conceito de tecnologia de informação, chamado de Local de Informações Variadas, Reutilizáveis e Ordenadas – L.I.V.R.O.
L.I.V.R.O. representa um avanço fantástico na tecnologia. Não tem fios, circuitos elétricos, pilhas. Não necessita ser conectado a nada nem ligado. É tão fácil de usar que até uma criança pode operá-lo. Basta abri-lo!
Cada L.I.V.R.O. é formado por uma seqüência de páginas numeradas, feitas de papel reciclável e capazes de conter milhares de informações. As páginas são unidas por um sistema chamado lombada, que as mantêm automaticamente em sua seqüência correta.
Através do uso intensivo do recurso TPA – Tecnologia do Papel Opaco – permite-se que os fabricantes usem as duas faces da folha de papel. Isso possibilita duplicar a quantidade de dados inseridos e reduzir os seus custos pela metade!
Especialistas dividem-se quanto aos projetos de expansão da inserção de dados em cada unidade. É que, para se fazer L.I.V.R.O.s com mais informações, basta se usar mais páginas. Isso, porém, os torna mais grossos e mais difíceis de serem transportados, atraindo críticas dos adeptos da portabilidade do sistema.
Cada página do L.I.V.R.O. deve ser escaneada opticamente, e as informações transferidas diretamen-te para a CPU do usuário, em seu cérebro. Lembramos que quanto maior e mais complexa a informação a ser transmitida, maior deverá ser a capacidade de processamento do usuário.
Outra vantagem do sistema é que, quando em uso, um simples movimento de dedo permite o acesso instantâneo à próxima página. O L.I.V.R.O. pode ser rapidamente retomado a qualquer momento, bastando abri-lo. Ele nunca apresenta “ERRO GERAL DE PROTEÇÃO”, nem precisa ser reinicializado, embora se torne inutilizável caso caia no mar, por exemplo.
O comando “browse” permite fazer o acesso a qualquer página instantaneamente e avançar ou retroceder com muita facilidade. A maioria dos modelos à venda já vem com o equipamento “índice” instalado, o qual indica a localização exata de grupos de dados selecionados.
Um acessório opcional, o marca-páginas, permite que você faça um acesso ao L.I.V.R.O. exatamente no local em que o deixou na última utilização mesmo que ele esteja fechado. A compatibilidade dos marcadores de página é total, permitindo que funcionem em qualquer modelo ou marca de L.I.V.R.O. sem neces-sidade de configuração.
Além disso, qualquer L.I.V.R.O. suporta o uso simultâneo de vários marcadores de página, caso seu usuário deseje manter selecionados vários trechos ao mesmo tempo. A capacidade máxima para uso de mar-cadores coincide com o número de páginas.
Pode-se ainda personalizar o conteúdo do L.I.V.R.O. através de anotações em suas margens. Para isso, deve-se utilizar um periférico de Linguagem Apagável Portátil de Intercomunicação Simplificada – L.A.P.I.S. Portátil, durável e barato, o L.I.V.R.O. vem sendo apontado como o instrumento de entretenimento e cultura do futuro. Milhares de programadores desse sistema já disponibilizaram vários títulos e upgrades utilizando a plataforma L.I.V.R.O.

9 de março de 2012

Uma análise do capitalismo global

Na era da hipocrisia: um novo mundo, um novo capitalismo O maior ideólogo e articulista do Financial Times, porta-voz do mercado financeiro, escreveu um longo artigo indicando as sete lições para corrigir o capitalismo, que ele considera a "ideia mais brilhante da humanidade": em síntese, corrigir as práticas irregulares, fazer os ricos pagarem os impostos, distribuir a tributação não para os perdedores, faz questão de registrar, mas para os "filhos dos perdedores". E termina com um apelo: "esforcemo-nos para torná-lo melhor". Quem sabe com um pouquinho maior de esforço, não acabamos logo de enterrá-lo.

O artigo é de Najar Tubino, jornalista, e publicado por Carta Maior, 02-03-2012.

Eis o artigo.

Essa é uma viagem sobre as conversas, debates, fóruns que ocorreram no início do ano trágico de 5126, o último ano do calendário maia. Quando dois outros calendários de povos antigos - chineses e judeus - apontam para uma coincidência histórica, o número 3. O ano do dragão 4710, na soma dos números indica 12. O ano de 5772, dos judeus, a soma é 21. Os dois resultam em 3, o número da superfície, como definiu Pitágoras de Samos ( cerca de 580/78-497/6 AC), o homem que traduziu o funcionamento do planeta em números. Será o ano em que o capitalismo vai tremer nas bases?

Aliás, só não começou, porque o Banco Central Europeu deu um presente de Natal aos 523 bancos do velho continente, a 1% de juros ao ano, com três de prazo para pagamento. A dose foi reforçada no apagar das luzes de fevereiro com mais 530 bilhões de euros, nas mesmas condições. Uma medida com objetivo de evitar uma quebradeira maior que a do Lehman Brothers, em 2008.

Portanto, essa é a viagem na era de impostura, da falsidade, das falsas devoções, a era da hipocrisia, a nossa própria era capitalista.

O "Super Mário", como os articulistas do mercado financeiro apelidaram o italiano Mário Draghi, presidente do Banco Central Europeu, nos anos 2002-2005 ocupou uma diretoria do Goldman Sachs. Foi ele o responsável pela muralha de dinheiro, que impediu a falência do sistema bancário europeu. O Goldman, por sua vez, está em recessão teve que cortar o salário do chefe, LLoyd Blankfein pela metade - U$S 7 milhões.

Enquanto isso, no mundo emergente, o Brasil começa a preparação da Rio +20, conferência da ONU, pretende reunir 50 mil pessoas e 150 chefes de estado, na visão dos diplomatas que coordenam a organização. O orçamento do evento foi aprovado pelo Congresso Nacional no final de 2011: são R$ 430 milhões, sendo R$ 230 milhões para segurança, 190 milhões para logística, 30 milhões para aluguel de espaços, como o Riocentro. onde se concentrarão as discussões. Na cidade do Rock, as estandes das empresas sustentáveis - bancos, mineradoras, petrolíferas, montadoras, varejistas. No aterro do Flamengo, o "Território do Futuro", onde os representantes da sociedade civil encaminharão suas propostas.

PASSARAM 40 ANOS, O FUTURO VIROU PRESENTE

"Uma Terra Só", foi o lema da primeira conferência da ONU, em Estocolmo, na Suécia, em 1972. Resumia a preocupação com o futuro do planeta e as alternativas para resolver a situação. No mesmo ano, um grupo de empresários, cientistas e técnicos, lançavam os "Limites do Crescimento", pelo Clube de Roma, anunciando o desastre se os métodos de crescimento econômico não mudassem em 100 anos. Como todo documento europeu, tinha uma preocupação com o crescimento da população, diga-se, dos pobres, e da possibilidade de não haver matéria-prima suficiente para todos.

"Nosso Futuro Comum", foi um outro documento da ONU, liderado por uma dirigente da Dinamarca, na Comissão Bruntland. Em 1997, na Rio +5, quando as entidades da sociedade civil colocaram um "mentirômetro" na porta do hotel no Rio, onde o evento acontecia, o lema tratava do "futuro que queremos". Um novo mundo de paz, crescimento justo, fim da miséria, uso de energia limpa, uma economia de baixo carbono.

Em 2011, a ONU anunciou que dos 24 serviços ambientais que recebemos gratuitamente do planeta, 60% estão degradados. O Programa do Meio Ambiente da ONU (PNUMA), anunciou que precisamos de U$S 1,3 trilhão, para promover a economia de baixo carbono em 10 setores chaves, como indústria, transporte, energia e agricultura.

AMNÉSIA À BEIRA MAR

Aproveitei a onda de calor de Porto Alegre, conhecida atualmente por Forno Alegre, a maior seca em 60 anos, mais a onda de frio na Europa do leste, e repassei os documentos aprovados e anunciados com suas metas estabelecidas, nos últimos anos. Principalmente, na Eco-92, considerada a maior conferência do gênero, e reuniu 120 chefes de estado, 4 mil ONGs e 15 mil pessoas, no mesmo Rio de Janeiro. Os burocratas que organizam anualmente esses eventos têm uma preferência clara por cidades à beira mar, como Cáncun, onde realizaram a conferência climática de 2010, ou Durban, na África do Sul, no ano passado. Evento que enterrou o Protocolo de Kyoto, desde o anúncio da negativa de participação da Rússia, Canadá e Japão, na próxima etapa.

Kyoto foi aprovado no Japão com a presença de 170 chefes de estado, em 1997. Só entrou em vigor em 2005, quando a Rússia resolveu aderir, dando assim a percentagem final - mais de 50% das emissões de gases estufa -, necessária à implantação. Porém, a amnésia é um dos ingredientes nos eventos dessa natureza.

AGENDA 21: 800 PÁGINAS, 40 CAPÍTULOS

Eu não li as 800 páginas de documentos aprovados na Eco 92, na chamada Agenda 21, com quatro seções e 40 capítulos. ´Li um resumo de 160 páginas do professor José Carlos Barbieri, da Escola de Administração, da Fundação Getúlio Vargas. O documento foi chamado de "Guia da Humanidade". E realmente era. A primeira seção abordava as dimensões sociais do desenvolvimento sustentável, a cooperação internacional, padrão de consumo, população, saúde. Tem sete capítulos. A seção II tem 14 capítulos, envolve as dimensões ambientais, a atmosfera, os oceanos, os ecossistemas frágeis, a biodiversidade. A seção III engloba os grupos sociais envolvidos, mulheres, jovens, índios, trabalhadores, empresários, ONGs. E a seção IV refere-se aos meios para implantar os programas e as atividades recomendadas nas seções anteriores, incluindo recursos financeiros, transferência de tecnologia, educação.

Diz o professor Barbieri:

- Cada capítulo apresenta, via de regra, uma introdução ao problema e as áreas de programas de ação com objetivos, atividades e meios de implementação, com as estimativas de recursos financeiros necessários".

Os países ricos, que ainda são os mesmos, se comprometeram a doar 0,7% do PIB, na época o volume da economia mundial estava em torno de U$S 16 trilhões, o que dava uma verba de U$S 112 bilhões ao ano. Mas as estimativas da Agenda 21 apontavam que seriam necessários em torno de U$S 607 bilhões por ano, durante o período 1993-2000, na implantação da atividades recomendadas, em vários de seus capítulos.

REINVENTAR A CIVILIZAÇÃO INDUSTRIAL - EM 1997

Mais uma citação do professor Barbieri:

- Muito do que foi tratado na Agenda 21 e em outros documentos aprovados na CNUMAD ( a conferência de desenvolvimento sustentável) não saiu do papel. Muitos chefes de governo apoiaram propostas e acordos internacionais contrários as suas convicções e compromissos partidários, face às pressões exercidas pela exposição dos temas na mídia internacional e a vigilância ruidosa de muitas ONGs, mas pouco fizeram para ratificá-los e implantá-los em seus países".

Maurice Strong, ex-dirigente do Banco Mundial, foi o presidente do Conselho da Terra, em 1997:

- Precisamos reinventar a civilização industrial, anunciava ao público, que produziu riscos para a sobrevivência da espécie humana... a mais bem sucedida, mas sem controle. Nosso futuro está em nossas mãos, podemos gerar uma era de boas notícias para a família humana".

Mikail Gorbachev, um líder ainda respeitado dizia: " a civilização chegou ao seu fim, exauriu suas possibilidades. Temos que chegar a um consenso sobre novos valores".

Ainda em 1992, 140 ganhadores do Prêmio Nobel, lançaram um documento onde afirmavam:

- Com as tecnologias atuais em 30, 40 anos acontecerão mudanças irreversíveis na biosfera. Até 2015, no ritmo atual, podem desaparecer entre 1 e 11% das espécies nas florestas tropicais, com taxas de desmatamento acima de 15 milhões de hectares ano, ou 150 mil km2".

Na Amazônia se desmatou mais de 20 mil km2 por ano, nesta época. As espécies sumiram, e grande parte das florestas também. Vieram os anos do neoliberalismo, da globalização do sistema financeiro, das privatizações do mundo em desenvolvimento, a era Bush, duas invasões de países, com mais de U$S 2 trilhões em gastos na guerra ao terror. A economia gera U$S 45 trilhões de riquezas, 1 bilhão de pessoas passam fome, dois bilhões não tem água, dois terços dos americanos estão acima do peso.

INDÚSTRIA DE EMBALAGEM FATURA U$S 739 BILHÕES

Mais de um bilhão de carros, com cinco novas montadoras se instalando no Brasil, o quarto mercado mundial de veículos. Os EUA comemoram o renascimento das montadoras nativas (GM e Chrysler, sob comando da Fiat). Em 2012, a meta é vender 13,9 milhões de carros, quando vendiam 17 milhões em 2007. Não vão alcançar a China, com seus 18 milhões. Qual será a meta da indústria mundial de veículos: 2 bilhões de carros. Quem sabe 3 bilhões? Como será São Paulo com 12 milhões de carros, o dobro da frota atual?

Vejamos as estratégias definidas pela Agenda 21:

- Estimular o uso mais eficiente de energia e recursos, reduzir os resíduos ao mínimo, estimulando a reciclagem, redução do desperdício na embalagem de produtos e a introdução de novos produtos ambientalmente saudáveis. Estabelecer políticas de preços que incorporem os custos ambientais. Reforço aos valores que apoiam o consumo responsável, através da educação, de programas de esclarecimento público, publicidade de produtos ambientalmente saudáveis".

A indústria de embalagens no planeta vai faturar U$S 739 bilhões até 2014, 60% com embalagens para consumo, uma parte, em embalagens de papel, onde o consumo cresce mais, junto com papel higiênico. A Stora Enso, com 85 fábricas no mundo, no Brasil participa da Veracel, na Bahia, está transferindo sua sede mundial, na área de negócio de Biomateriais, para um escritório no Itaim Bibi, capital paulista.

No volume de U$S 447 bilhões de dólares gastos em publicidade no mundo, talvez, uma mínima percentagem seja destinada aos produtos "saudáveis".

UM NOVO CHAMARIZ

Hipocrisia ainda é um termo muito polido e educado como retrato das condições atuais do planeta. Por exemplo: o PNUMA, com sede em Nairóbi, no Quênia, responsável pelos programas de meio ambiente da ONU, tem um orçamento em torno de U$S 100 milhões, e 80 países, dos 193 da entidade, participam. As verbas são doadas por contribuições do Japão e do Reino Unido. Não tem o poder da Organização Mundial de Saúde para definir leis e regulamentações sobre qualquer assunto ligado a sua área. Então, qual a nova ideia para atrair os chefes de estado ao Rio de Janeiro: a criação da agência internacional do meio ambiente. Ideia que nem o Brasil, o anfitrião, concorda. Mas dá, vamos dizer, um novo chamariz ao evento.

O tema da Rio+20 é "desenvolvimento sustentável no contexto da erradicação da pobreza". O debate, entre os diplomatas brasileiros, e europeus, principalmente, é sobre a orientação das discussões. Mais para o lado ambiental, como querem os europeus, ou para a "economia verde", como defendem os brasileiros. Muitos debates estão acontecendo pelo país.

Entidade como a Confederação Nacional da Indústria, a Confederação Nacional da Agricultura, o Instituto Ethos, onde participam grandes empresas, a Associação Brasileira de Agronegócio. Esta última realizou um debate no Mackwsoud Plaza, em São Paulo com o título "Despertar para a Rio +20", onde o ex-ministro da Agricultura, além de agricultor e dirigente da Fiesp, Roberto Rodrigues, opinou que "tem muito medo dessas reuniões gigantes se transformarem em uma imensa masturbação intelectual". O presidente da Abag, Luiz Carlos Carvalho disse que o tema do encontro não é o meio ambiente, mas a sustentabilidade.

CRÉDITO PARA RESERVA LEGAL COM EUCALIPTO

Já a presidente da Associação Nacional da Indústria de Papel e Celulose, Elizabeth Carvalhães, defendeu a recuperação das áreas degradadas e a concessão de crédito para os produtores, além de um código florestal moderno. Reserva legal para eles é plantio de eucalipto, é a monocultura industrial, que insistem em chamar de floresta. Tem mais: ainda pretendem colocar as "florestas" como sumidouro de carbono, porque sugam 1 bilhão de toneladas de CO2. Se fosse descrever o esquema industrial com seus aditivos químicos, o principal deles o cloro, usado no branqueamento da celulose e do papel, com seus derivados como a dioxina, ia faltar espaço.

O Instituto Ethos definiu nove diretrizes e três metas para a Rio+20: economia verde, redução das desigualdades e combate à corrupção. As diretrizes são todas cópias da Agenda 21. Aliás, esta é a questão, Talvez fosse muito mais sustentável distribuir aos participantes uma cópia das 800 páginas, já definidas e não implantadas, 20 anos atrás.

PROGRAMADOS PARA QUEBRAR

Mas a vida segue. E a economia também. O capitalismo reinante ainda é o da obsolescência programada, conforme o caderno especial do jornal Valor Econômico, publicado no final de janeiro. Obsoleto, que está em desuso, saiu da moda, ou como deve ser aplicado o termo atualmente- programado para quebrar. É assim que funciona a indústria do século XXI. O período para troca de geladeira e lavadora de roupas era de 10 anos. Agora é de 5,6 anos.

Em 2009, foram lançados 163 modelos de televisores de tela plana. Em 2011, foram 256. A oferta dos tipos de celulares: de 116 para 175. De computadores de mesa - de 476 para 835. Em 2005, a LG tinha quatro modelos de fornos de micro-ondas, hoje, são 120. A outra coreana, a Samsung tinha 10 passou para 200. A explicação da indústria é a seguinte: a taxa da obsolescência encurta à medida que a inovação tecnológica acelerou e o processo de produção ficou mais barato.

O cálculo da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe) é que o lixo cresce a um ritmo maior do que a população, 6,9% em 2010. No Brasil a produção de lixo alcança 60 milhões de toneladas ano, sendo 60% destinado a aterros sanitários e 40% aos lixões.

50 BILHÕES DE APARELHOS CONECTADOS

A quebra programada de produtos foi uma estratégia da indústria lançada após a segunda guerra mundial. Faltavam consumidores, então, o negócio era fazer os mesmos, comprarem novamente, novos produtos. Vamos dar uma reforçada com os números dos produtos eletrônicos adorados pelos modernos consumidores das metrópoles, das cidades pequenas, vilarejos. Em 2012, serão vendidos 103 milhões de tablets, a última maravilha da era digital. As vendas de pcs, computadores de mesa, deverá crescer 4,5%, para cerca de 370 milhões de unidades. E a Intel lançou na feira de Las Vegas, a maior de eletrônicos, o ultrabook (registrou o nome), para concorrer com smartphone e tablet - é um laptop mais fino, mais rápido, mais sensual, mais...

Serão vendidos, segundo a empresa de pesquisa Gartner INC., 657 milhões de smartphones em 2012. Já existem 800 milhões ativos. Computadores são 1,5 bilhão e logo chegaremos aos 2 bilhões. Segundo a multinacional de equipamento Ericsson, existem 7 bilhões de dispositivos conectados no mundo, isso inclui, telefones, computadores, eletrodomésticos, carros lâmpadas, sapato, vou sugerir - vaso sanitário -. Em 2020, serão 50 bilhões.

- A seu modo, informa a empresa, cada um desses itens precisará de componentes que permitam a eles se conectarem a redes, exibir informações ou até mesmo processar alguns dados".

BLACKBERRY VIROU CRACKBERRY

A Intel domina 80% de chips para computadores no mundo, e teve receita de U$S 43 bilhões, em 2010. O aparelho da Rim, empresa canadense, conhecido por Blackberry ganhou um apelido no mercado de executivos, logo ele, que era o brinquedinho favorito dos executivos abonados: "crackberry". Recentemente a Volkswagen, que pretende ultrapassar a Toyota na produção de carros no mercado global, produzindo mais de 8 milhões de unidades, lançou um comunicado, depois de acordo com os sindicatos, onde os funcionários só podem receber telefonemas de trabalho ou email, 30 minutos antes e após o expediente. O presidente executivo da Volks, Martin Winterkorn parabenizou os trabalhadores ao completarem 38 turnos extras e por terem produzido 50 mil veículos adicionais, no final de 2011.

Emergentes aquecidos representam 67% do crescimento da economia mundial, segundo o Goldman Sachs, e somarão 59% de todo o PIB global em 2030. Seus cidadãos botaram o pé na estrada, entupiram aeroportos e baixaram em Nova York com toda a força; a cidade recebeu 50 milhões de turistas, 655 mil brasileiros, que só estão atrás de ingleses e franceses, em gastos.

Os brasileiros vão às compras no exterior, gastaram U$S 21 bilhões, enquanto os estrangeiros não gastaram 7 bilhões nas belezas tupiniquins. Contando o juro das prestações e dos cartões de crédito gastos internamente, a montanha cresce muito. Segundo o professor Yoshiaki Nakano, da Escola de Economia de SP, da Fundação Getúlio Vargas, os brasileiros pagam por ano R$ 130 bilhões em juros. O cara compra um veículo, paga dois, uma máquina de lavar, também, uma televisão de tela plana, também.

UMA FALHA TÃO GRAVE NO MERCADO

É por isso, que dois economistas de mercado, fãs de carteirinha, como assinalou Eduardo Giannetti da Fonseca, professor do Insper, e André Lara Resende, um dos criadores do Real, abriram o verbo. Primeiro Giannetti, em entrevista ao Valor:

- Eu, que sou fã da economia de preços e de mercado, hoje, percebo que ela padece de uma cegueira absurda, que é o modelo como usamos os recursos ambientais. O sistema de preços é completamente omisso em relação ao custo ambiental de nossas escolhas de produção e consumo. Não sinaliza a gravidade de que estamos fazendo com, o espaço biológico de que nossa vida depende".

Outro trecho:

- O sistema de preços vai ter de mudar. Ele padece de uma falha tão ou mais grave no longo prazo do que o planejamento central. Nunca imaginei que diria isso na vida. É muito sério e está em tudo. Nunca se imaginou que o sistema de preços e a economia competitiva de mercado, capaz de gerar riqueza, tivesse uma falha tão grave".

Giannetti cita um exemplo sobre o aparelho de ar-condicionado nos Estados Unidos. Em 1960, 80% dos condomínios não tinham ar condicionado, o equipamento era caro e o custo de energia elevado. Hoje, 84% dos condomínios têm o aparelho. Entre 1993-2005 a eficiência energética do ar-condicionado aumentou 20%, enquanto o consumo médio por aparelho aumentou 35%. Ficou tão barato que os donos deixam o aparelho ligado.

- A China, entre 1997 e 2007, triplicou o número de aparelhos. Vai crescer 10 vezes o uso de ar-condicionado entre 2005-2030. Com o compressor cada vez mais barato e a eficiência maior, o consumo de energia vai aumentar. Essa conta não fecha. Tecnologia não é a resposta".

ECONOMIA MUNDIAL SERÁ OBRIGADA A PARAR DE CRESCER

No final de 2011 a China fechou uma outra conta: 690 milhões de cidadãos do país estão morando em cidades, contra 656 milhões continuam no campo. Em 1979, 81% dos chineses moravam na zona rural. No mundo, dos 7 bilhões, 51% moram na zona urbana.

André Lara Resende escreveu um longo artigo para o Valor - Os novos limites do possível - , onde trata do mesmo tema, um pouco mais profundamente. Citando o ex-ativista do Greenpeace, agora professor de sustentabilidade da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, Paul Gilding, lançou recentemente um livro sobre o destino do modelo econômico atual.

Lara Resende destacou a tese do professor inglês:

- A economia mundial será obrigada a parar de crescer. Como não houve uma transição antecipada, como não nos preparamos para uma economia estacionária, seremos obrigados a enfrentar uma parada brusca, profundamente traumática. O momento da tomada de consciência do fim do crescimento e da necessidade de uma profunda reorganização da economia não está longe. Questão de, no máximo, mais uma década. Diante da falha do sistema de preços e da incapacidade de tomarmos medidas preventivas, chegamos ao limite sistêmico. As múltiplas dimensões desse limite estão todas interligadas. Ao romper-se uma delas o processo se acelera e aumenta a probabilidade de que outros também venham a ser rompidos".

Para completar o raciocínio, segue Lara Resende:

- Atingimos o limite físico do planeta. Para evitar uma catástrofe de grandes proporções seremos obrigados a tomar medidas de emergência, extremamente duras, com o estabelecimento de cotas. Seremos obrigados a reconhecer o que, apesar das evidências, nos recusamos a ver: não há como viabilizar 7 bilhões de pessoas, com o padrão de consumo e as aspirações do mundo contemporâneo, nos limites físicos da Terra. O crescimento baseado na expansão do consumo de bens materiais está no seu capítulo final. A eventual parada súbita da economia chinesa seria a pá de cal na esperança de uma saída harmoniosa, para o impasse em que a economia mundial se encontra".

Resumindo: o crescimento pode não ser mais a opção de saída para a crise. Lara Resende ainda alerta que não está se discutindo nem uma abordagem nova sobre o tema: "o mecanismo psicológico de autoengano, da negação dos fatos, segue inabalável".

LIVRAR O CAPITALISMO DO LADO SOMBRIO

Não se pode chamar nem Gannetti nem Resende, que já trabalhou como banqueiro, de ecologistas ou ambientalistas. É por estas e outras, que o debate sobre o rumo do capitalismo entrou em vários fóruns. Em Davos, a elite econômica chegou pessimista, mas se animou com os 489 bilhões de euros do BCE, "uma inundação de liquidez", como comentaram.

O executivo chefe da empresa de consumo Unilever, concorrente da P&G, com faturamento de 46 bilhões de euros, Paul Polman, disse que o capitalismo e o livre mercado devem ser mais sensíveis a questões sociais: "é inaceitável que 200 milhões de pessoas estejam desempregadas". A Revista Time e a BBC, de Londres, animaram acirrados debates sobre a fórmula de "corrigir o capitalismo".

David Rubenstein, um dos fundadores do Carlyle Goup, um dos maiores administradores de fundos do planeta, que embolsou 400 milhões de dólares em salários e bônus, junto com dois de seus sócios no final do ano passado, estava preocupado:

- O capitalismo é o melhor sistema para o mundo, é preciso melhorar as leis e regulamentações para que o sistema seja justo. Temos que investir em inovação e educação.".

Angel Gurria, secretário geral da OCDE, organização que reúne os países ricos, disse que "precisamos livrar o capitalismo do seu lado mais sombrio". Qual deles? Na Europa o índice de desemprego da Espanha é de 22,9%, sendo que as pessoas com até 25 anos 48,7% estão desempregadas. Na Grécia o índice é de 19,2%, na Irlanda de 14,5%. Enfim, a média europeia é de 10,4%.

NOVO CAPITALISMO: CONECTADO E TRANSGÊNICO

José Manuel Barroso, presidente da Comissão Europeia, declarou: "não podemos aceitar que 25% dos jovens da Europa estejam desempregados".

Mas o melhor da festa em Davos, o requintado retiro dos abastados nos Alpes suíços, estava destinado aos representantes norte-americanos. A deputada democrata Nita Lowey, de N. York foi incisiva:

- Os Estados Unidos estão determinados a manter sua força militar e ser o poder predominante no século XXI". E o republicano (senador) Bob Corker completou:

- Os americanos não estão psicologicamente preparados para ter um papel secundário nos assuntos globais".

Como o dono da bola num jogo de futebol, americanos e europeus estão dizendo o seguinte - a bola é minha, só eu ganho. Sem concorrência. Senão, acaba o jogo. No caso do maior aparato militar do planeta, isso pode ter um significado tenebroso.

Chegamos ao novo capitalismo. Depois da quebradeira ou das explosões dos ricos. Como funcionará o novo sistema? Conectado, logicamente. E também transgênico, conforme a previsão da indústria química, que também é a dona das empresas de sementes. Elas plantam 160 milhões de hectares, 30 milhões no Brasil, que é o país que mais investe em transgênicos do mundo em desenvolvimento, onde os índices não param de crescer. A indústria já tem quase 40% do mercado de sementes, que gira U$S 37 bilhões - o dado de 2011 é 13 bilhões. Ela vende uma semente transgênica e um veneno definido, só a planta é imune.

MARK, DO FACEBOOK: A MINHA AÇÃO VALE 10

Vai ser conectado porque são as empresas que mais crescem. O lucro da Apple foi de U$S 25 bilhões, no ano passado. A Google tem U$S 40 bilhões em caixa. O Facebook, do jovem Mark Zuckerberg vai lançar ações na bolsa e pretende captar U$S 5 bilhões. A empresa faturou 3,7 bilhões de dólares, mas a especulação diz que vale U$S 100 bilhões. O Goldman Sachs, na dúvida, investiu U$S 1 bilhão antes de começar a corrida. O mesmo fez o príncipe Alwaleed Bin Talal, saudita, sobrinho do rei Abdulah, investiu U$S 300 milhões no Twitter. Zuckerberg, como novo capitalista, frugal, de jeans, camiseta e tênis, continua com práticas antigas, usada pelo usineiro Rubens Ometto, quando registrou a Cosan Limited, nas Ilhas Bermudas: as ações dele valiam 10 vezes mais do que as vendidas em bolsa. Dessa forma, com 10% do capital ele tinha o controle da empresa. Não é que o rapaz fez a mesma coisa. E ainda vai ser o presidente executivo e do conselho de administração, medida que não passaria nas regras do novo mercado da Bovespa. A diferença com Ometto é o tamanho do salário - o usineiro ganha R$ 13 milhões como presidente do conselho da Raízes (Cosan mais Schell), e Zuckerberg apenas U$S 1,49 milhão por ano.

Se os preços forem internalizados, ou seja, cobrados os custos reais, envolvendo poluição, destruição de ecossistemas, tratamento dos empregados ou colaboradores, como queiram, a Apple vai fechar as portas. Numa pesquisa interna recente, constatou que 62% dos fornecedores tem algum tipo de prática ilegal, principalmente no quesito relações com trabalhadores.

NA ERA DIGITAL, ESCRAVOS MONTAM APARELHOS

Não é por menos. Quase 50% do mercado de produtos eletrônicos terceirizados, inclui, iphone, ipad, Xbox360, da Microsoft, e outros tipos de consoles de jogos são fabricados pela Foxconn, de Taiwan. A empresa é controlada por Terry Gou, de 61 anos, recém casado pela segunda vez, com uma bailarina 20 anos mais moça. Em agosto do ano passado, Gou deu uma festa no maior complexo industrial da corporação em Shenzen, na China. Se misturou a multidão de trabalhadores que dançavam "break", dança de rua americana. Depois anunciou que no futuro suas fábricas terão um milhão de robôs nas linhas de montagem.

A Foxconn tem um milhão de empregados, alguns se suicidaram em 2011 (l4 ou l8, conforme a fonte). Ele mandou instalar redes de arame para cercar os edifícios-dormitórios, onde até 300 mil pessoas vivem.

Um trabalhador da Foxconn, que faturou U$S 80 bilhões em 2011, trabalha 12 horas por dia de segunda à sábado, e ganha pouco mais de 200 dólares por mês - antes dos suicídios eram 1.190. Sem a mão de obra escrava da China o capitalismo acaba no outro dia.

O maior ideólogo e articulista do Financial Times, porta-voz do mercado financeiro, também entrou na defesa do capitalismo. Escreve um longo artigo indicando as sete lições para corrigir o capitalismo, que ele considera a ideia mais brilhante da humanidade: em síntese, corrigir as práticas irregulares, fazer os ricos pagarem os impostos, distribuir a tributação não para os perdedores, faz questão de registrar, mas para os filhos dos perdedores - o problema já é genético. E termina com um apelo: "esforcemo-nos para torná-lo melhor". Quem sabe com um pouquinho maior de esforço, não acabamos logo de enterrá-lo. Esqueci de acrescentar a data, completa dos maias : 21 de 12 de 2012, na soma 11. Número da ruptura ou o início de novos tempos.
http://www.ihu.unisinos.br/noticias/507143-naeradahipocrisiaumnovomundoumnovocapitalismo

7 de março de 2012

A Estrutura do Capitalismo e a Fé Cristã

Pv 13.24: “O que retém a vara aborrece a seu filho, mas o que o ama, cedo, o disciplina”.
Pv 29.17: “Corrige o teu filho, e te dará descanso, dará delícias à tua alma”.
A Análise de Conjuntura tem a função de clarear a realidade e corrigir a rota.

1. A Realidade do Capital
A Ditadura do Pensamento Único para legitimar e reproduzir a Ditadura do Capital diz que não existe a possibilidade de construir outra sociedade além da capitalista. Vivemos na ditadura dos mercados e isso converte o liberalismo em um novo totalitarismo. Vivemos sob a lei liberal, a lei do proveito onde tudo deve ser rentável, incluindo as atividades que antes não estavam sob o mandato do rentável, como a fé. O tipo de indivíduo que o neoliberalismo terminou por criar é hedonista, egoísta, consumista, frívolo, obcecado pelos objetos e pela imagem fashion que emana dele. Os mercados se propuseram a ser uma espécie de remédio para todos os males. Você tem um problema? Pois então recorra ao Mercado e este aportará a riqueza absoluta e a solução dos problemas. Aqui entra a Teologia da Prosperidade para legitimar o sistema. Mas agora nos damos conta de que o mercado acarreta devastações: devasta pela fome 1 bilhão de pessoas, devasta pela mudança climática e devasta os recursos naturais: minérios e biodiversidade, que vão levar à extinção da raça humana. Esse remédio que devia nos fornecer a riqueza infinita não traz senão miséria, pobreza, devastação. O liberalismo foi como uma religião cheia de promessas. Prometeu-nos a riqueza infinita graças a seu operador, o Divino Mercado. Mas não cumpriu a promessa. Seguir deuses falsos dá nisso: escravidão e opressão (Jz 3-6).

Rubens Ricupero afirma: “No ápice de qualquer sistema teológico está naturalmente a doutrina de Deus. Na nova teologia, o pináculo celestial é ocupado pelo Mercado, com maiúscula para significar o mistério que o envolve e a reverência que inspira. O cristianismo afirma que Deus é onipotente, onisciente e onipresente. Da mesma forma o Mercado possuiria esses atributos, nem sempre evidentes, mas que devem ser afirmados na base da fé”.

O filósofo Dany-Robert Dufour diz “As relações entre os indivíduos passam ao segundo plano. O primeiro é ocupado pela relação com o objeto. Essa é a lógica do mercado: o mercado pode a cada momento agitar diante de nós o objeto capaz de satisfazer todos nossos apetites. Pode ser um objeto manufaturado, um serviço e até um fantasma construído pelas indústrias culturais. Estamos em um sistema de relações que privilegia o objeto antes do sujeito. Isso cria uma nova alienação, uma espécie de vício com os objetos. Esse novo totalitarismo que é o liberalismo coloca nas mãos dos indivíduos os elementos para que se oprimam a si mesmos através dos objetos. O liberalismo nos deixa a liberdade de alienarmos a nós mesmos”. (...) “Temos que fazer o indivíduo existir fora dos valores do mercado. O indivíduo do estalinismo foi dissolvido na massa do coletivismo; o indivíduo do nazismo e do fascismo foi dissolvido na raça, o indivíduo do liberalismo foi dissolvido no egoísmo. O indivíduo liberal é um escravo de suas paixões e de suas pulsões. Devemos nos elevar desse caminho sem saída liberal para recriar um indivíduo aberto ao outro, capaz de realizar-se totalmente. Há textos filosóficos de Karl Marx que não são muito conhecidos e nos quais Marx queria a realização total do indivíduo fora dos circuitos mercantis: no amor, na relação com os outros, na amizade, na arte”.

O Neoliberalismo disse: o Capitalismo é o fim da história, não existe futuro, não há esperança, o nosso futuro é o presente, eternamente. Estamos condenados ao presente! Esta é a teologia do deus capital, encarnado na trindade: dinheiro, mercadoria, capital. A única esperança e realização que há é consumir no presente. O consumo de mercadorias é fundamental para o sistema capitalista, pois ele vive da produção de mercadorias a partir da matéria prima tirada da natureza. No processo de produção da mercadoria acontece a geração do mais valor, do lucro que produz o capital, gerado pelo não pagamento de parte do trabalho realizado pelo/a trabalhador/a. Assim, a origem do capital está no roubo. Todo capitalista é um ladrão (rouba legalmente; é um ladrão legal). Jean-Charles-Léonard Simonde de Sismondi (1819) considera que “a riqueza sempre tem por pressuposto a pobreza, e só se desenvolve na medida em que promove a pobreza”. “Parece que já não há países ricos. Só há um bando de gente rica. Gente que ficou rica saqueando a riqueza pública e esgotando os recursos naturais ao redor do mundo” diz Naomi Klein. “E eu pergunto aos economistas políticos, aos moralistas, se já calcularam o número de indivíduos que é forçoso condenar à miséria, ao trabalho desproporcionado, à desmoralização, à infância, à ignorância crapulosa, à desgraça invencível, à penúria absoluta, para produzir um rico?” pergunta Almeida Garret. Por isso: todo rico é ladrão ou filho de ladrão (Mt 19), como dizia o patriarca João Crisóstomo (bispo de Constantinopla, falecido em 407 A.D., que em 402 foi deposto e exilado para a aldeia de Cucusa, fronteira com a Armênia, acusado de não coadunar os interesses da Igreja com as do Império.). Dá para entender.

Como o ser ladrão está no princípio do sistema capitalista as comunidades da IECLB que interiorizaram o sistema também roubam parte do Dízimo a ser enviado ao Sínodo para fazer caixa (no sistema roubar é legal; estão reclamando de que?), porque para as diretorias e membros Igreja se resume à Comunidade e consideram o Dízimo uma exploração, pois não vêem retorno do mesmo. O Dízimo é como um imposto que tem que ser sonegado. Como a ética no capitalismo é: não ter ética, então o que há de errado em sonegar parte do Dízimo? Todo mundo faz, então porque nós não vamos fazer também? O sistema do Dízimo já está como era o sistema de cotas antes da Reestruturação onde predominava a sonegação, que é uma palavra mais bonita para roubo e corrupção. Quem sonega é corrupto e ladrão. Lugar de corrupto e ladrão é na cadeia. Não é isto que se diz sobre os corruptos de Brasília? Isto temos que dizer para as diretorias das comunidades que interiorizaram o capitalismo e sonegam o Dízimo (falo em diretoria porque presbítero é outra coisa: é honesto e santo - Tg 5.14-16). Malaquias 3.8-9 diz: “Roubará o homem a Deus? Todavia, vós me roubais e dizeis: Em que te roubamos? Nos dízimos e nas ofertas. Com maldição sois amaldiçoados, porque a mim me roubais, vós, a nação toda”.

Por que se rouba o Dízimo? Porque a base da comunidade é o pavilhão (não a igreja) que está baseado nos 3X dos alemães: xopps, xurrasco e xixo que dão retorno financeiro e reúnem as pessoas para as festas para arrecadar dinheiro para aumentar o pavilhão para fazer festas maiores para poder aumentar o pavilhão para fazer festas maiores para poder aumentar o pavilhão. Este é o ser comunidade. Esta é a tradição do sul, Paraná para baixo. Quando tem os 3X é fácil reunir 300 a 500 pessoas; para o estudo da Bíblia, Confessionalidade, Realidade espremendo muito se consegue 10 a 15 pessoas. A igreja é uma Associação Cultural e Recreativa com fins Religiosos, uma Empresa de Entretenimento muito eficiente e altamente conceituada na sociedade envolvente em promover bailes, almoços, chás, festas, jantar dançante. Para estes programas a diretoria trabalha uma semana inteira incansavelmente, para o estudo e formação não aparece ninguém deles. Por que? Porque as festas fazem parte da Religião (que tem a função da manutenção do sistema). Não tenho nada contra as festas, só quando elas são o centro da comunidade e não o Evangelho de Jesus Cristo que propõe o Reino de Deus. Há comunidades que não fazem festas, não tem pavilhão e não bebem cerveja, mas tem o mesmo espírito que àquelas porque tem as obras da Lei (o farisaismo) como centro e não o Evangelho, mesmo que não se cansem de dizer: Senhor, Senhor em suas orações e canções gospel. Somos conhecidos pela nossa culinária, pelos nossos bailes, pelas nossas festas, pelas nossas danças típicas alemãs e pelo nosso pavilhão enorme e não somos conhecidos pela nossa luta subversiva com os oprimidos pelo Reino de Deus que propõe construir uma nova sociedade não capitalista pela participação das lutas sindicais, do movimento popular e da política partidária de esquerda. E o Evangelho? O Evangelho é detalhe, pois "a gente do mesmo não consegue fazer o que está na Bíblia, isto é coisa para o/a pastor/a falar, pois ele/a é pago para isto, é o papel dele/a", mas isso é utopia, disse um membro da diretoria da comunidade de Cunha Porã nos anos 80.

Vivemos numa Sociedade de Classes: Proletários e Burgueses com interesses opostos, conflitantes e irreconciliáveis.
1. Proletários – Donos da força de trabalho - produtores
2. Burgueses – Donos dos meios de produção: terra, bancos, indústrias, comércio, máquinas, tecnologia, conhecimento - não produtores
3. Classe média – que oscila entra as duas classes básicas, mas objetiva ser capitalista
Alicerces do capitalismo:
1 - Propriedade Privada dos Meios de Produção
2 - Livre Iniciativa (livre concorrência – liberdade da classe burguesa para explorar a força de trabalho dos proletários)
3 - Trabalho assalariado (+ Exército de reserva de mão de obra)

O sistema é regido pela Anarquia da Produção que gera as crises de superprodução: Grandes estoques – diminuição da produção – desemprego – arrocho salarial – baixa do poder aquisitivo – diminuição das vendas – manutenção dos estoques – diminuição da produção – desemprego – etc. Há ainda as crises de origem financeira como a de 2008. A função de toda crise é a de viabilizar a acumulação concentradora do capital, isto é parte integrante do sistema, como também o desemprego.

Atuação do governo em tempos de crise:
- Governo corta as despesas na área social e aumenta impostos
- Desvalorização da moeda para valorizar as mercadorias para exportação e diminuição das importações
- Arrocho salarial para controlar a inflação
- Privatização de empresas estatais

Rubens Ricupero escreve: Em visita à London School of Economics, em 2008, a rainha Elizabeth II fez a pergunta inocente que estava em todos os lábios: "Como foi que ninguém havia previsto a crise?". Após meses de silêncio embaraçado, um grupo de economistas britânicos se desculpou: "Majestade, o fracasso em prever o momento, a extensão e a gravidade da crise e em evitá-la (...) foi, sobretudo, uma falha da imaginação coletiva de muitas pessoas brilhantes (...) em entender os riscos que corria o sistema como um todo". Não foi a falha de imaginação ou inteligência a culpada da imprevisão. A causa é a ideologia, o disfarce de interesses de classe e setores sob roupagem científica. Os que dão as cartas no Departamento do Tesouro e equivalentes na Europa são os mesmos homens do setor financeiro que prepararam a crise.

João Pedro Stédile diz sobre a crise internacional do capital a partir do discutido no Fórum Social Temático em Porto Alegre de janeiro de 2012:
“Todos concordaram que estamos no início de uma crise, prolongada, que é estrutural do capitalismo, agora globalizado, capitaneado pelo capital financeiro e suas corporações transnacionais. Que os estados nacionais e seus governos estão à mercê dos interesses do grande capital, e de certa forma de mãos amarradas para tomar medidas efetivas que pudessem resolver a crise, sem afetar os trabalhadores.
Todos concordaram que diante da crise, as grandes empresas capitalistas, seus bancos e corporações e seus governos nacionais, se movem e estão adotando as seguintes estratégias:
a) Utilizar os recursos públicos em seu proveito e assim amenizar a crise;
b) Provocar conflitos bélicos regionais, para gerar demandas ao complexo industrial-militar;
c) Reprimir possíveis mobilizações populares, como vem sendo feito em todos países aonde há mobilizações, inclusive nos Estados Unidos e Europa;
d) Se apropriar dos recursos naturais, privatizando-os para as empresas, como forma de transformar o capital fictício em patrimônio, bens efetivos, e assim na próxima etapa os transformam em lucros extraordinários;
e) Transformar os países do hemisfério sul em meros exportadores de matérias primas para suas necessidades;
f) Aumentar o desemprego no hemisfério norte, sobretudo entre jovens e os trabalhadores das indústrias;
g) Que podem usar a Conferência da Rio+20, como teatro internacional para dizer que estão interessados na sustentabilidade e criar um novo marco legal, que lhes dê credibilidade para se apropriarem dos recursos naturais, naquilo que se tem chamado de "economia verde", e seguir acumulando lucros, com colorido verde.

As propostas unitárias para enfrentar a crise.
Diante dessa situação, realizou-se em Porto alegre, como última atividade do Fórum, uma importante assembléia internacional de movimentos sociais, que produziu um documento de análise e selou um acordo unitário, entre todas as iniciativas, para:
a) Denunciar, os estados e governos que estão operando apenas em favor do capital;
b) Denunciar essa máscara de economia verde, como engodo para esconder a verdadeira causa dos problemas ambientais que se reproduzem em todo mundo;
c) Ter claro que os principais inimigos do povo nessa etapa do capitalismo, são o capital financeiro, as empresas transnacionais, e os processos de militarização e repressão que ocorrem nos país;
d) Lutar por uma democracia verdadeira, que supere a mera representatividade formal, a manipulação que os capitalistas estão operando em relação aos governos e construa novas formas de participação popular nos destinos dos países;
e) Esforçar-se para realizar grandes mobilizações de massa em todos os países, contra os inimigos comuns, única forma de podermos alterar a correlação de forças atuais;
f) Defender os recursos naturais de nossos países, como questão de soberania nacional e popular, frente a ofensiva e apropriação privada do capital;
g) Exigir dos governos políticas publicas de proteção aos interesses da maioria da população, em especial os mais pobres e trabalhadores;
h) Realizar esforços para enfrentar o monopólio dos meios de comunicação de massa, que em todos os países manipulam as massas e distorcem as verdadeiras causas da crise e suas graves conseqüências para a humanidade;
i) Redobrar os esforços para construir a unidade entre todas as forças sociais em nossos países e a nível internacional, única forma de enfrentarmos a força do capital;
j) Programar a semana de 5 junho, como a grande jornada mundial, em defesa do meio ambiente e contra as empresas transnacionais;
k) Programar-se para realizar entre 18-26 de junho, no Rio de Janeiro, uma grande mobilização mundial, com acampamento permanente, realizando a cúpula dos povos, em contraposição a cúpula dos governos e do capital. ”

Os antropólogos identificam três elementos básicos presentes em toda a sociedade humana classista:
- infra-estrutura (que consiste nos meios de obter e produzir a energia necessária e os materiais, a partir da natureza – ou seja, os meios de produção: terra, fábrica, bancos, comércio);
- estrutura (que consiste na tomada de decisões entre as pessoas e na atividade de repartição dos recursos)
- super-estrutura (que consiste nas idéias, rituais, éticas e mitos que servem para explicar o universo e coordenar o comportamento humano)

Objetivo do capitalismo: produzir mercadorias, pois é no processo da produção da mercadoria que surge o lucro. Uma palavra de Maurício Botelho, ex-presidente da Embraer, mostra o objetivo do capitalismo: “Não temos nenhum interesse especial pela aviação; nosso objetivo é o lucro”. E, haja lucro! A seguir, a dinâmica do lucro:

Luiz Gonzaga de Souza Lima, autor do livro: "A refundação do Brasil. Rumo à sociedade biocentrada", diz: "O nosso território foi privatizado em 1532, dividido em fatias e entregues a consórcios empresariais internacionais, capitaneado por portugueses, mas reunindo capitais de várias proveniências na Europa, em especial dos países baixos – onde mais tarde nasceria a Holanda –, da Itália e de outros centros. Tal processo se deu dentro dos marcos regulatórios da privatização definidos pela corte portuguesa, que se considerava – com autorização do papa – proprietária deste pedaço do mundo. A privatização foi para sempre, pois era hereditária, conforme o próprio nome indica: capitanias hereditárias. O que foi realizado nestes imensos pedaços de terra concedidos hereditariamente aos novos proprietários? Empresas! Os engenhos eram empresas agro-industriais avançadas, que passaram a produzir para a Europa e para todo o mundo milhares de toneladas de um bem até então raro, o açúcar.

Eram empresas do sistema produtivo europeu, como nos mostra o professor Celso Furtado. Eram internacionais em sua composição, importavam de muitos lugares do mundo e exportavam para o mundo inteiro. O Brasil foi o primeiro elo articulador da economia global. Aqui não existiu uma sociedade humana que tenha dado vida, na sua trajetória histórica, como produto do seu próprio existir, a um tipo novo de economia. No caso brasileiro ocorreu o contrário. Foi um tipo novo de economia, internacionalizada, que criou uma nova organização social dos humanos. Nasceu aqui, formada pela empresa, o que se pode se chamar de Formação Social Empresarial. Essa formação social, própria nossa e que, depois, se espalhará pelo mundo, não deve ser considerada uma sociedade nos termos que se pode compreender os outros sistemas sociais existentes no mundo na mesma época. As outras sociedades se caracterizavam por uma relação entre território, etnias e culturas que não existia aqui. Eram locais, possuíam grande autonomia, produziam para elas mesmas e apresentavam muitas outras características. A empresa, ao contrário, dissolveu sociedades para se estabelecer. Dissolveu as sociedades indígenas que viviam em nosso território e submeteu os remanescentes à servidão e à escravidão. Em seguida, dissolveria muitas sociedades africanas para raptar, sequestrar e transportar milhões de africanos que se transformariam em escravos nessa nova organização produtiva que nasceu.

A maioria dos humanos organizados por esta empresa estava incorporada ao trabalho e excluída até do reconhecimento como ser humano, constituindo-se em propriedade privada. Peças, como eram chamados os escravos. Eram mercadorias, como outra qualquer. Os escravos eram contabilizados como bens, eram comprados e vendidos e sua presença aqui não era fruto de imigração, mas considerada importação. Esses humanos de tipo novo eram incorporados ao trabalho e excluídos de toda a vida social, reservada para uma minoria que se autodenominava de sociedade. Outros milhões de humanos passaram simplesmente a viver uma nova situação desconhecida: a exclusão. Seus territórios foram invadidos e apropriados pela Empresa Brasil, o tal processo de colonização. Foram excluídos dentro de seu próprio país, cuja propriedade lhes foi arrancada. No mundo daquela época, os sistemas sociais serviam para integrar os humanos, reconhecê-los como membros do sistema – mesmo em forma desigual. Aqui não. Aqui o sistema social criou a exclusão.

Olhando o mundo a partir do que ocorreu aqui em 1532 e nos anos que se seguiram, pode-se constatar que, enquanto sistema social humano, a modernidade nasce primeiro aqui na periferia e depois se realizará nos centros decisórios da nova dinâmica social mundial, a Europa. É o contrário do que sempre nos ensinaram. A modernidade tropical antecede a modernidade europeia e antecipa, em mais de um século, as formulações teóricas sobre o que é um ser social moderno. Essa formação social desequilibrada, moderna e, sobretudo, injusta criou o que se pode chamar de desequilíbrio estável. Do ponto de vista formal, durará mais de 350 anos. Suas características estruturais chegam até nossos dias.

Todos os seus recursos, humanos, técnicos, financeiros, etc., eram empregados para garantir o sucesso das empresas aqui instaladas. Esse sucesso era o que se entendia por desenvolvimento. O Brasil colônia não possuía nem transportes, nem escolas, nem estrutura de saúde; não existia organização urbana (as empresas eram rurais...), mas suas empresas estavam entre os mais lucrativos negócios do mundo. ... Ao transformar-se em estado independente, a administração colonial deu vida a um novo tipo de organização estatal: o Estado Econômico Internacionalizado. O Estado Econômico Internacionalizado é aquele cuja finalidade é garantir que as empresas aqui instaladas sejam as mais lucrativas possíveis e manter uma ordem social baseada na pobreza e exclusão da maioria dos habitantes do país."

E em se falando de empresas lucrativas de ontem e de hoje ...
O Banco Itaú se vangloria de ter alcançado, em 2011, o maior lucro da história do sistema financeiro nacional. Açambarcou um lucro de R$ 14,6 bilhões. No mesmo período, em 2011, o Itaú fechou 4.058 postos de trabalho. E as tarifas de serviços que ele cobra dos seus clientes cobrem, representam quase uma vez e meia as despesas de pessoal do banco.

Em 2011 a indústria automobilística, instalada no Brasil, enviou 5,58 bilhões de dólares em lucros e dividendos para suas matrizes no exterior. Esse montante é 36% superior ao valor enviado em 2010. No mesmo período a produção de automóveis aumentou apenas 0,7%. E é essa mesma indústria que reclama incessantemente da carga tributária do nosso país, constantemente reivindica incentivos fiscais e financiamentos públicos de investimentos e não aceita qualquer interferência do Estado nos problemas existentes na cadeia produtiva das montadoras, sejam ambientais ou trabalhistas.

Em meados do ano passado, o Inesc (Instituto Nacional de Estudos Socioeconômicos) divulgou um estudo onde mostrou que, somente em 2009, cerca de US$ 60 bilhões saíram do Brasil diretamente para os chamados paraísos fiscais. Como se sabe, os países tidos como paraísos fiscais atraem dois tipos de crimes: a lavagem de dinheiro (dinheiro do crime, droga, contrabando, tráfico de armas e seres humanos, corrupção, etc.) e a sonegação fiscal.

Em se falando em corrupção: há 1.710 juízes sob suspeita de movimentação financeira acima de seus ganhos, segundo informações transmitidas pelos próprios tribunais ao CNJ. Mas, STJ através do ministro Mello (parente do Collor) barrou as investigações.

Só em 2010 foram retirados da Seguridade Social em detrimento da universalidade da saúde e das ações de assistência perto de R$ 50 bilhões pela DRU - Desvinculação de Recursos da União. Apesar disto a Previdência tem superávit, como provou o Paulo Paim.

Após as mortes de Maria do Espírito Santo e de José Claudio Ribeiro da Silva, casal de extrativistas assassinados em 24 de maio de 2011 no Pará (que ao ser anunciada suas mortes no Congresso Nacional, os deputados aliados dos senhores do agronegócio presentes aplaudiram e vaiaram), a Organização das Nações Unidas (ONU) reconheceu a luta de Maria e José Claudio, dando a eles o prêmio de heróis da floresta. O IBAMA (Instituto Nacional do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis) chegou a fechar as carvoarias, mas agora mais de 100 já estão novamente abertas e em pleno funcionamento. O desmatamento ilegal continua, assim como a grilagem e a venda irregular de lotes. Enquanto isso Laísa Santos Sampaio, irmã de Maria Espírito Santo, está ameaçada de morte e é a próxima na lista a ser assassinada.

“A omissão do Estado em relação à questão agrária e indígena no Brasil é algo que reforça a violência no campo brasileiro enquanto um problema estrutural, ao mesmo tempo em que fortalece a elite agrária e provoca a morte dos povos indígenas. A ação dos fazendeiros se configura por homicídios bem planejados. Não mandam matar qualquer membro da comunidade, mas sim lideranças – sejam eles caciques ou professores. A perda dessas referências para a comunidade traz, em si, o medo como parte do cotidiano. E essa é uma estratégia utilizada pelo agronegócio para o extermínio desses povos. Podemos identificar que no ano de 2010 mais de 152 ameaças de morte foram registradas no país, sendo que 150 ocorreram em Mato Grosso do Sul. Do mesmo modo, dos 398 outros tipos de ameaças sofridas pelos indígenas no Brasil, 390 foram em Mato Grosso do Sul. Entre as tentativas de assassinato, das 22 registradas no país, 17 ocorreram nesse estado. Podemos também lembrar dos dados que dizem respeito aos assassinatos que ocorreram no referido ano: dos 60 que aconteceram em todo país, 34 foram confirmados em Mato Grosso do Sul". A afirmação é do geógrafo Eduardo Luiz Damiani Goyos Carlini. A fronteira agrícola no Brasil sempre foi violenta, pois esta é a dinâmica do capital viabilizada pelo agronegócio. Lembramos a violência contra as Ligas Camponesas nos anos 50-60 e da migração camponesa para o Paraná nos anos 40-50, nos anos 60-70 em Goiás e Mato Grosso, hoje no Pará ocorre o maior número de assassinatos de camponeses.

Segundo reportagem de 1999 a C. R. Almeida, uma das maiores construtoras do país, se apropriou de quase cinco milhões de hectares de terras no vale no rio Xingu, no Pará. O jornalista paraense Lucio Flávio Pinto foi condenado a pagar uma indenização de 8 mil reais por “ofensa moral” ao empresário da construtora por causa da reportagem. A justiça federal de 1ª instância anulou os registros imobiliários dessas terras, por pertencerem ao patrimônio público e a Polícia Federal comprovou o crime, mas não prendeu o responsável pela empresa que faleceu em 2008. Como diz o povo: rico mata o pobre e o cadáver vai preso.

Um grupo de 11 maranhenses que trabalhavam como pedreiros e serventes para a construtora Racional Engenharia na ampliação do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, na região da Avenida Paulista, em São Paulo (SP), foi libertado de condições análogas às de escravidão em ação realizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). O flagrante foi feito com base em denúncia de um trabalhador que teve seu salário retido por dois meses. Os representantes da Racional alegam que os empregados eram terceirizados e que a direção desconhecia as irregularidades encontradas. Os operários tiveram a liberdade restringida, de acordo com Luís Alexandre Faria, coordenador do Grupo de Combate ao Trabalho Escravo Urbano da Superintendência do Trabalho e Emprego de São Paulo (SRTE/SP), devido à retenção de salários e às dívidas contraídas com o empreiteiro da obra. Sem receber, eles acabaram sem poder regressar aos municípios de origem, em Santa Quitéria (MA) e Tutóia (MA).

Luiz Gonzaga de Souza Lima relata: "Observada a quinhentos anos de distância pode-se dizer que a Empresa Brasil, a criação da Formação Social Empresarial e do Estado Econômico Internacionalizado foi como um tsunami permanente, uma tragédia que se abateu sobre a humanidade. Foi uma gigantesca e profunda intervenção sobre a humanidade, modificando-a profundamente. Milhões de habitantes foram dizimados, e outros milhões transportados para continentes diferentes daqueles em que nasceram. Dissolveram-se culturas e etnias. E tudo somente para ganhar dinheiro e para produzir um mundo articulado economicamente para benefício de alguns poucos. Entretanto, esta intervenção gigantesca sobre a trajetória histórica da humanidade gerará outros frutos além da Empresa Brasil e de seus derivados institucionais. Trata-se do povo novo que aqui nasceu e da cultura que este povo criou. ...
Naquele 22 de abril, naquela praia da Barra do Cahy, ficaram cara a cara, frente a frente, dois sofwares sociais. Aquele centrado na vida e na harmonia com a natureza, o software social da vida, das nossas tribos, e aquele dos que chegavam, no qual a vida era uma energia instrumental para ser manipulada com fins de êxitos individuais, da dissolução de povos, culturas e natureza. Era o sofware social da morte que constitui a essência do projeto civilizatório moderno. Prevaleceu o segundo. Muitas humanidades foram destruídas para assegurar a sua afirmação e, junto com essa tragédia humana, foi também destruída e degradada parte significativa da herança cósmica de todas as espécies vivas do planeta terra. O software social moderno terminou por conduzir todas as sociedades a um impasse novo para os humanos. Agora está ameaçada a própria sobrevivência da espécie humana e do planeta terra. É uma questão de vida ou de morte."

A nomeação para o Ministério das Cidades do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) põe a nu as entranhas da aliança entre o “moderno” e o “atrasado” e explicita a natureza e o caráter deste governo de coalizão. O sociólogo Luiz Werneck Vianna diz: "O deputado Aguinaldo Ribeiro é neto do tristemente famoso usineiro Aguinaldo Velloso Borges, chefe de baraço e cutelo do agreste paraibano, acusado de mandar matar, em 1962, João Pedro Teixeira, uma das maiores lideranças dos trabalhadores do campo, então à frente da Liga Camponesa de Sapé, quando se destacou nacionalmente pela firmeza na defesa dos direitos da sua categoria social. Em 1983, o mesmo usineiro Aguinaldo foi, mais uma vez, apontado como responsável por mais um crime político, pois era disso que se tratava, com o assassinato sob encomenda de Maria Margarida Alves, símbolo das lutas feministas no País, cultuada na Marcha das Margaridas, que desde 2000, anualmente, desfila em avenidas de Brasília".
Segundo Werneck Vianna, “está aí a mais perfeita tradução da quasímoda articulação, no processo de modernização capitalista do País, entre o moderno e o atraso (...) Para quem é renitente em não ver, este é o lado obscuro do nosso presidencialismo de coalizão, via escusa em que os porões da nossa História se maquiam e mudam para continuarem em suas posições de mando”. O sociólogo lembra que o deputado federal pela Paraíba Aguinaldo Ribeiro (PP) assumiu um ministério resultante das lutas sociais e criado para se dedicar à erradicação dos problemas estruturais do mundo urbano.

Vandana Shiva lembra sobre seus posicionamentos contra o Banco Mundial, porque ele forçou o Governo da Índia a reduzir subsídios que possibilitavam o funcionamento na distribuição de alimentos. “Eles chamam de subsídios, mas na realidade eram suportes. É necessário gastar para manter os direitos fundamentais de nossa gente. E o Banco Mundial disse: ‘Não se pode gastar esse dinheiro para alimentar as pessoas’. E aí a crise alimentar”. Em consequência dessa política, “as pessoas deixaram de comprar comida e começaram a morrer de fome. Estão a ponto de morrer de fome 50 milhões de pessoas, enquanto 60 milhões de toneladas de alimentos apodrecem nos celeiros. Entretanto, as 60 milhões de toneladas não são excedentes, eu as chamo de pseudo-excedentes e atualmente estão sendo exportados para o mercado mundial, dizendo que Índia possui tanto alimento que pode exportar. O que eles não dizem é que nós temos esse tanto de alimento porque as pessoas estão morrendo de fome”, explana com indignação.

O ex-ditador argentino Jorge Rafael Videla, condenado a duas penas perpétuas, sustentou que sua relação com o clero foi excelente. "Mantivemos uma relação muito cordial, sincera e aberta", afirmou. "Capelães militares davam assistência para nós e nunca foi quebrada essa relação de colaboração e amizade".

Ex-capelão Christian Von Wernich, de 69 anos, foi considerado culpado de sete homicídios, 31 casos de tortura e 42 seqüestros, e foi condenado à prisão perpétua por crimes contra a humanidade cometidos durante a ditadura militar na Argentina. Como capelão da polícia, Von Wernich atuou em centros clandestinos de extermínio na província de Buenos Aires, sob o comando do falecido general Ramón Camps, considerado pelos organismos humanitários como o senhor da morte durante a ditadura militar.

O padre Alberto Angel Zanchetta, que em 2009 foi aposentado como capitão de fragata e capelão da Marinha, continuava exercendo o sacerdócio em paróquias da capital argentina e arredores, apoiado pelo cardeal Jorge Bergoglio. O padre abençoava militares argentinos e os vôos da morte por meio dos quais a ditadura jogava presos políticos-desaparecidos vivos no mar. No livro "El vuelo", de Horacio Verbistky, o ex-capitão da Marinha, Adolfo Scilingo – preso atualmente na Espanha – fez sua primeira revelação sobre sua participação nos vôos da morte. Ele relatou que no regresso do primeiro vôo em que atuou jogando pessoas ao mar se sentiu muito mal e se aproximou de um capelão da Marinha, que o acalmou dizendo que era uma morte cristã porque as vítimas não sofriam.

Enquanto isso na Terra Brasilis se noticia que os presidentes dos Clubes Militares foram obrigados a publicar no dia 23/02/12 uma nota desautorizando o texto do "manifesto interclubes" que criticava a presidente Dilma Rousseff por não censurar duas de suas ministras que defenderam a revogação da Lei da Anistia. Logo depois, porém, tanto o comunicado original como o desmentido foram retirados do site em que foram divulgados. Comenta um militar: "Não podemos ficar parados. É natural que haja uma reação porque não é possível ficarmos sendo desafiados de um lado e engolirmos sapo de outro". Esqueceu o dito cujo que as 30 mil pessoas torturadas durante o regime militar tiveram que engolir muito mais que sapos. Não esquecendo das 436 pessoas assassinadas pelo governo militar.
O capitalismo não é lindo? Que o diga o 1 bilhão de famintos do planeta.

O que cria riqueza, o que gera valor é o trabalho humano, empregado na produção de mercadorias. Sem trabalho humano não há riqueza.
A Mercadoria tem duplo valor: de uso e de troca (para o capitalista é esta que interessa; o valor de troca se sobrepõe ao valor de uso)

O cálculo do preço da mercadoria:
Capital Constante:
Matéria prima + máquinas e seu desgaste + prédio + água + energia + impostos
+
Capital variável:
Trabalho necessário + Trabalho excedente
+
Renda diferencial:
Preço da mercadoria + lucro médio

Exteriorizar o verdadeiro custo de produção é não contabilizar a destruição da natureza, a perda do local vivencial das populações do terceiro mundo, a poluição do ar e da água, a doença advinda do trabalho extenuante e da poluição, o fato dos trabalhadores não terem acesso ao seguro de saúde, as matas que viraram carvão para fundir os metais usados nos carros, o trabalho escravo no agronegócio, o assassinato dos povos originários, dos defensores das florestas e dos sindicalistas, etc. Estes custos não são registrados por nenhuma contabilidade para serem inseridos no custo da mercadoria. Por isso muitas mercadorias são tão baratas. Mas, estes custos existem e foram pagos pelos acima citados ou ainda serão pagos; isto faz parte do processo exploratório do capital.

Obsolvência Planejada é a programação da duração de um produto. Toda mercadoria é feita para estragar num prazo predeterminado pela indústria que a fabrica.
Obsolvência Perceptiva é para nos convencer a jogar fora o que é ainda bom e comprar um novo produto, pois os novos produtos têm uma nova fórmula ou uma nova embalagem. Se não temos o último lançamento somos obsoletos, atrasados e infelizes.

Trabalho necessário é o salário que se recebe.
O conceito do mais-valor, desenvolvida por Karl Marx, representa a diferença entre o valor produzido pelo trabalho e o salário pago ao trabalhador. Trata-se do excedente produzido pelo trabalhador referente ao necessário para que ele mantenha seus meios de subsistência; deste excedente o capitalista se apropria legalmente, que é a origem do capital. O salário esconde este processo, pois o trabalhador ao receber o salário acha que está recebendo o justo valor pelo seu trabalho, pois isto foi combinado entre peão e patrão. Não sabe que uma parte de seu trabalho não lhe é pago.

Trabalho excedente são os dias que se trabalha e não se recebe por isto, o que gera o mais-valor – o lucro – que é produzido, segundo os relatos dos noticiários, como segue:
1. Nas fábricas, Mahmoud, executava uma única tarefa: com uma faca afiada, degolava cerca de 75 frangos por minuto pelo método halal, selo requerido pelos países de maioria islâmica que importam a carne brasileira. "Não dava nem para enxugar o suor", ele conta, referindo-se à alta velocidade com que tinha de executar os cortes na linha de abate. Pelo trabalho, recebia cerca de R$ 700 mensais. Segundo a Secretaria de Comércio Exterior a exportação de frango halal para países muçulmanos rendeu cerca de R$ 5 bilhões ao Brasil em 2011. "A empresa (terceirizada: CDIAL Halal) se vale da situação vulnerável deles (estrangeiros) no país, o que permite caracterizar condição análoga à de escravo. Ao transferi-los constantemente de Estado, impede que criem raízes, que estabeleçam relações pessoais e denunciem os abusos à polícia". Em ambas as unidades da Sadia de Dois Vizinhos e Francisco Beltrão, PR, os funcionários estrangeiros enfrentavam jornadas de até 15 horas diárias, não recebiam hora extra e eram privados de benefícios dados aos trabalhadores da Sadia, como participação nos lucros e plano de saúde. Além disso, muitos trabalhavam sem carteira assinada. A denúncia contra a fábrica da Sadia em Dois Vizinhos foi julgada procedente, e a BR Foods (Sadia) e a CDIAL Halal foram condenadas a pagar R$ 5 milhões ao FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), como forma de reparar os danos causados aos trabalhadores. As empresas recorreram, e o tribunal de segunda instância baixou o valor da indenização para R$ 1 milhão, embora tenha mantido a decisão da corte anterior. Agora, a empresa deve recorrer outra vez.

2. Os operários encarregados da montagem dos iPhones, iPads e outros aparelhos da Apple com frequência trabalham em condições terríveis, de acordo com empregados das fábricas, grupos de defesa dos trabalhadores e relatórios publicados pelas próprias companhias. Os problemas são tão variados quanto os ambientes de trabalho e os problemas de segurança - alguns mortais - são graves.
Os operários fazem horas extras excessivas, em alguns casos trabalham sete dias por semana e vivem em dormitórios superlotados. Alguns trabalham em pé por tanto tempo que suas pernas incham a ponto de quase não conseguirem andar. Empregados menores de idade ajudaram a fabricar produtos da Apple, fornecedores da companhia armazenaram inadequadamente lixo tóxico e falsificaram registros, segundo dados da empresa e grupos de defesa do trabalhador que, dentro da China, são considerados monitores independentes e confiáveis.
Lai logo passou a trabalhar 12 horas por dia, seis dias na semana na Foxconn. Havia "turnos contínuos" e então os operários recebiam ordens para trabalhar 24 horas seguidas. O grau universitário permitiu que o jovem ganhasse um salário de US$ 22 por dia, incluindo horas extras. Ao sair do trabalho, ele se recolhia num pequeno aposento, suficiente para abrigar um colchão, um guarda-roupa e uma mesa.
Condições terríveis de trabalho foram documentadas em fábricas de manufatura de produtos para a Dell, Hewlett-Packard, IBM, Lenovo, Motorola, Nokia, Sony, Toshiba e outras.

3. Sugiro ver o filme “Carne e Osso” que mostra o processo produtivo nos frigoríficos de abate de aves e bovinos.
Vilma Fátima Favero, “encostada” aos 42 anos, trabalhava na Seara de Sidrolândia, no interior do Mato Grosso do Sul, como “ajudante agropecuária”. “A gente separa os pintos, põe na caixa, vacina, forma o lote e põe no caminhão”. Cada trabalhador coloca milhares de pintos por hora nas caixas. Cada caixa tem cem aves. “Tinha gente que não agüentava e desmaiava, pois muitas vezes se varava a noite. Começava às duas da tarde e largava por volta da meia noite. Muitas vezes passava do horário, pois eram 130 mil pintos e apenas quatro pessoas para sexar. Se alguém faltava era pior, o trabalho acumulava para ser dividido entre quem se encontrava. O ritmo aumentava ainda mais, insuportável”. Hoje está incapacitada para o trabalho e tem tendinite e cinco hérnias de disco por causa do trabalho repetitivo e extenuante.
Quando as metas de trabalho não eram atingidas, uma sirene é acionada, avisando que há algo errado. Nesses casos, muitos trabalhadores chegavam a ter reações de pânico, de intensa ansiedade e ficavam agitados só de ouvir qualquer barulho que se assemelhasse a uma sirene, mesmo fora do ambiente de trabalho. Ao cobrar metas, as chefias tratam os funcionários de maneira ofensiva para instaurar o medo no ambiente de trabalho. Eles, por sua vez, muitas vezes não conseguem atender às suas necessidades básicas como ir ao banheiro, tomar água, ir ao atendimento médico da empresa.

O medo tem um papel muito forte para manter os trabalhadores na produção, também na igreja: medo de não renovação do TAM, da Avaliação e do desemprego. Penso que os colegas devem se negar a participar das equipes de avaliação de outros colegas. Isto impossibilita o processo e põe areia no sistema. Participar das equipes de avaliação é ajudar a ferrar a si mesmo no futuro e o/a colega no presente. Sugiro a Desobediência Civil neste caso; ninguém é obrigado a participar de uma equipe destas. Participar de uma equipe de Avaliação é pura ingenuidade, algo muito comum entre pastores/as. Diga simplesmente: eu não vou participar. Se for um movimento nacional a igreja terá de rediscutir isto e o TAM. No tempo do Erni Drehmer como sinodal ele se negou a fazer as equipes de avaliação e esta não aconteceu.

Jon Sobrino diz: "Em seu conjunto custa hoje encontrar na Igreja a liberdade dos filhos e filhas de Deus, a liberdade diante do poder, que não por ser sagrado deixa de ser poder. Nota-se excessivo servilismo e submissão em relação a tudo o que seja hierarquia, o que chega a se converter em medo paralisante. Desde as instâncias de poder eclesial aponta o triunfalismo, e o que chamei de a pastoral da apoteose, de multidões, midiática. Em muitos seminários a discussão e a arte de pensar são substituídas pela memorização. Nas reuniões do clero, pelo que sabemos, as perguntas, a discussão e o debate são substituídas pelo silêncio. As cartas pastorais dos anos 1970 e 1980 – verdadeiro orgulho das Igrejas, que reverdecem em ocasiões, na Guatemala, por exemplo – são substituídas por breves mensagens, recatadas e comedidas, com argumentos tomados das últimas encíclicas do papa. O centro institucional já não parece estar na América Latina, mas na distante Roma. Tudo isto é dito com respeito".
Ele fala da Igreja Católica Romana, mas parece que fala da IECLB.

O capital reduz toda atividade humana a trabalho e toda realização do ser humano a mercadoria. O ser humano é constrangido a aceitar a mais desigual das trocas: a da vida pela sobrevivência, sendo forçado pela necessidade a fazer de suas aptidões um objeto de consumo e vendê-las no mercado de trabalho. Tendo conseguido vender sua força de trabalho, a realização do proletário se torna sua desrealização; a afirmação do proletário se torna a negação de si como pessoa, pois o trabalhador não age como ser humano, mas como força de trabalho, como mercadoria, subordinado à vontade do capitalista, em troca de um salário.

A burguesia busca controlar o Estado, a principal fonte de acúmulo de riquezas, a partir da chamada mais-valia-social, que o Estado concentra anonimamente, por meio de impostos. Com estes impostos o Estado realiza obras que são executadas pelas empresas capitalistas e desta forma se apropriam destes impostos (ex. PAC).

O capital transforma tudo em mercadoria. E procura explorar tudo na pessoa, não apenas o trabalho (como era na fase do capitalismo industrial). Até a crença e a religiosidade das pessoas são transformadas em mercadoria, para obter lucro. Não existe mais sociedade, no sentido que as pessoas são sócias, parceiras comuns de uma sociedade. Agora só existe o mercado. Onde se compra e se vendem coisas: objetos e pessoas. O capital hoje consegue acumular e se reproduzir sem que as pessoas necessitem trabalhar, ser exploradas. É uma ruptura com a essência do capitalismo – é a fase da financeirização, que se mostrou eficiente em sua tarefa de concentrar capitais através das crises geradas que são parte integrante do sistema como também o desemprego o é. Crise e desemprego (exército de reserva de mão de obra) não são doenças do sistema, mas é parte da estrutura do sistema. Muito do exército de reserva de mão de obra veio do campo, como no exemplo de 70 a 80 onde 24,3 milhões de brasileiros mudaram de região.

"Continua havendo o problema da capacidade de expulsão do latifúndio ser muito maior do que a capacidade de absorção pela indústria e pelos serviços urbanos dessa mão-de-obra. De cada dois expulsos do campo ou de sua região para outra região, um consegue se integrar na economia capitalista urbana, o outro fica pelo meio do caminho, marginalizado. O próprio governo admite que existem 40 milhões de pessoas marginalizadas nesse país. A grosso modo, são três países num só: 40 milhões que constituem uma sociedade de consumo, 40 milhões que vivem num equilíbrio instável e 40 milhões totalmente marginalizados", diz Paulo Schilling, falecido em janeiro de 2012.

Boff ao comentar o livro ‘Reinventando o capital/dinheiro’ de Rose Marie Muraro diz: “Vigora um perverso descompasso entre o capital real e o financeiro. Ninguém sabe exatamente as cifras, mas calcula-se que o capital financeiro soma cerca de 600 trilhões de dólares enquanto o capital produtivo, do conjunto de todos os países, alcança cerca 63 trilhões”.
“Na Pré-História predominava o ganha/ganha. Vigorava o escambo, isto é, a troca de produtos. Reinava grande solidariedade entre todos. No Período Agrário entrou o dinheiro/moeda. Os donos de terras produziam mais, vendiam o excedente. O dinheiro ganho era emprestado a juros. Com os juros entrou o ganha/perde. Foi uma bacilo que contaminou todas as transações econômicas posteriores. No Período Industrial esta lógica se radicalizou, pois o capital assumiu a hegemonia e estabeleceu os preços e os níveis de juros compostos. Como o capital está em poucas mãos, cresceu o perde/ganha. Para que alguns poucos ganhem, muitos devem perder. Com a globalização, o capital ocupou todos os espaços. No afã de acumular mais ainda, está devastando a natureza. Agora vigora o perde/perde, pois tanto o dono do capital como a natureza saem prejudicados. No Período da Informação criou-se a chance de um ganha/ganha, pois a natureza da informação especialmente da Internet é possibilitar que todos se relacionem com todos.
Mas devido ao controle do capital, o ganha/ganha não consegue se impor. Mas sua força interna irá inaugurar uma nova era, quem sabe, até com uma moeda universal, sugerida pelo economista brasileiro Geraldo Ferreira de Araujo Filho, cujo valor não incluirá apenas a economia, mas valores como a educação, a igualdade social e de gênero e o respeito à natureza e outros. Rose aposta nesta lógica do ganha/ganha, a única que poderá salvar a natureza e nossa civilização.”
Sugiro ler de Rose Marie Muraro. Um mundo novo em gestação.

Deus criou o capitalismo? Não! As pessoas o criaram, portanto é obra de pessoas e estas são pecadoras e mortais; assim o capitalismo é obra do pecado e vai morrer.
É urgente estudarmos com as comunidades e presbitérios o Manifesto Chapada dos Guimarães. Conhecem? Não basta conhecer, tem que estudar ele nas reuniões dos presbitérios das comunidades e entregar uma cópia para cada pessoa.

Frei Betto diz: "Todas as dimensões da vida – nossa e do planeta – sofrem hoje acelerado processo de mercantilização. O capitalismo é o reino do desejo infinito atolado no paradoxo de se impor num planeta finito, com recursos naturais limitados e capacidade populacional restrita. Está em crise um paradigma civilizatório centrado na crença de que pode haver crescimento econômico ilimitado num planeta de recursos infinitos… Esse paradigma identifica felicidade com riqueza; bem-estar com acumulação de bens materiais; progresso com consumismo. A lógica da acumulação é mais autoritária que todos os sistemas ditatoriais conhecidos ao longo da história. Ela ignora a diversidade cultural, a biodiversidade, e comete o grave erro de dividir a humanidade entre os que têm acesso aos recentes avanços da tecnociência, em especial biotecnologia e nanotecnologia, e os que não têm. Daí seu efeito mais nefasto: a acumulação ou posse da riqueza em mãos de uns poucos se processa graças à desposessão e exclusão de muitos".

No dia 21 de agosto de 2010, os habitantes do Planeta Terra já esgotaram todos os recursos que o planeta lhes proporciona no período daquele ano, passando a viver dos créditos relativos ao próximo ano, segundo cálculos efetuados pela ONG Global Footprint Network (GFN). Em outras palavras, a espécie humana já necessita hoje de 1,3 planetas para satisfazer suas necessidades e desejos de consumo. Quem mais consome é mais feliz? A "pegada ecológica" - indicador da pressão exercida sobre o ambiente está em média 2,2 hectares por pessoa, mas o espaço disponível para regeneração (biocapacidade) é de apenas 1,8 hectares. Avançamos o sinal. Há quem diga que o estrago já foi feito e ponto de retorno já passou.

Os nove itens que mostram os pontos fracos do globo, que se a humanidade insistir em continuar assim, chegaremos à catástrofe ambiental definitiva. Nós já quebramos três barreiras, nos três primeiros itens:
1. Mudança Climática
2. Ciclo do Nitrogênio
3. Perda da Biodiversidade.
4. Uso da Água Doce e do Solo
5. Ciclo do Fósforo
6. Acidificação dos Oceanos
7. Emissão de Aerossóis na Atmosfera
8. Ozônio Estratosférico
9. Poluição Química

Estamos em uma crise civilizacional, que é o tipo de desenvolvimento econômico implantado ao longo dos últimos dois séculos baseado no paradigma do crescimento econômico ilimitado, no lucro ilimitado, numa concepção de desenvolvimento que ignora as “externalidades” (danos naturais e sociais), no foco no valor de troca em detrimento do valor de uso, na ideia de progresso infinito, na concepção de que os recursos naturais seriam inesgotáveis e de que a nossa intervenção sobre a natureza se daria de maneira neutra, que se encontra a razão do impasse que vivemos. Na origem da crise ecológica está o consumo desenfreado que levará pela exaustão dos recursos naturais e do extermínio da biodiversidade à destruição da vida humana no Planeta Terra. Em 1972 na 1ª conferência ambiental da ONU, em Estocolmo, se achava que a população mundial só ia estabilizar em 14 bilhões, mas já sabemos hoje que vai estabilizar em 9 ou 10 bilhões e a partir daí irá cair. Mas isto ainda não resolve o problema da exaustão da biodiversidade, dos recursos naturais e nem do aquecimento global, pois há uma ascensão para a classe C de consumo em nível mundial, o que é uma boa notícia, mas que requer mais recursos naturais. Temos que repensar nossos padrões de consumo. Temos que criar uma ideia de classe média que seja atraente o suficiente para europeus e estadunidenses, e atraente o suficiente para indianos e brasileiros. Não podemos ter 7 bilhões de pessoas consumindo como a classe média estadunidense ou italiana e nem ter dois padrões de consumo: a classe média estadunidense pode ter quatro carros e classe média indiana tem que andar de bicicleta.

O atual processo vertiginoso de perda de recursos naturais é tão desastroso para o mundo quanto a crise climática. "Na área do clima, a ficha da sociedade já caiu. Na biodiversidade, a rota em que estamos levará a desastres ambientais enormes, mas é mais difícil de a população enxergar", diz o biólogo brasileiro Dias Bráulio Ferreira de Souza Dias, secretário executivo da Convenção sobre Diversidade Biológica da ONU. O capitalismo não está preocupado em garantir a conservação e o uso sustentável da biodiversidade. No Brasil o avanço do monitoramento das florestas por satélite deu transparência ao desmatamento. Mas em biodiversidade, ninguém sabe a dimensão do problema. "As pessoas não se dão conta de que estamos no meio de uma crise de proporções em grande escala". "Não dá para achar que só o orçamento dos governos vai pagar essa conta. Teremos que incluir também o setor financeiro, empresarial e outros. Vamos ter que dar mais força a mecanismos de mercado", diz o biólogo Dias. O lucro é privado, mas o prejuízo é público foi sempre a regra, que nesta crise não vale mais. Os capitalistas predadores vão ter que ajudar a pagar a conta. No exemplo da Sadia que contribuiu com 30 milhões ao INSS, no período de 2003 a 2007, e que, em contrapartida, o INSS desembolsou 170 milhões em benefício previdenciário, seja como afastamento do trabalho, aposentadoria por invalidez, etc. Nós, o povo brasileiro, pagamos uma conta de 140 milhões que a Sadia deveria ter pago por ter causado a incapacidade permanente para o trabalho pela superexploração destes trabalhadores.

Qual o valor e o custo da biodiversidade? Já estão identificadas em nível mundial 280 mil espécies de plantas (que podem chegar a 320 mil), 16 mil de nematoides (que podem ser 15 milhões), 900 mil de insetos (talvez 5 milhões). Podemos ter de 5 milhões a 10 milhões de espécies. Em uma tonelada de terra fértil podem estar 4 mil de bactérias. O comércio mundial de produtos naturais já está perto de US$ 4 trilhões anuais (talvez um quarto do comércio total), o de medicamentos derivados de plantas, em US$ 250 bilhões/ano. Robert Costanza e outros economistas da Universidade da Califórnia calcularam em US$ 180 trilhões anuais (o triplo do PIB mundial) o valor dos serviços que a natureza presta gratuitamente – fertilidade do solo, regulação do fluxo hídrico, regulação do clima -, se estes tivessem de ser substituídos por ações humanas.

A perda de florestas na Amazônia está ainda acima de 7 mil quilômetros quadrados anuais, o Cerrado já sem vegetação em 50% da área (85 mil km2 perdidos em sete anos) – no país que tem entre 15% e 20% da biodiversidade planetária. Sabemos que o Cerrado tem sido oferecido aos grandes latifúndios do agronegócio, que não só produzem muitas toneladas de grãos, de pasta de celulose, de carnes para exportação como também produzem muita poluição e muito desperdício das águas, produzem muita erosão, produzem monocultura onde há muita diversidade de plantas e animais e ainda produzem muitos/as trabalhadores/as rurais sem terras com a concentração de terras e concentram poder econômico e político e, assim, contribuem para por em risco a democracia.

No Cerrado se formam os rios que conformam as grandes bacias hidrográficas brasileiras como a do São Francisco, a do Doce, a do Jequitinhonha, a do Jaguaribe, a do Parnaíba, a do Araguaia/Tocantins, do Xingu, do Tapajós e Madeira (da bacia amazônica), além dos formadores da bacia do Paraguai e do Paraná/bacia do Prata. Numa área com 4 árvores adultas de baru se obtém mais renda do que em um hectare plantado com soja. Como lembra Bráulio, a cada ano estamos descrevendo em média mil espécies novas no Brasil, que se somam às 41.121 espécies vegetais já conhecidas, 9.100 marinhas, 2.600 de peixes, dezenas de milhares de animais: “Estamos sentados em um baú de ouro e não sabemos o que fazer com ele”.

Em 25% da superfície do planeta a desertificação é total, por causa de erosão do solo (quase 25% do solo do planeta já teve alguma deterioração), degradação da água e perda da biodiversidade; em 8% a degradação é moderada; em 36%, “leve”. Enquanto isso a CNA do agronegócio escravagista da senadora Cátia Abreu quer a permissão ao desmate ilimitado. Em nível mundial em cem anos 75% da biodiversidade de plantas alimentares já se perdeu – 22% das espécies de batata, feijão, arroz ainda podem ser perdidas. Com a modernização da agricultura e ênfase na monocultura, muitas outras espécies estão ameaçadas, colocando em risco nossa segurança alimentar. A principal causa a substituição das variedades locais heterogêneas, de ampla base genética, pelas variedades industriais, aquelas que são adotadas por um modelo industrial de agricultura, pelas monoculturas com uso de variedades homogêneas e altamente dependentes de insumos externos. Essa é a principal causa da perda da agrobiodiversidade: a adoção de modelos agrícolas monoculturais que usam uma única espécie, ou números muito reduzidos de espécies e variedades agrícolas, ao contrário dos sistemas locais que tendem a ser mais diversos.

A FAO, órgão ligado à ONU, alerta para o possível desaparecimento de uma de cada cinco raças de gado, frango e suínos no mundo nos próximos anos. Uma raça de suínos, ovelhas, frango ou bovinos desaparece por mês desde 2000. Desde 1970, as espécies de animais vertebrados sofreram redução de 30% e a degradação resultou em declínio de 20% dos habitats naturais. Até dois terços das espécies estão sob ameaça de extinção. Das 5.490 espécies de mamíferos, 79 foram extintas e mais de 500 estão sob risco. O temor é que a diversidade genética fique limitada, colocando em risco a nossa alimentação. De 1845 à 1849 a Irlanda passou pela A Grande Fome da Batata. Crise provocada por um fungo (Phytophthora infestans) nas plantações de batatas que era a base alimentar em toda Europa e matou cerca de 1 milhão de Irlandeses e outros milhares emigraram fugindo da fome e das doenças. Por que? Porque se usava apenas uma variedade de batata. Quanto menos variedades maior a ameaça da fome. Hoje a nossa alimentação está baseada em quatro alimentos: trigo, soja, arroz, e milho. Hoje todos já transgênicos. Se der uma pane aí morreremos de fome. Juntamos à isso o acelerado desaparecimento dos enxames de abelhas por causa dos agrotóxicos o que é uma ameaça em potencial, pois 90% das plantas dependem da polinização para produzir frutos e grãos. Sem abelhas não haverá comida e sem comida: morte da humanidade.

Leonardo Boff diz: Nos últimos 540 milhões de anos ela (a Terra) conheceu cinco grandes extinções em massa, praticamente uma em cada milhão de anos, exterminando grande parte da vida no mar e na terra. A última ocorreu há 65 milhões de anos quando foramdizimados os dinossauros entre outros. Até agora todas as extinções eram ocasona-das pelas forças do próprio universo e da Terra a exemplo da queda de meteoros rasantes ou de convulsões climáticas. A sétima está sendo acelerada pelo próprio ser humano. Sem a presença dele, uma espécie desaparecia a cada cinco anos. Agora, por causa de nossa agressividade industrialista e consumista, multiplicamos a extinção em cem mil vezes, diz-nos o cosmólogo Brian Swimme em entrevista recente no Enlighten Next Magazin, n.19. Os dados são estarrecedores: Paul Ehrlich, professor de ecologia em Standford calcula em 250.000 espécies exerminadas por ano, enquanto Edward O. Wilson de Harvard dá núme-ros mais baixos, entre 27.000 e 100.000 espécies por ano (R Barbault, Ecologia geral 2011, p.318). Thomas Berry, o pai da ecologia americana, escreveu: ”Nossas tradições éticas sabem lidar com o suicídio, o homicídio e mesmo com o genocídio, mas não sabem lidar com o biocídio e o geocídio” (Our Way into the Future, 1990 p.104).
Estamos chegando no limite...

Jean Marc von der Weid da ASPTA diz: "O modelo hegemônico de agricultura simplesmente é insustentável em longo prazo: os recursos minerais usados para fabricação de adubos nitrogenados estão desaparecendo; o modelo é completamente baseado em petróleo e não faltam questionamentos sobre os limites de sua exploração; a degradação do solo chega a níveis alarmantes: calcula-se que já atinge 22% das terras férteis do mundo. Desaparecem ainda as culturas agrícolas tradicionais. Isso tem uma significação que vai além da perda ambiental e do material genético. Perdemos também o conhecimento. Esse é um problema grave para o futuro”.

Quando se está dependente das multinacionais dá nisso:
O Presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja/MT), Carlos Henrique Fávaro, explica que houve aumento até abusivo no preço das sementes, mas que isso é consequência natural do mercado devido ao crescimento na demanda. O analista da CONAB, Petrônio Sobrinho diz: “Até mesmo os levantamentos de safra estão incertos porque os produtores estão dependendo das sementeiras”. Gerente do sindicato rural de Campo Novo do Parecis, Antônio de La Bandeira, explica: “Como estão esgotando as sementes de primeira linha, as empresas oferecem produtos de qualidade inferior para garantir a venda e os produtores aceitam para não perder tudo”. Isto significa que: agricultor que não tem controle sobre as sementes está nas mãos dos especuladores tornando-se escravo dos interesses das grandes empresas. O patenteamento das sementes transgênicas segue este caminho da subjugação dos agricultores. A agricultura industrial começou com o controle do financiamento bancário, dos adubos químicos, das máquinas, dos venenos e, por fim, das sementes; assim se fecha o círculo da dependência. Os agricultores agora são peões do capital: produzem cada vez mais, trabalham cada vez mais e estão cada vez mais endividados.

As estatísticas mostram como a agricultura camponesa, apesar de toda a contrapropaganda do agronegócio, é melhor diante das mudanças climáticas por ser mais flexível e adaptável, preservar a biodiversidade, conservar os solos, ter o controle sobre suas sementes e ainda por alimentar certa de 80% da população mundial. A agroecologia, a agricultura biodinâmica, a agricultura orgânica, etc. são a saída, indubitavelmente.

Para Mardônio Alves da Graça o reconhecimento do governo federal, ao destinar verbas para a aquisição das sementes crioulas, reforça o movimento dos bancos comunitários de sementes no Estado. O agricultor Sebastião Damasceno, de Santana do Ipanema, AL, explica que as sementes crioulas além de adaptadas às condições de clima e solo do Estado, fazem parte das culturas e tradições dos agricultores alagoanos. Este ano, pela primeira vez na história de Alagoas, os gastos públicos com a aquisição de sementes crioulas vão superar os gastos com a compra de sementes comerciais. O MPA e o MMC estão na frente desta luta de preservação e reprodução de sementes crioulas. A OESTEBIO de São Miguel do Oeste, SC, que é do MPA produz sementes crioulas de milho, feijão, aveia, etc. através dos militantes do MPA e distribui via CONAB para todo Brasil e até para a Venezuela. Além de intercambiar raças de galinhas, de porcos, de ovelhas, de gado entre várias regiões do oeste catarinense, para que não entrem em extinção.

“O sistema de agricultura industrial trabalha com, no máximo, 150 variedades de alimentos. No entanto, o foco principal deles está em 12 variedades. Eles alegam que se puderem fazer uma engenharia dessas 12 variedades, resolvem a questão da alimentação. Enquanto isso, a rede mundial de agricultura camponesa trabalha com sete mil espécies. Então, quem vocês acham que vai nos dar as maiores chances de nos alimentar diante das mudanças climáticas?”, questiona Pat Mooney. A ETC Group realiza uma série de estudos sobre os mecanismos das multinacionais para tentar privatizar a biodiversidade do planeta. Segundo o pesquisador, desde a Conferência de Estocolmo, em 1972, as indústrias do sistema agroalimentar produziram 80 mil variedades de plantas. Entretanto, 59% dessas variedades são de espécies ornamentais. “Comparado a essas 80 mil variedades que as indústrias produziram, a agricultura camponesa mundial produziu 2,1 milhões de variedades. Então, quem tem a flexibilidade para suportar as mudanças climáticas?”, ponderou. De acordo com Mooney, na criação de animais a desproporção na diversidade de produção do agronegócio e da agricultura camponesa se mantém - na criação de peixes, por exemplo, o agronegócio cria 363 espécies, já a produção artesanal dos camponeses trabalha com 22 mil espécies.

Mooney também apresenta dados sobre a preservação dos solos. “As empresas de fertilizantes conseguem destruir 70 bilhões de toneladas da camada fértil do solo por ano. Já os sistemas camponeses de produção conservam 140 bilhões de toneladas dessa camada do solo”, informou. O pesquisador disse ainda que as empresas do agronegócio tentam buscar nos territórios dos camponeses a diversidade preservada por eles para que possam realizar cruzamentos em laboratório. Segundo Mooney, as empresas estão em busca de espécies silvestres existentes nos territórios camponeses ou nas zonas próximas e nas florestas ao redor dos territórios camponeses, que contabilizam uma diversidade de 50 a 60 mil espécies silvestres.
Para Mooney a Conferência Rio+20 será um campo de batalha sobre a biodiversidade do planeta, que já perdeu para as corporações 23,8% das espécies: “O que o capitalismo vem buscar aqui são os 76,2% que restam. Essa é a batalha do Rio. Com a crise das hipotecas em 2007, nós já demos aos banqueiros 14 trilhões de dólares. Agora, se aceitarmos essa nova proposta de financeirização da natureza, o que estamos dizendo para aqueles mesmos bancos é que eles podem vir e brincar em nosso jardim. Seremos insanos se aceitarmos isso”.

Fidel disse em 1992 na Rio 92: "Hay que salvar la principal especie en extinción, el ser humano". Hoje para a Rio+20 diz: "O hay una intervención humana o vamos tener una apocalipsis".

Enquanto estivermos em uma economia de mercado selvagem, que tem como único motor o consumo para garantir o lucro, não há um futuro aceitável, ou melhor, não há nenhum futuro. Ou acabamos com o capitalismo ou ele acaba com a humanidade. O Planeta Terra vai sobreviver à humanidade e de certa forma se recuperar nos próximos milênios, mas sem pessoas, assim como hoje não tem mais dinossauros. Parece muito catastrófico?

Não, pois mesmo distantes das calotas polares, países tropicais como o Brasil têm sentido na fauna e na flora os impactos negativos do degelo no Atlântico Norte, consequência do aquecimento global. Lá, um efeito aparente é a mortalidade de focas harpa; aqui, a ameaça ronda baleias jubarte, tartarugas pente, albatrozes, papagaio-da-cara-roxa, recifes de corais e até as araucárias. O problema se expande em escala preocupante.

No Brasil, o exemplo mais emblemático são os recifes de corais. Em áreas tropicais, o aumento da temperatura do oceano afeta os corais e priva muitos outros habitantes de sua fonte de alimentos. A extinção dos corais está se acelerando e estima-se que, em 50 anos, 80% dos corais de todo o mundo possam desaparecer. Essas alterações no clima afetam o habitat, a alimentação e o ciclo reprodutivo de incontáveis animais e peixes.

O derretimento das calotas polares também representa perigo para espécies brasileiras. O papagaio-de-cara-roxa, espécie endêmica do litoral sul do Brasil, está sob risco de extinção. Uma das causas do declínio da população da ave no Paraná se deve ao aumento do nível do mar, onde a espécie se concentra na Ilha Rasa, facilmente coberta na maré alta. As águas internas da ilha já estão se tornando salobras, o que afeta as árvores que servem de ninhos naturais. Vemos como tudo está interligado. Desde os anos 1970, cada nova década foi mais quente que a anterior – e nove dos dez anos mais quentes de todos os tempos estão no século 21.

A NOAA revela os resultados de um estudo que abrange 150 anos — de 1850 a 2000 — e que examina, além das próprias temperaturas, outros indicativos de mudança climática. No que diz respeito às medições dos termômetros, os resultados são claros. “Cada uma das três últimas décadas foi bem mais quente que a anterior. Os anos 1980 foram, à época, os mais quentes de que se tinha registro. No decênio seguinte, todos os anos foram mais quentes que a média dos 80. Os anos 2000 são ainda mais quentes”. Vistas na média, as mudanças de temperatura são sutis: a elevação é de cerca de 0,6ºC, nos últimos 50 anos. “Pode parecer pouco, mas já alterou nosso planeta”.

A maioria dos cultivos agrícolas é sensível ao calor e à falta de água. A produção de arroz caiu de 10% a 20% nos últimos 25 anos na Tailândia, Índia, China e Vietnã. Dados de 227 fazendas irrigadas mostram uma redução na produção devido às altas temperaturas registradas durante a noite. Hoje, 80% da população mundial vive em áreas com altos níveis de ameaça à segurança de água, afetando 3,4 bilhões de pessoas, a maioria em países em desenvolvimento. Se deixarmos as coisas tal como estão hoje, o Planeta vai perder entre 5% e 20% do PIB mundial. Estamos falando, portanto, de perdas que podem chegar a cerca de 7 trilhões de dólares.

Não esquecendo que o mesmo mal (o capital) que causa o desastre não vai apontar e nem ser a solução para sair do desastre, pois para isto ele teria de se autodestruir. Em outras palavras: o capitalismo não vai salvar o Planeta e nem a humanidade de sua autodestruição. O que ele fará é o que sempre fez: se reprogramará para sobreviver. A ordem agora é apostar na "economia verde", que será o lema da Rio+20. No entanto, o capital continuará usando o trabalho escravo no agronegócio e também nas empresas terceirizadas da cidade, continuará fazendo guerra para garantir o suprimento de energia para os países do norte, continuará assassinando os povos indígenas, sindicalistas e ambientalistas que ameaçarem o seu projeto, continuará usando a nossa ingenuidade e falta de clareza política e teológica contra nós mesmos (somos um bando de inocentes úteis), continuará a superexploração da classe trabalhadora jogando os inválidos pela LER no lixo social do Estado, continuará a extinguir a biodiversidade e a exaurir os recursos naturais do Planeta e se necessário a ditadura militar voltará, assim como as crises cíclicas como mecanismo de acumulação. O resto é ingenuidade nossa.

Não existe saída para a humanidade dentro do capitalismo! As atrocidades do passado nos deveriam convencer disto: o capitalismo, em nome de Jesus, assassinou 70 milhões de pessoas nas Américas no período da Conquista e mais algumas dezenas de milhões no período do Colonialismo na África, Ásia e Oceania; exterminou centenas de povos originários junto com sua cultura, seus conhecimentos e sua sabedoria; matou 250 milhões nas guerras para conseguir escravos, tanto para a Europa como para as Américas; massacrou toda e qualquer tentativa de se organizar uma outra sociedade baseada na fraternidade; prendeu, torturou e massacrou centenas de sindicalistas que lutavam pelos seus direitos e por justiça; continuou imprimindo na sociedade que mulheres, negros e índios são seres inferiores, usou o racismo para se reproduzir e podemos aumentar esta lista por mais algumas parágrafos.

Para termos uma idéia do massacre da Conquista uma palavra do Frei Bartolomé de Las Casas de seu livro "O Paraíso Destruído" de 1521:
"Este senhor e cacique fugia sempre aos espanhóis e se defendia contra eles toda vez que os encontrava. Por fim, foi preso com toda a sua gente e queimado vivo. E como estava atado ao tronco, um religioso de São Francisco (homem santo) lhe disse algumas cousas de Deus e de nossa Fé, que lhe pudessem ser úteis, no pequeno espaço de tempo que os carrascos lhe davam. Se ele quisesse crer no que lhe dizia, iria para o céu onde está a glória e o repouso eterno e se não acreditasse iria para o inferno, a fim de ser perpetuamente atormentado. Esse cacique, após ter pensado algum tempo, perguntou ao religioso se os espanhóis iam para o céu; o religioso respondeu que sim desde que fossem bons. O cacique disse incontinenti, sem mais pensar, que não queria absolutamente ir para o céu; queria ir para o inferno a fim de não se encontrar no lugar em que tal gente se encontrasse".

Nós como igreja temos a saída: o Evangelho do Reino de Deus, como elemento essencial de subversão frente ao capital. A essência do Evangelho do Reino de Deus exige a destruição do capitalismo e a construção de uma nova sociedade não capitalista! Esta subversão o capitalismo, pela ideologia da classe dominante, precisa cooptar e eliminar. Por isso é essencial que a igreja seja cooptada para que legitime o modo de produção capitalista, assim como o Templo de Jerusalém foi cooptado para legitimar o modo de produção escravista. Por isso é necessário retirar o crucifixo de nossas igrejas, porque ele mostra que Javé se fez da classe camponesa e, ainda por cima, leigo sem terra e sem teto em Jesus de Nazaré, o Cristo, que foi torturado até a morte na cruz, pela Religião e pelo Estado, para que a exploração do sistema econômico opressor vigente fique intacta (Jo 11.47-48). Quando olhamos para o crucifixo vemos ali um camponês morto na cruz pela Religião e pelo Estado por se sentirem ameaçados por ele e por sua prática evangelizadora subversiva que quer apenas vida abundante para todos a partir da prática do amor a Deus acima da tudo e ao próximo como a si mesmo. Amor não fecha com opressão e exploração. O amor é subversivo, pois cria a fraternidade, a igualdade, a justiça e a partilha, algo que o sistema vigente não pode permitir. Por isso o Evangelho precisa virar Religião. Nós sabemos que Jesus não morreu porque foi atropelado por um camelo numa esquina qualquer de Jerusalém. O acontecimento da Páscoa precisa ser esfumaçado e enuveado pela teologia da ressurreição da alma e da imortalidade da alma, pois o acontecimento da ressurreição do corpo é subversivo demais para se propagar. Não dá para separar a Páscoa da Sexta-feira Santa e vice versa.

Jesus Cristo anunciou o Reino de Deus e nós anunciamos Jesus Cristo desvinculado de sua mensagem central: o Reino de Deus, aí está o furo do diabo. Nós falamos de conversão para Jesus Cristo, falamos de arrependimento dos pecados (não incluindo os pecados coletivos produzidos a partir do nosso ser capitalista, é claro), falamos de nova vida individual (coisa ilusória) com Jesus sem lutar contra o capitalismo, etc. e tal, mas nunca falamos o que é inerente à conversão: a participação livre (Gl 5.1) e automática da subversão revolucionária do Reino de Deus que se dirige contra a obra do diabo: o capitalismo. Os 'convertidos' se dizem agora pessoas livres e novas, mas continuam escravas da obra do diabo, o capitalismo, por culpa de nossa pregação fragmentada e ideologicamente comprometida com o capital, obra do diabo. Pregamos Jesus Cristo de tal forma fragmentada e assim jogamos as pessoas no colo do diabo dizendo à elas que estão salvas. Será que esta palavra de Jesus não serve também para nós? Mt 23.15: "Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque rodeais o mar e a terra para fazer um prosélito; e, uma vez feito, o tornais filho do inferno duas vezes mais do que vós!"

Ex.: um granjeiro convertido de Panambi me disse que se não fossem os venenos e o pacote do agronegócio o mundo estaria passando fome. Ele é um destes que antes de colher o trigo passa o veneno Roundup para facilitar a colheita, pois ele mata a planta pela absorção do veneno que vai até a semente que usamos para fazer pão. Afinal, o trigo não é para comer é para vender! Vende comida envenenada com a consciência mais limpa do mundo e fica mortalmente ofendido quando se fala contra o modelo da agricultura química. Assim como o Hitler mandava os judeus, comunista, ciganos e sindicalistas para morrer nos campos de concentração com a maior tranqüilidade, achando que estava salvando a Alemanha do caos. Este granjeiro disse: Estamos alimentando o mundo graças ao veneno e aos transgênicos (que são instrumentos do capital)! Está piamente convencido que os instrumentos do diabo estão salvando a humanidade da fome. Assim se reproduz o ciclo assassino do sistema com o apoio irrestrito dos cristãos 'convertidos' ou não.

Esta discussão se insere num contexto internacional e de cooperação inter-eclesial.
A argentina Isabel Rauber diz: “O principal desafio que a humanidade enfrenta nos tempos atuais diante da crise multidimensional do capitalismo é a construção de uma nova civilização a partir da ativa participação das grandes massas populares.
Eu deixei de falar de mudança de sistema para propor uma mudança civilizatória. Poder-se-ia pensar que é a mesma coisa, mas não é, porque uma mudança civilizatória implica uma transformação das lógicas profundas que vêm dominando a civilização atual, e o que aprendemos do socialismo do século XX foi a colocação de uma alternativa que ultrapasse o capitalismo e certamente podemos dizer que, bem ou mal, o conseguiu no sentido de que houve várias revoluções, mas ficaram reféns da lógica da competição econômica do capitalismo. Pensou-se que fazer a revolução passava por apropriar-se dos meios de produção por parte do Estado, reduzindo o poder das personificações institucionais, sem ver outras arestas, sem contemplar a hegemonia, simplesmente tendo uma visão institucionalista e economicista do poder e isso automaticamente produziria a libertação humana. A história não funciona assim e o que houve foi uma mudança de donos que não modificou a lógica. Por isso eu creio que o problema não é superar o capitalismo, mas superar toda a civilização do capital; o desafio é maior. Nós vivemos uma civilização desumanizada no sentido de que promove uma alienação muito grande dos seres humanos porque somos cada vez mais objetos de consumo. Cada vez vivemos menos para nós e muito mais para o mercado.
O problema do mundo é a inexistência de uma humanidade consciente para o qual temos que encontrar um novo modo de vida entre todos e todas, e isso não se consegue por decreto, mas é preciso construí-lo, por isso a construção do poder se dá de baixo para cima. Ou seja, temos que mudar o modo de produção e de reprodução e isso deve ser pensado, deve ser inventado, e é uma caminhada de muitos anos. Mas, além disso, a humanidade tem que saber por que o faz para querer fazê-lo.
Mas para isso não se requer a irrupção de um novo sujeito político?
O sujeito político vai se construindo. A primeira pessoa que assume uma atitude crítica já está na mudança civilizatória, como é um processo de vários anos, quem pode dizer em que grau nos encontramos. Toda a tomada de consciência que está se produzindo em relação ao respeito à natureza é parte dessa mudança, é uma acumulação que de repente dá um estalo e a humanidade evolui. Em todo este processo ocorrem os governos populares, as revoluções democráticas, tudo é parte do mesmo.”

François Houtart diz: “Temos que discutir alternativas ao modelo econômico capitalista prevalecente hoje e os meios para rever o próprio paradigma (orientação básica) da vida coletiva da humanidade sobre o planeta, conforme definido pela lógica do capitalismo, que hoje é global. A vida coletiva é composta por quatro elementos que chamamos de base, porque as exigências são parte da vida de toda sociedade, desde as mais antigas até as mais contemporâneas:
1. a relação com a natureza;
2. a produção da base material da vida física, cultural e espiritual;
3. a organização social e política coletiva; e
4. a leitura do real e autoenvolvimento dos atores na sua construção da cultura.
Ou seja, cada sociedade tem essa tarefa para realizar. As alternativas são tão importantes que não vão chegar por si só. É somente pela pressão dos movimentos sociais, movimentos políticos também, que podemos esperar chegar a redefinir os objetivos fundamentais da presença humana no planeta e o desenvolvimento humano no planeta.”

François Houtart continua: “Há uma segunda realidade, que são os países que podemos chamar de “adaptações ao sistema”. E aí existem dois tipos de países. Há os que dizem: sim, o sistema necessita de mudanças fundamentais e devemos nos adaptar à lógica do capitalismo. E para se ter mais justiça social e repartir parte do lucro, como já dizia Marx, com o rápido avanço das forças produtivas, temos um aumento dos lucros e da destruição da natureza. Nesse tipo de desenvolvimento se inserem Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, que possuem programas sociais eficazes. Com resultados indubitáveis porque milhões de pessoas saíram da pobreza, o que não podemos desprezar, porém, esse modelo não transforma profundamente a sociedade; isso representa apenas uma redistribuição de parte do lucro. Não podemos dizer que é uma mudança de paradigma. Entretanto, há países como Venezuela, Equador e a Bolívia, que têm outro discurso, o do socialismo do século XXI, que pelo menos faz uma alusão a uma transformação fundamental. Pelo menos no Equador e na Bolívia, entre o discurso e a prática eu vejo grande avanços, em que as práticas dos governos seguem uma orientação das demandas sociais apresentadas pelos movimentos sociais.”

O vice-presidente da Bolívia García Linera diz: "Na Bolívia, o fato fundamental que vivemos é que aquelas pessoas, a maioria da população de antes e de agora, os indígenas, a quem a brutalidade da invasão e os sedimentos centenários da dominação estabeleceram no próprio sentido de classes dominantes e classes dominadas que estavam predestinados a serem camponeses, trabalhadores de postos inferiores, artesãos informais, porteiros ou garçons, hoje são ministros e ministras, deputados, senadores, diretores de empresas públicas, redatores de constituições, juízes máximos da justiça, governadores; presidente. A descolonização é um processo de desmontagem das estruturas institucionais, sociais, culturais e simbólicas que subsumem a ação cotidiana dos povos aos interesses, às hierarquias e às narrativas impostas por poderes territoriais externos".

Leonardo Boff lembra: "Paul Krugmann, prêmio Nobel de economia, passou uns dias na Islândia para estudar a forma como esse pequeno país ártico saiu de sua crise avassaladora. Seguiram o caminho correto que outros deveriam também ter seguido: deixaram os bancos quebrar, puseram na cadeia os banqueiros e especuladores que praticaram falcatruas, reescreveram a constituição, garantiram a seguridade social para evitar uma derrocada generalizada e conseguiram criar empregos. Conseqüência: o país saiu do atoleiro e é um dos que mais cresce nos países nórdicos. O caminho islandês foi silenciado pela mídia mundial de temor de que servisse de exemplo para os demais países".

Enquanto que no resto do mundo banqueiros e empresários especuladores eram recompensados, por terem dado o calote e quebrado a economia mundial, com 15 trilhões de dólares vindos dos cofres dos Estados; dinheiro subtraído do salário dos professores, do sistema de saúde, educacional e previdenciário, e assim por diante. Tudo normal!

Wladimir Pomar analisa que o projeto de desenvolvimento econômico e social que os governos petistas estariam executando garante tanto a implementação de políticas voltadas para as camadas populares quanto a geração de lucros para os capitalistas. Ele aposta que, ao aumentar a força social dos trabalhadores, esse modelo de desenvolvimento fortaleça também a média burguesia nacional, que pode enfrentar a burguesia associada aos monopólios estrangeiros. “Cria, portanto, as condições materiais para o delineamento das classes em disputa e para o desenvolvimento da luta de classes. É dessa luta que pode emergir, com mais clareza, um verdadeiro projeto popular, ou democrático-popular, ou socialista”, reforça. Para ele, a força demonstrada pelas classes populares é que vai definir os rumos do governo.

No entanto, o povo está preocupado em comprar geladeira com redução do IPI e não com a revolução. Eu acho que este governo não está mais em disputa. A direita já ganhou esta disputa no projeto neodesenvolvimentista - social democrata.

Valter Pomar analisa: "O desafio da esquerda político-social é, nos países onde controla o governo nacional, impulsionar mudanças estruturais de natureza democrático-popular. Aqui é preciso levar em consideração o seguinte:
a) em âmbito mundial, a esquerda ainda se encontra numa etapa de defensiva estratégica;
b) eleger governos e realizar revoluções são coisas distintas;
c) é preciso criar as condições para sustentar politicamente as reformas estruturais necessárias;
d) os governos de centro-esquerda enfrentam a oposição não apenas da direita, mas também uma oposição de esquerda (vide a mobilização em curso, no mês de abril, na Bolívia);
e) parte desta oposição tem uma causa estrutural: nesta fase, os governos de esquerda são obrigados a estimular o desenvolvimento capitalista, o que gera conflitos com parte da base popular dos governos de esquerda.
Uma vez conquistada a presidência, o grande desafio tático da esquerda brasileira continuou sendo a superação da herança neoliberal, que continua extremamente influente. E o grande desafio estratégico consistia em, mantendo o governo nacional e a hegemonia do PT sobre as forças progressistas, fazer da alternativa democrático popular & socialista um dos pólos da disputa. A vinculação entre o desafio tático e o desafio estratégico está na realização das chamadas reformas estruturais, que alterem a concentração de renda, propriedade e poder. Noutras palavras: reforma tributária, reforma agrária, reforma urbana, reforma do sistema financeiro, reforma política, democratização da comunicação, etc. Se um governo de esquerda não realiza estas reformas, ele não possui significado estratégico, por mais que ele tenha contribuído para melhorar a vida do povo. Mas para realizar estas reformas, um governo de esquerda precisa de sustentação política, sem o que ele pode ser derrubado, como ocorreu com o governo de Honduras."

No entanto, este mesmo governo não está fazendo nada para construir a sua sustentação política a partir das massas organizadas promovendo formação política ideológica organizativa para que haja uma reação prática no reascenso das lutas populares. A única sustentação que este governo está construindo é o pacto policlassita que lhe garante a governabilidade a partir dos seus aliados de direita, centro e centro-esquerda no Congresso Nacional. Para o PAC, bilhões; para os movimentos populares: conversa dissuasória. Fora as políticas compensatórias para as camadas populares que compensam em parte as desigualdades existentes no sistema capitalista (se fosse justo não necessitaria de políticas compensatórias), que mesmo assim deslanchou a economia, dando um pouco para os empobrecidos e muito lucro para os patrões. “As pessoas ricas foram as que mais ganharam dinheiro no meu governo. O que elas não conseguiram superar é o preconceito de um metalúrgico ser presidente desse Brasil”, disse o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em discurso em Minas Gerais.
Resumindo: ♫♫ O capitalismo continua lindo! ♫♫

Por isso ...
Trabalho de base é a ordem para as igrejas, partidos de esquerda, movimentos populares, sindicatos, sem isto não haverá reascenso do movimento de massas e sem este reascenso não haverá revolução. Como se dará este trabalho de base? Isto se dará com lutas concretas e com formação.

Citando Lênin:
... Devo dizer que essas tarefas da juventude (...) poderiam ser definidas com uma só palavra: aprender. Procurarei responder também à pergunta de como devemos aprender: somente ligando indissoluvelmente cada passo na atividade da escola, cada passo na educação, instrução e formação à luta de todos os trabalhadores contra seus exploradores. Sem trabalho, sem luta, o conhecimento livresco do comunismo, adquirido em folhetos e obras comunistas, não tem absolutamente nenhum valor, uma vez que não faria mais que continuar o antigo divórcio entre a teoria e a prática, esse mesmo divórcio que constituía o mais repugnante traço da velha sociedade burguesa.
Só se pode chegar a ser comunista quando se enriquece a memória com o tesouro da ciência acumulada pela humanidade. O comunista que se vangloriasse de seu comunismo simplesmente por ter recebido algumas conclusões já estabelecidas, sem ter realizado um trabalho muito sério, muito difícil e muito grande, sem analisar os fatos, frente aos quais está obrigado a adotar uma atitude crítica, seria um comunista muito lamentável.
... se uma pessoa diz que é comunista e que não tem necessidade de conhecimentos sólidos, jamais sairá dele nada que se pareça a um comunista. Esta geração poderá aprender o comunismo unicamente se ligar cada passo de sua instrução, de sua educação e de sua formação à luta incessante dos proletários e dos trabalhadores contra a antiga sociedade baseada na exploração. (Lenin. Tarefas da juventude na construção do socialismo)

Onde o nosso povo luterano tem oportunidade e vontade para estudar e ler teologia? Qual o projeto de formação teológica de base de nossas paróquias? Formação Teológica abrangente que inclui Bíblia, Confessionalidade e Realidade que incentivam à participação nas lutas do povo oprimido do qual nosso povo luterano faz parte. Qual o projeto de formação de militantes e de lideranças de nosso Sínodo? Formação não neutra, é claro. O Planejamento Estratégico de nosso Sínodo e de nossas paróquias inclui a formação teológica e a capacitação teórica de nosso povo oprimido para as lutas por uma nova sociedade não capitalista? Em qual projeto de luta concreta por mais vida e justiça nossas paróquias/comunidades participam e que faz parte de seu trabalho rotineiro ao lado da OASE, JE, etc.? Nossas paróquias têm representantes escolhidos pelas comunidades nos movimentos populares, como MPA, MMC, pequenas cooperativas, movimento ecológico, etc.? Nossas paróquias apóiam e estão inseridas nas lutas sindicais e populares dos camponeses e operários, dos quais nossos membros participam ou que lhes dizem respeito? As paróquias da IECLB estimulam a participação de nosso povo no sindicato, no movimento popular, nos partidos de esquerda e se engajam e apóiam suas lutas? Pois são estas questões que definem e realizam vida digna e abundante, segundo Jo 10.10. Não adianta só na hora de fazer o orçamento da paróquia dizer: o nosso povo é pobre e por isso não dá para aumentar a contribuição. A paróquia tem que se engajar para acabar com as causas da pobreza e aí vamos descobrir como funciona a luta de classes na sociedade e na igreja.

As respostas destas questões mostrarão se promovemos Religião ou Evangelho.

A paróquia de Condor tem, se muito, 20 famílias que são patrões (donos de pequenas lojas, padarias, mercados, oficinas mecânicas e indústrias metalúrgicas - entre estas, duas, de porte médio - 150 peões cada - 18 destes patrões nem dá para chamar de capitalistas, são pequenas empresas familiares com dois a cinco peões) e o resto das 450 famílias são pequenos agricultores e peões de fábrica ou do pequeno comércio. A paróquia não tinha ninguém escolhido (e hoje certamente ainda não tem) como representante, das 450 famílias da classe trabalhadora, nos sindicatos (agrícola, metalúrgico e comercial) e no MPA para informar à paróquia das lutas por mais vida e justiça para que ela pudesse convocar seus membros para estas lutas que defendem os interesses das 450 famílias membro. Estas lutas necessariamente não se dirigem contras estas outras 20 famílias de patrões, pois são lutas gerais por melhores preços dos produtos agrícolas, salários e condições de vida. É a ditadura dos interesses de classe da minoria capitalista sobre a esmagadora maioria trabalhadora. A igreja apóia e se engaja na ditadura de classe, não questionando e nem combatendo a classe capitalista e com isto luta contra a classe trabalhadora. Assim, ela está conscientemente prejudicando as 450 famílias membro. Isto significa que esta paróquia da IECLB tem uma opção preferencial pelos patrões, portanto ela não é neutra na luta de classes. Ela pende para o lado dos patrões e para o lado do agronegócio defendido pela Cotripal - cooperativa de agricultores controlada pelo agronegócio que incentivava a agricultura industrial, cujo departamento técnico recomenda o uso de muito adubo químico, veneno e sementes transgênicas vendidos por ela, é claro.

Mas esta idéia da igreja fazer uma opção de classe, optar pela classe trabalhadora, é totalmente estapafúrdia porque a igreja é de todos e para todos! Deus é de todos! Deus não é de todos: no caso do Êxodo Deus era o Deus da classe dos camponeses sem terra escravos e não do Faraó, a classe do Estado. O Faraó nem conhecia Javé e nem queria saber dele e muito menos de seu projeto. No NT Javé se fez classe camponesa em Jesus de Nazaré e não classe dominante nascendo na família real de Herodes, onde os magos o procuraram. Por que Javé opta pela classe oprimida? Porque é oprimida.

A opção preferencial da igreja pela classe trabalhadora iria dar o maior furdunço. Conversa fiada! A igreja já fez a sua opção de classe há muito tempo, apenas não admite o fato. A igreja há muitos anos já optou pela classe capitalista e faz de conta que é neutra. O que acontece é que a classe capitalista produz as suas idéias e as repassa para toda a sociedade como se fossem idéias da sociedade toda, quando são apenas as idéias da classe capitalista. No caso do padre que optou em não visitar o acampamento dos sem terra mostra a sua opção em favor dos fazendeiros. Alguém fez algum escândalo ou furdunço por causa disso? Não, pois isto é normal. É o caso do Lula, quando uma vez pôs na cabeça o boné do MST; foi aquele auê. Ninguém disse uma palavra contra quando ele pôs na cabeça o chapéu dos fazendeiros nas exposições agropecuárias pelo Brasil afora inúmeras vezes e chamou os usineiros caloteiros e escravocratas de heróis.

Todos sabem da opção classista da igreja, por isso não há nada a se admirar. Por que a classe trabalhadora não faz um escândalo por causa desta opção de classe da igreja? Porque a classe trabalhadora assume como seu o jeito de pensar da classe capitalista e por isso não vê nesta opção de classe da igreja uma inconseqüência. Está na hora de desmascarar a opção camuflada de classe da igreja; a sua opção pela classe capitalista. Que faça a sua opção declarando isto abertamente, pois desta forma camuflada é farisaismo. As igrejas pentecostais com a teologia da prosperidade fazem esta opção abertamente. Ao menos são sinceros, fariseus somos nós. No caso de Condor 20 famílias (patrões) determinam a teologia das 450 restantes (da classe trabalhadora) e todos acham normal esta opção de classe da igreja. A igreja opta pela esmagadora minoria e está tudo bem! Ninguém se escandaliza! Este é o poder da Ideologia Dominante!

A igreja optar pela classe capitalista é normal, ela sempre fez isso, dizendo ser neutra quando aceita os bois dos fazendeiros para a festa e por isso não pode visitar o acampamento dos sem terra. Tudo normal! Os bois dão a linha teológica da igreja, como no Ex 32; é a teologia dos bois e da tecnologia do agronegócio que definem o ser igreja. É como já dizia o missionário jesuíta Manuel da Nóbrega em 1558, legitimando a exploração da mão de obra escrava indígena no Brasil, em sua carta ao rei de Portugal:
“... Se S.A. os quer ver todos convertidos, mande-os sujeitar e deve fazer estender aos cristãos por a terra dentro e repartir-lhes os serviços dos índios àqueles que os ajudarem a conquistar e senhoriar como se faz em outras partes de terras novas ... Sujeitando-se o gentio, cessarão muitas maneiras de haver escravos mal havidos e muitos escrúpulos, porque terão os homens escravos legítimos, tomados em guerra justa e terão serviços de avassalagem dos índios e a terra se povoará e Nosso Senhor ganhará muitas almas e S.A. terá muita renda nesta terra porque haverá muitas criações e muitos engenhos, já que não haja muito ouro e prata”.

"Mande-os sujeitar" significa aldear (que é uma palavra mais bonita para gueto ou campo de concentração) os indígenas para que os colonos portugueses os pudessem usar para o trabalho em suas fazendas ou então para o trabalho da igreja como escravos ou semi escravos, como os espanhóis faziam com a mita (os índios eram escalados por sorteio para uma temporada de serviços compulsórios nas minas ou fazendas com baixíssima remuneração e trabalho desumano) ou a encomienda (os índios em troca do trabalho não remunerado nas minas ou fazendas recebiam uma educação religiosa cristã).

O objetivo de tudo isto está claro: "haverá muitas criações e muitos engenhos". É a Empresa Brasil em funcionamento. Assim é a opção preferencial pelos patrões escravocratas assassinos. O espírito da opção preferencial da igreja de hoje pelos patrões é o mesmo do tempo da Conquista: "Nosso Senhor ganhará muitas almas e o patrão terá muita renda", apenas as facetas são diferentes e diversificadas, a essência é a mesma: garantir o lucro, nem que seja em cima de milhões de cadáveres e, em último caso, a extinção da humanidade. Com o Planeta Terra o capitalismo não vai poder acabar como um todo, pois ele se regenerará em parte depois que não houver mais vida humana sobre a Terra. O que sobrar de vida vegetal e animal, se sobrar, sobreviverá à humanidade. Nós de cima de nossa soberba e arrogância desmedida achamos que somos eternos e imortais, não o somos, pois o "único Soberano, o Rei dos reis e Senhor dos senhores; o único que possui imortalidade" é Deus (1 Tm 6.15-16), que se fez pessoa em Jesus Cristo para nos conceder a imortalidade de graça pela fé em Jesus Cristo pela ressurreição do corpo. O que salva é a fé em Jesus Cristo, vivida na prática do dia a dia no processo coletivo de construção do Reino de Deus, e não a fé no capitalismo. Somente Jesus Cristo salva o capitalismo não salva! No entanto, muitos 'cristãos' vivem como se o capitalismo salvasse. Não esquecendo que fé em Jesus Cristo pressupõe subversão frente ao capitalismo.
Porque não colar um adesivo no carro com os dizeres: Só Jesus salva, o capitalismo não salva!

O que não pode acontecer é a igreja fazer uma opção preferencial pela classe trabalhadora, só porque ela é oprimida, apenas porque Javé fez isto no Êxodo optando pelos escravos, só porque eram escravos, ou só porque Javé optou em se fazer da classe camponesa em Jesus de Nazaré. Isso não pode, isso é ser parcial, é rejeitar os patrões, é se posicionar contra os ricos e são os ricos que mantém a igreja, é rejeitar uma parte da comunidade, é heresia, é contra a ordem normal e natural das coisas, é contra toda a tradição milenar da igreja, é injusto, é tomar partido, é fazer política (a igreja não pode fazer política de esquerda, só de direita; não pode visitar um acampamento dos sem terra, mas pode visitar o fazendeiro para receber dele os bois para a festa), é desonesto, é inconveniente, é criar conflito, é criar confusão, é criar tumulto, é promover a luta de classes e a igreja não deve tomar partido na luta de classes, pois a igreja é neutra, é acabar com a neutralidade da teologia, é discriminação! Enfim, isto é comunismo!

Sugestão de leitura:
Jesus. Aproximação Histórica. José Antonio Pagola. Editora Vozes.
História do Socialismo e das Lutas Sociais. Max Beer. Editora Expressão Popular.

2. A Realidade do Reino de Deus
Qual a resposta de Jesus Cristo frente à Ditadura do Pensamento Único para legitimar e reproduzir a Ditadura do Capital dizendo que não existe a esperança e nem a possibilidade da construção de outra sociedade além da capitalista?

Lc 4.43 “Ele, porém, lhes disse: É necessário que eu anuncie o evangelho do reino de Deus também às outras cidades, pois para isso é que fui enviado”. Jesus diz que ele foi envidado para anunciar o Evangelho do Reino de Deus em contraposição ao evangelho do reino do mundo - na época a Roma escravista e hoje o capitalismo.
Evangelho e Reino: Jesus parte da realidade da prática romana para construir a sua prática em oposição a esta.

Análise da Realidade da luta de classes: Roma imperialista X Palestina subjugada
Lc 2.1 “Naqueles dias, foi publicado um decreto de César Augusto, convocando toda a população do império para recensear-se. 2 Este, o primeiro recenseamento, foi feito quando Quirino era governador da Síria. 3 Todos iam alistar-se, cada um à sua própria cidade. 4 José também subiu da Galiléia, da cidade de Nazaré, para a Judéia, à cidade de Davi, chamada Belém, por ser ele da casa e família de Davi, 5 a fim de alistar-se com Maria, sua esposa, que estava grávida”. Luta de classes: Estado X Camponeses palestinos
Lc 2 e 3 é intencionalmente semelhante ao início dos livros proféticos onde se faz uma análise da conjuntura do Estado que domina sobre a sociedade. Citando os governantes o povo se lembrava de seu governo; é como citar Fernando Collor ou FHC hoje, que vem à memória: neoliberalismo, corrupção, privataria e crises financeiras.

Vamos comparar João Batista com Amós:
Lc 3.1-2 “No décimo quinto ano do reinado de Tibério César, sendo Pôncio Pilatos governador da Judéia, Herodes, tetrarca da Galiléia, seu irmão Filipe, tetrarca da região da Ituréia e Traconites, e Lisânias, tetrarca de Abilene, sendo sumos sacerdotes Anás e Caifás, veio a palavra de Deus a João, filho de Zacarias, no deserto”.
Am 1.1 “Palavras que, em visão, vieram a Amós, que era entre os pastores de Tecoa, a respeito de Israel, nos dias de Uzias, rei de Judá, e nos dias de Jeroboão, filho de Joás, rei de Israel, dois anos antes do terremoto”.

O relato do Natal aponta o Estado oprimindo os camponeses, via impostos. Nesta luta de classes Javé se insere e se faz pessoa no camponês, leigo, palestino, empobrecido, marginalizado, sem terra e sem teto Jesus de Nazaré para construir uma nova sociedade, em oposição à atual, que Ele chama de Reino de Deus. Isto é subversão. A subversão é a essência do Evangelho do Reino de Deus (Rm 12.1-2, Tg 1.27), por isso Jesus foi à cruz e a primeira comunidade ao martírio.

Martírio de Justino e de seus companheiros
O prefeito Rústico pronunciando a sentença disse: "Esses que não quiseram sacrificar aos deuses nem obedecer ao mandato do imperador, sejam, depois de chicoteados, conduzidos à tortura, sofrendo a pena capital de acordo com as leis".
Martírio de Crispina
O procônsul Anulino leu a sentença: “Crispina, que se mantém obstinada em uma indigna superstição e que se negou a sacrificar aos nossos deuses, conforme mandam as celestiais leis dos augustos, ordeno que seja passada ao fio da espada”.

O Estado não quer o Evangelho (subversão), mas quer a Religião (submissão):
Gn 47.22 – sacerdotes fazem parte do aparelho ideológico do Estado. Jesus não era sacerdote (que sempre é um aliado do Estado e do sistema, o/a pastor/a também sempre é convidado para as inaugurações para abençoar em nome de Deus bancos, fábricas, prefeituras), mas camponês leigo.
2 Rs 16.3-4: “Porque (rei Acaz) andou no caminho dos reis de Israel e até queimou a seu filho como sacrifício, segundo as abominações dos gentios, que o Senhor lançara de diante dos filhos de Israel. Também sacrificou e queimou incenso nos altos e nos outeiros, como também debaixo de toda árvore frondosa”. O Estado transformou o Evangelho em Religião.

O Evangelho liberta para uma nova sociedade: o Reino de Deus; a Religião aprisiona, mata, oprime e mantém a sociedade de classes. O Evangelho diz em Ap 18.4 – “retirai-vos dela, povo meu, para não ser cúmplices em seus pecados e para não participardes dos seus flagelos” – A ordem é não legitimar a prática econômica, política, cultural, religiosa e ideológica de Roma e, hoje, do capitalismo.

Por Jesus apontar, com o anúncio e vivência do Evangelho do Reino de Deus, para a construção de uma nova sociedade ele é crucificado, como diz em Lc 23.2 e 5: “E ali passaram a acusá-lo, dizendo: Encontramos este homem pervertendo a nossa nação, vedando pagar tributo a César e afirmando ser ele o Cristo, o Rei. Insistiam, porém, cada vez mais, dizendo: Ele alvoroça o povo, ensinando por toda a Judéia, desde a Galiléia, onde começou, até aqui”. Jesus foi para a cruz por causa de sua Práxis contra o Estado (Lc 13.32 – Herodes, a raposa) e contra a Religião (Templo de Jerusalém), Jo 11.47-48.

As igrejas cristãs normalmente se tornam Religião e deixam de ser Evangelho, pois não admitem a luta contra o status quo: o capitalismo; não se inserem na luta de classes a favor do oprimido e contra o opressor, pois os dois estão nas igrejas e as igrejas optam em ficar do lado do opressor, dizendo serem neutras (nem o diabo acredita nesta neutralidade).

Um relato de um pastor na Rondônia:
Quando ainda fazia pouco tempo que chegara à Paróquia o pastor foi visitar o padre da cidade. Havia perto da cidade um acampamento de sem terra e o pastor perguntou ao padre se ele já havia ido visitar este acampamento de sem terra. O padre respondeu: “Nós temos os dois na igreja: os fazendeiros e os sem terra. Os fazendeiros sempre dão alguns bois para a festa da Paróquia e aí fica difícil visitar os sem terra”. O pastor perguntou: “A gente não poderia ir juntos visitar os sem terra acampados à beira da estrada?” O padre respondeu: “Pois é, a gente deveria um dia se sentar e falar sobre isto”. Mas nunca se sentaram para falar sobre isto.

Como as igrejas têm medo de enfrentar e de combater o agronegócio escravista, predador da natureza, escravocrata e assassino (que representa apenas 0,9% dos proprietários, mas controla 44% de toda a terra deste país), então este se reproduz, também pela nossa omissão, pois a estrutura produtiva de hoje é similar à do tempo colonial: latifúndio, monocultura e trabalho escravo (hoje o trabalho 'livre' é majoritário), que produz para suprir as necessidades do primeiro mundo. Continuamos como nos período colonial sujeitos aos interesses da metrópole; existimos e produzimos já há 500 anos para servir os senhores do comércio internacional. 71% de nossas exportações são do agronegócio e da mineração (com alta tecnologia importada onde a metrópole lucra triplamente: vendendo a tecnologia [máquinas, produtos químicos, venenos e sementes], comprando o seu resultado [soja, milho, celulose transgênicas] e subordinando o Brasil como produtor de matérias primas baratas que a metrópole não tem) que continuam matando índios, posseiros, sem terra e quilombolas que os ameaçam com a sua simples existência. É o passado se reproduzindo no presente com todas as suas mazelas. Estamos num processo de desindustrialização produzindo mercadorias de baixa tecnologia final e por isso de baixo retorno financeiro. Um empresário chinês disse, numa entrevista na TV, que a China compra o granito na Bahia, o fatia e o deixa polido (industrializa) na China e o exporta para os USA como produto acabado. Os negócios com o Brasil são um negócio da China!

Leonardo Boff diz: "Não vieram para fundar aqui uma sociedade, mas para montar uma grande empresa internacional privada, uma verdadeira agro-indústria, destinada a abastecer o mercado mundial. Ela resultou da articulação entre reinos, igrejas e grandes companhias privadas como a das Índias Ocidentais, Orientais, a Holandesa (de Mauricio de Nassau), com navegadores, mercadores, banqueiros, não esquecendo as vanguardas modernas, dotadas de novos sonhos, buscando enriquecimento rápido.
Ocupada a terra, para cá foram trazidas matrizes (cana de açúcar e depois café), tecnologias modernas para a época, capitais e escravos africanos. Estes eram considerados “peças” a serem compradas no mercado e como carvão a ser consumido nos engenhos de açúcar. Com razão afirma Souza Lima: “o resultado foi o surgimento de uma formação social original e desconhecida pela humanidade até aquele momento, criada unicamente para servir à economia; no Brasil nasceu o que se pode chamar de ‘formação social empresarial”.
A Europa só pôde fazer a sua revolução, chamada de modernidade, com seu direito e instituições democráticas, porque foi sustentada pela rapinagem brutal feita nas colônias. A empresa Brasil é a categoria-chave, segundo Souza Lima, para se entender a formação histórica do Brasil e o lugar que lhe é assinalado no processo atual de globalização desigual."

Como diz Paul Freston: “E o que sempre acontece com as religiões de massas é que elas passam a se parecer cada vez mais com a sociedade. Em vez de transformar a sociedade, a religião é transformada por ela”.

As igrejas cristãs (com suas devidas e honrosas exceções, que confirmam a regra), como os fariseus, partem da teologia e não partem da prática da luta pela vida plena em direção à uma nova sociedade que Jesus chama de Reino de Deus em seu trabalho com o povo. Os fariseus começam citando a Lei (Jo 8.3-5: "Os escribas e fariseus trouxeram à sua presença uma mulher surpreendida em adultério e, fazendo-a ficar de pé no meio de todos, disseram a Jesus: Mestre, esta mulher foi apanhada em flagrante adultério. E na lei nos mandou Moisés que tais mulheres sejam apedrejadas; tu, pois, que dizes?"), mas Jesus parte da prática: Lc 18.41: “Que queres que eu te faça? Respondeu ele: Senhor, que eu torne a ver”. O ensino de Jesus sempre parte de uma prática: Lc 14.7 “Reparando como os convidados escolhiam os primeiros lugares, propôs-lhes uma parábola”.

Jesus parte da prática da vida camponesa na forma de construir as parábolas:
Mc 4.3 “Ouvi: Eis que saiu o semeador a semear. 4 E, ao semear, uma parte caiu à beira do caminho, e vieram as aves e a comeram. 5 Outra caiu em solo rochoso, onde a terra era pouca, e logo nasceu, visto não ser profunda a terra. 6 Saindo, porém, o sol, a queimou; e, porque não tinha raiz, secou-se. 7 Outra parte caiu entre os espinhos; e os espinhos cresceram e a sufocaram, e não deu fruto. 8 Outra, enfim, caiu em boa terra e deu fruto, que vingou e cresceu, produzindo a trinta, a sessenta e a cem por um. 9 E acrescentou: Quem tem ouvidos para ouvir, ouça”.
O nosso problema é que não temos ouvidos para ouvir. Eles estão tapados pela ideologia da classe dominante. Fomos ensinados a não ver as coisas, pois não aprendemos a ler a realidade.

Excurso:
Quando digo que fomos ensinados a não ver as coisas é porque é assim mesmo. Fiz a experiência com o texto de Gn 11.1-9 em muitos grupos. Primeiro eu pedia para as pessoas contarem o texto e elas contavam a história da Torre de Babel que ia até o céu e que Deus confundiu a língua e aí parou a construção da torre. Depois a gente lia o texto e eu pedia para recontar o texto lido e as pessoas contavam a mesma história da torre. No entanto, quando havia uma pessoa no grupo que não conhecia o texto ela falava da cidade e da torre. Por que? Porque ela não havia sido ensinada a não ver que o centro do texto gira em torno da cidade e não na torre, que é apenas o quartel dentro da cidade (que na verdade é o Estado) onde mora o rei com seu exército. Assim também somos ensinados a não ver a realidade como ela é ao nosso redor e por isso não a compreendemos corretamente. Vemos a realidade como ela foi ensinada para nós do ponto de vista da classe dominante e não a partir da realidade da classe trabalhadora, da qual fazemos parte.


Aprendemos que vivemos numa sociedade harmônica e aprendemos uma “teologia” desconectada da realidade e até chegamos a dizer que a “teologia e a igreja” são neutras, da mesma forma como a imprensa e a justiça dizem que são neutras. O presidente do supremo tribunal concedeu dois hapeas corpus seguidos ao banqueiro e fazendeiro Daniel Dantas, mas a justiça não o concedeu a um homem que roubou três peças de roupa no valor de 12 reais e já estava preso há um ano e meio. A igreja pega um filho de camponeses pobres e o coloca na Faculdade de Teologia sem analisar com ele a realidade de sua origem e nem a realidade para onde ele irá ser enviado. Por que? Porque a teologia é “neutra”, diz a igreja, comendo churrasco e bebendo cerveja com o patrão. Há aqui uma ascensão social, pois agora ele não é mais um camponês empobrecido, mas pastor/a, que igualmente é pobre, mas acha que é classe média, e se ilude que agora tem poder semelhante à classe dirigente. Pastor/a pensa que é classe média e esta tem como objetivo de se integrar à classe capitalista e por isso fica “neutro” do lado da classe capitalista.

A classe média começa a partir de uma renda mensal de 13 Salários Mínimos (entre 13 e 35 SM) e não tem nada a ver com a classe ‘C’ de consumo, que é a classe de consumo que está saindo da pobreza, ficando entre R$ 2.500,00 a R$ 6.500,00 (fica na faixa de 4 SM a 10 SM; a renda de pastor/a está no início dessa faixa, raspando na pobreza, mas tem panca de classe média). A Subsistência Ministerial do/a Pastor/a já esteve em 9 a 10 Salários Mínimos com os avanços. Houve um arrocho nos últimos 15 anos, mesmo com a reposição havida após 1997, que teve o efeito do bode na sala. Agora se deu um aumento de 1,5% acima da inflação, que foi o efeito de oferecer restolho de milho para o burro para ele se deixar pegar no potreiro para ser posto no arado para trabalhar das 7 às 7 em dia de sol forte.

Quem recebe 2 SM é pobre, 1 SM é miserável e abaixo de 1 SM é indigente. No País retratado em 2010 pelo IBGE, a maioria da população [60,7%] vivia em domicílios com renda familiar per capita de menos de um salário mínimo. Segundo o DIEESE em janeiro de 2012 o salário mínimo nominal era R$ R$ 622,00 e o salário mínimo necessário era de R$ R$ 2.398,82, previsto para uma família de 4 pessoas. A SM na IECLB sempre está perto deste valor calculado pelo DIEESE: Salário Mínimo Necessário para reproduzir a sua força de trabalho e só isso!

Salário mínimo de acordo com o preceito constitucional: "salário mínimo fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender às suas necessidades vitais básicas e às de sua família, como moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, reajustado periodicamente, de modo a preservar o poder aquisitivo, vedada sua vinculação para qualquer fim". (Constituição da República Federativa do Brasil, capítulo II, Dos Direitos Sociais, artigo 7º, inciso IV).
http://www.dieese.org.br/rel/rac/salminMenu09-05.xml

Não dá para aumentar a SM do/a pastor/a porque os membros são pobres, se diz na hora de discutir o orçamento, mas na hora do pastor inventar de fazer um trabalho com os pobres para que saiam da pobreza, com os sem terra, sem teto, pequenos agricultores, etc. o/a pastor/a é mandado embora por se envolver com o Movimento Popular; isto não pode, isto é comunismo. Aí de repente não há mais pobres na igreja. Só há pobres na igreja na hora de fazer o orçamento, depois eles evaporam. Isto se chama de HIPOCRISIA FARISAICA.

Excurso:
A Mensagem e as Conclusões do Concílio de 1982 deixam clara a nossa postura como igreja frente à luta contra a pobreza e a opressão:
... Para que todos possam usufruir das dádivas do Criador, agindo responsavelmente diante delas, propomos o seguinte:
- realizar campanha de ampla informação e conscientização dos problemas agrários e urbanos:
- apoiar o agricultor na sua luta pela permanência no campo:
- assumir e defender com responsabilidade evangélica as reivindicações dos movimentos sociais, fazendo um trabalho de base com associações de bairros, atingidos por barragens, colonos sem terra, bóias-frias, sindicatos, proteção ambiental, além de inúmeras outras formas de atuação onde o amor de Deus quer se tornar vivo e real entre as pessoas.

Conclusões do Concílio de 1982
Apoio engajado e consciente ao pequeno agricultor e à pequena indústria, dentro da perspectiva de um modelo simples de vida, decorrente do próprio Evangelho. Por isso apoiar:
a) Movimentos Populares, associações de bairro, órgãos de classe, sindicatos dos trabalhadores rurais, cooperativismo sadio.
b) Projeto de CAPA (Centro de Aconselhamento ao Pequeno Agricultor), LACHARES, grupos em defesa da ecologia e ambiente natural
c) Movimentos no espírito de não violência
d) As prioridades de ação da IECLB e confessionalidade luterana

Prioridades da IECLB (1979-1982)
1. Unidade na Pluralidade
2. Evangelização
3. Índio
4. Reforma Agrária
5. Contribuição Proporcional

Acho que a proposta de se fazer o Planejamento Estratégico é muito boa, mas está sendo solapada pela base: pastores/as e paróquias não estão interessados. No mais, para se fazer um Planejamento Estratégico na paróquia se precisa primeiro ter um Planejamento Estratégico da IECLB com linhas bem claras do que se quer a nível nacional. Assim como está vamos reproduzir a Associação Cultural e Recreativa com fins Religiosos. Estas decisões conciliares dos anos 80 dizem muito claro o que se quer, depois de se fazer novamente algo parecido dá para se fazer um Planejamento na paróquia a partir destas prioridades da Igreja como um todo. Do jeito que está vamos continuar jogando pérolas para os porcos. Começar pela base para começar pela base sem se saber o que se quer é basismo ingênuo. Acho que se está começando pela base porque a IECLB a nível nacional não sabe o que quer. Não sabe nem que está reproduzindo o projeto do capital. Na verdade se sabe: quer-se reproduzir a Associação Cultural e Recreativa com fins Religiosos (reduzir o Evangelho à Religião) para que o sistema capitalista não seja ameaçado em sua essência. A função do Concílio da Igreja é dar uma direção clara para a igreja com critérios e prioridades claros a partir de uma análise estrutural do sistema, da realidade brasileira e das comunidades baseado no Evangelho do Reino de Deus que sempre aponta para a construção de uma nova sociedade não capitalista. Mas, isto é coisa de comunista! Nós temos que fazer o nosso "Vaticano II" com calma e com tempo, mas fazer. Do jeito como é hoje isto não será feito, pois não estamos dispostos a enfrentar o fantasma do capitalismo que está em nós e nos domina. Lutero lembra no Catecismo Menor:
Terceiro Artigo do Credo - Nesta Igreja ele perdoa, cada dia e plenamente, todos os pecados a mim e a todas as pessoas que crêem.
Quinto Pedido do Pai Nosso - Pedimos que Deus nos conceda tudo por graça, já que diariamente pecamos muito e nada merecemos a não ser castigo.
É a conversão diária ao Evangelho do Reino de Deus e a negação diária do capitalismo, por ser instrumento do diabo. Ou enfrentamos isto como Igreja ou vamos continuar como cegos guiando outros cegos caindo no mesmo buraco.

Conclusões do Concílio de 1986:
... Estamos convencidos de que os frutos de uma tal atitude, motivada pela fé no Senhor Jesus Cristo, contribuirão para a transformação de nossa sociedade e mostrar-se-ão concretamente num apoio mais comprometido aos sem terra e casa, aos índios, aos negros, às mulheres, aos operários e aos pequenos agricultores, mostrar-se-ão em sinais concretos de justiça e de promoção de vida plena entre nós e no mundo que nos cerca.

Estas propostas pastorais continuam valendo enquanto não forem revogadas por outro concílio. O missionário da MEUC me disse em 1997: “Isto são decisões antigas de 20 anos atrás”. Eu respondi: “O Evangelho de Jesus Cristo também é antigo, já tem 2 mil anos, e mesmo assim continua valendo”. A direita na igreja sempre me perseguiu e quis-me mandar embora porque eu insistia na execução destas decisões conciliares. A igreja precisa de um Concílio para dizer que aquilo que a Bíblia diz está certo. A Bíblia por si só na igreja não tem valor. Precisamos de um Concílio para dizer que Lc 4.18-19 deve ser implementado. Por que? Porque Lc 4.18-19 é subversão e revolução pura. Como a igreja virou Religião, deixando de ser Evangelho, ela não pode permitir qualquer subversão da ordem política e econômica de libertar escravos, num modo de produção escravista, nem libertar os presos por dívidas e os oprimidos de todas as formas pelo capital de hoje, muito menos proclamar a boa nova de que os pobres deixarão de ser pobres e para isso acontecer tem que se mudar o modo de produção vigente. Pô, mas isso é comunismo!

Gollwitzer diz: “A ascensão social para uma classe superior leva à lealdade para com ela e a conseqüente minimização das afirmações do Evangelho na medida em que estas questionarem os interesses da classe superior. O pastor, amigado à classe de cima, torna-se o ungüento da consciência da sociedade existente, primeiramente feudal e depois burguesa, quando deveria ser o seu espinho”.

A paróquia contrata o/a pastor/a para passar bálsamo nas feridas do povo oprimido pelo capital para que não se revolte e não veja as origens de sua opressão e não é contratado para ser espinho para revolver e mostrar as feridas abertas pelo capitalismo. Feridas que muitos membros da IECLB ajudam a fazer e insistem em manter bem abertas. A função da igreja é esconder a existência da luta de classes e negar a sua existência. O/a pastor/a é chamado/a de “cura d’alma”; ele cuida da alma e o capitalista cuida do corpo do/a trabalhador/a para que produza muito lucro com o mínimo necessário para a sua sobrevivência (por isso temos o Salário Mínimo e não o Salário Digno) [na igreja temos a Subsistência Ministerial mínima, a paróquia pode pagar mais um abono, mas aí com o intuito de corromper o peão para que não fale da existência da luta de classes na sociedade e na igreja; se falar, corta-se o abono, para ele/a aprender a não se meter à besta]; tudo dentro da teologia da ressurreição da alma que é predominante entre os membros da IECLB. Ser espinho leva à cruz e ninguém quer a cruz, nem Jesus Cristo a queria (Mt 26.39: “Meu Pai, se possível, passe de mim este cálice! Todavia, não seja como eu quero, e sim como tu queres”.). A proposta de Jesus vai nos trazer a perseguição (Mt 5.10-11), a prisão (At 26.10; II Co 6.4-10), a tortura (Hb 11.35-38) e a cruz (Mt 16.24; Ap 6.9-11; I Co 1.18-25). Por isso Jesus diz em Lc 9.23: “Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, dia a dia tome a sua cruz e siga-me”. A Teologia da Cruz é central na teologia luterana, mas nas igrejas da IECLB normalmente não temos nem o crucifixo sobre o altar ou na parede das igrejas, só a cruz vazia. Isto já explica a nossa postura na luta de classes havida na sociedade: normalmente não estamos do lado e junto com os crucificados pelo sistema capitalista. Normalmente fazemos o papel de Templo de Jerusalém.

Excurso:
Nós no pastorado fazemos parte dos crucificados pelo capital, pois somos exortados e lembrados constantemente que temos que trabalhar mais e produzir mais. Sempre há ainda alguém que você ainda não visitou ou que deveria ter visitado novamente. Estamos sob constante pressão de infelicidade de não ter cumprido satisfatoriamente o nosso trabalho. Trabalhamos de 10 a 14 horas por dia e ainda somos infelizes e não realizados. Nos esfolamos por causa da Religião achando que é por causa do Evangelho. Comeram o fígado do Oto em Vilhena porque uns gaúchos de Condor achavam que a festa da comunidade é o centro da comunidade. Esta base é a Religião e não o Evangelho. A base dos cristãos capitalista é a Religião e não o Evangelho. Jogamos as pérolas aos porcos em tantos grupos na comunidade que não querem saber do Evangelho, apenas querem reproduzir a Religião; porque Deus me livre questionar o capitalismo como instrumento do diabo. Para o grupo da OASE de Condor o chá era o centro (isso foi dito na reunião da diretoria da OASE) e para a Legião o centro era o chopp e o churrasco. O estudo e a meditação eram só para encher lingüiça. É o papel do pastor falar das coisas da Bíblia que igual a gente não consegue fazer; faz parte da dinâmica da reunião, afinal somos cristãos, mas tudo isto não é relevante. Ficamos doentes por causa do stress, sem tempo para a família e para os filhos, nos desgastamos, nos divorciamos por causa da Religião achando em nossa ingenuidade que é por causa do Evangelho. No final a paróquia nos chuta porque não estamos a fim de reproduzir a Religião, e sim, o Evangelho. Jesus foi preso e condenado como herege à morte pela Religião porque pregava o Evangelho.

E quanto mais corremos mais burros ficamos, pois não temos mais tempo e nem vontade para o estudo de teologia e ler livros teológicos. Quantos livros teológicos você leu no ano passado? Quantas vezes, no ano passado, você se reuniu com colegas para estudar teologia e ler em conjunto algum livro teológico? Não fizeram isto por que? Porque os patrões capitalistas que mandam na paróquia não deixam, pois isto não é produção para eles. Eu mandei 7 emails em novembro para colegas vizinhos de Palmitos para nos reunirmos em 2012 e formarmos um grupo de estudo. Sabem quantos responderam? 1 colega respondeu dizendo, sim, os outros nem responderam. Um comentou com outro colega dizendo que não dá, pois seria mais um dia fora da paróquia. Isto que estudar teologia faz parte de nosso trabalho, mas não é reconhecido como tal pelos patrões. A ideologia do capital que perpassa a igreja exige produção de seus peões senão o TAM e a Avaliação pegam, pois as diretorias se sentem realizadas e lisonjeadas se o/a pastor/a é bem aceito/a pela comunidade. O sucesso do/a pastor/a é o sucesso da diretoria paroquial. Por isso vamos trabalhar peonada! A patronada quer produtividade! Não deixem as diretorias infelizes!

“A australiana Bronnie Ware trabalhou com doentes terminais. A partir do que viu e ouviu, elencou os cinco principais arrependimentos das pessoas moribundas:
1. Gostaria de ter tido a coragem de viver uma vida verdadeira para mim e não a que os outros esperavam de mim.
2. Gostaria de não ter trabalhado tanto.
3. Gostaria de ter tido a oportunidade de expressar meus sentimentos.
4. Gostaria de ter tido mais contato com meus amigos.
5. Gostaria de ter tido a coragem de me dar o direito de ser feliz.”
(Brasil de Fato nº 463 de 12 a 18 de janeiro de 2012. Coluna do Frei Betto)
O Reino de Deus também está sendo construído por Deus para nós e não somente conosco. Temos o direito de ser felizes. “Sem medo de ser feliz!” (dizia o jingel de 1989)

Segundo Gn 1 Javé trabalhou 6 dias e no sétimo descansou realizado pelo que fez. O objetivo do trabalho é a realização pessoal (E viu Deus que isso era bom.) e o descanso e o lazer das pessoas (o sétimo dia é o ponto alto da criação e não a criação das pessoas no sexto dia). A questão não é descansar no sétimo dia para poder trabalhar mais e melhor na terça. A dinâmica do capital nos pegou de jeito, pois nem segunda-feira fazemos. Trabalhamos 7 dias por semana e somos infelizes e estamos insatisfeitos por acharmos que trabalhamos muito pouco. Quando um dia por algum motivo não temos agenda ficamos com a consciência suja e achamos que somos preguiçosos. Haja capitalismo!

Deus parte da realidade da luta de classes optando pelas vítimas do sistema. As igrejas normalmente optam pelos opressores, traindo o Evangelho e se tornam uma Religião, porque os opressores ou os seus testas de ferro controlam a administração das igrejas desde a comunidade, portanto controlam sua teologia e sua prática. Deus tornado pessoa num camponês sem terra palestino parte da realidade do povo oprimido (Lc 4.18-19 – o Programa; Lc 7.20-23 – a realização do Programa) para apontar para a construção de uma nova sociedade: o Reino de Deus, que é a mensagem central de Jesus conforme Lc 4.43; 8.1; 16.16.

Em ‘Reflexões em torno de Lutero’ vol. I uma Edição especial da Revista “Estudos Teológicos” de 1981 na página 77 diz, num texto de Nelson Kirst que cita Lutero:
“É também com amargura que Lutero faz outra constatação dolorosa entre seus ouvintes: o povo não tem a mínima disposição para ouvir aquilo que para ele, Lutero, é o ponto central do Evangelho, ou seja, a justificação pela fé. Lutero comentava, certa vez, a pregação do Dr. Nicolaus:
"Ele jogava com muitas alegorias e interpretações espirituais, e é disso que o povo e a massa gostam. Se é assim, eu também posso ser mestre. Mas, quando se prega sobre o artigo da justificação - de que se é justificado e salvo por Deus apenas pela fé em Cristo - o homem comum acha que a gente não é eloqüente, e não gosta de ficar ouvindo. E um sinal seguro do que eu digo é o seguinte: quando se prega sobre o artigo da justificação, o povo fica dormindo e tossindo; mas quando se começa a contar histórias e exemplos, esticam as duas orelhas, ficam quietinhos e ouvem com toda atenção. Acho que muitos pregadores entre nós me botam no chinelo".”

A questão é: o que fica? A estorinha ou a proposta do Evangelho que leva a pessoa a uma nova prática da fé num processo coletivo, comunitário de transformação também de toda a sociedade em direção ao Reino de Deus?

Salvação individual sem compromisso ativo de participar da construção do Reino de Deus é salvação? Participar da construção do Reino de Deus é lutar contra o capitalismo, como sendo o reino do mundo. Quem apóia e não luta contra o reino do mundo pode se considerar salvo? Não lutar contra o reino do mundo é reforçar a obra do diabo e é o mesmo que lutar contra o Reino de Deus. Quem luta contra o Reino de Deus não está salvo.

“A convicção, tipicamente protestante, segundo a qual a salvação é algo individual, e não propriamente comunitário. Enquanto, para a teologia católica, o pecado é destruidor da unidade do gênero humano, para a teologia protestante o pecado é a ruptura do elo individual que une o homem a Deus: é assim que a salvação se torna um fato eminentemente individualista. A conseqüência prática de tal mudança de perspectiva foi a eliminação, nos países atingidos pela Reforma, das obras sociais do catolicismo, isto é, o abandono de uma das mais altas expressões da centralidade do princípio do bem comum. Por sua vez, isso teve o efeito de determinar a transferência de uma quantidade considerável de recursos do social ao econômico, favorecendo assim a acumulação do capital. Para dizê-lo de outro modo, a Reforma não só incidiu sobre o lado da demanda – como quase todos admitem –, modificando as disposições e as preferências do povo em direção de mais altas propensões ao trabalho e à poupança, mas também sobre o lado da oferta, determinando uma sensível redução dos custos dos serviços e das práticas religiosas. A eliminação da hierarquia, das indulgências, das peregrinações e de outros ritos religiosos, a construção de igrejas modestas, etc., tudo isso teve o efeito de liberar recursos escassos (trabalho e capital), canalizando-os para empregos economicamente produtivos”. A ética católica e o espírito do capitalismo. Stefano Zamagni. Cadernos IHU Idéias. Ano 9. Nº 159. 2011

Salvação coletiva do Povo de Deus (Mt 1.21; Zc 8.7; Dn 12.1; Sl 18.27; Sl 28.9; 2 Sm 22.28).

‘Eu me converti’ e estou salvo. Sim e daí? O que isto muda no preço da saca de café, na Reforma Agrária, na vida dos sem teto, no valor do Salário Mínimo, no desemprego e na dívida pública brasileira? A salvação é obra de Deus e não minha. Tg 2.22 lembra: “Vês como a fé operava juntamente com as suas obras; com efeito, foi pelas obras que a fé se consumou”. A luta pela construção do Reino de Deus são as obras que provêm da fé. As boas obras, não são o que entendemos por mera caridade distribuindo sopões aos pobres, para que continuem pobres e dependentes de nós e de nossa caridade farisaica e para que não se organizem contra o capitalismo, mas é o processo de entendimento da realidade e de organização do povo em direção desta nova sociedade que Jesus chama de Reino de Deus.

Por que nos insurgimos contra o reino do mundo, hoje o capitalismo? Lutero lembrando Paulo diz que é por causa do amor:
“Em Rm 13.8: “A ninguém fiqueis devendo cousa alguma, exceto o amor com que vos ameis uns aos outros”. O amor é, pois, serviçal e submete aquele em que está posto” ... “A pessoa interior está unida a Deus, feliz e alegre por Cristo que tanto fez por ela, e seu maior e único prazer é, por sua vez, servir a Deus com um amor desinteressado e voluntário”. (Lutero. Da Liberdade Cristã)

Insurgimos-nos contra o reino do mundo porque já fomos salvos de graça pela fé, que sempre aponta para Jesus Cristo e este aponta para a construção do Reino de Deus e isto é subversão, pois requer a eliminação do capitalismo. Lutero lembra: “é impossível separar da fé as obras; é tão impossível como separar do fogo a chama e a luz”. Assim, servir a Deus a partir do amor e da fé é lutar pela Reforma Agrária, por casa para os sem teto, por um preço justo pelos produtos agrícolas, contra o atual modelo agrícola dependente baseado nos venenos e transgênicos, etc. e participar das organizações do povo oprimido em direção à esta nova sociedade não capitalista que é o Reino de Deus. “Sem insurreição não há ressurreição”, este é o lema.

3. A Luta de Classes como o Motor da História
Para Marx a luta de classes é o motor da história.
“A história da Sociedade se confunde até hoje com a história das lutas de classe. Homem livre e escravo, patrício e plebeu, senhor e servo, mestre de corporação e companheiro, em outros termos, opressores e oprimidos em permanente conflito entre si, não cessam de se guerrearem em luta aberta ou camuflada, luta que, historicamente, sempre terminou ou numa reestruturação revolucionária da Sociedade inteira ou no aniquilamento das classes em choque”. (O Manifesto Comunista. Marx e Engels, 1848)

“O modo de produção da vida material condiciona o processo da vida social, política e espiritual em geral. Não é a consciência do homem que determina o seu ser, mas, pelo contrário, o seu ser social é que determina a sua consciência”. (Prefácio à "Contribuição à Crítica da Economia Política". Karl Marx)

“Em qualquer época histórica, a produção econômica e a estrutura social, que dela necessariamente decorre, constituem a chave da história política e intelectual dessa época”. (Prefácio à edição alemã de 1883 do Manifesto Comunista. Friedrich Engels)

Gollwitzer diz: “Para Marx a sociedade sem classes era a tarefa histórica da classe proletária. Contrariando lugares comuns muito difundidos, é preciso dizer o seguinte:
a) Uma sociedade sem classes não é o paraíso e não pressupõe pessoas sem pecado; ela é uma ordem terrena para homens pecadores que preenche melhor do que a sociedade capitalista, aquilo que Barmen V (no primeiro esboço de Barth) considera como tarefa de uma ordem social: “preocupar-se com a justiça, a paz e a liberdade de um mundo ainda não redimido”.
b) Em seu tempo Marx considerava tal sociedade como possível e necessária. Esta convicção se revela hoje, cem anos depois, não uma fantasia, mas uma necessidade ainda mais premente do que naquela época: Se não conseguirmos substituir agora o sistema capitalista por um sistema mais humano, então será tarde demais; é superstição crer que o mesmo mal que destruiu o planeta, possa também salvá-lo. (...)
Se um sistema social é acusado de ser essencialmente desumano e quando se afirma que é necessário substituí-lo por um outro melhor, então esta discussão deve alarmar a comunidade cristã. Se a acusação for verdadeira, então ela deve ser de extremo interesse, e toda a simpatia deve ser canalizada para aqueles que tentam superar o sistema e para as alternativas mais adequadas. ... Principalmente no âmbito da comunidade cristã esta discussão será veemente, pois em discussão não estarão apenas interesses e idéias, mas trata-se aqui da obediência da comunidade diante do impulso transformador do Reino de Deus. Para tanto serão úteis à comunidade quaisquer análises da realidade social, contanto que diagnostiquem os fatores e a doença desta realidade da forma mais apurada e racional possível.
Sei que sugiro o contrário do que aconteceu na Igreja e na Teologia desde o surgimento do capitalismo e do socialismo até os dias de hoje: contestação imediata e preconceituosa de qualquer acusação, extrema antipatia para com os que superavam o sistema, contestação precipitada da possibilidade de alternativas radicais através de uma miscelânea de argumentos teológicos e profanos, rígida limitação do possível, identificação do cristianismo com a moderação e - grotescamente - do radical com a posição “ideológica” (contrária à posição da fé), preferência do vigente ao necessário, utilização do ateísmo marxista como argumento cristão contra a análise marxista (em vez dos cristãos se envergonharem com o fato de eles próprios não ter produzido uma tal análise), constante procura de argumentos e esperanças em favor do sistema capitalista e contra as tentativas de concretização socialista, e nervosas rejeições de qualquer questionamento do capitalismo. Se é verdade que esta série de atitudes é compreensível logo que entendermos seus condicionamentos classistas, também não é menos verdade que não haverá renovação da Igreja sem que ela rompa com este sistema burguês que rejeita qualquer questionamento e quaisquer alternativas transformadoras. Karl Barth afirma na primeira edição de seu comentário aos Romanos, 1919, p.381: Dificilmente podereis posicionar-vos num outro lugar do que a extrema esquerda.” – Essa doeu!

Lutero lembra: “Olha para tua vida. Se não te encontrares, como Cristo no Evangelho, em meio aos pobres e necessitados, então que saibas que a tua fé ainda não é verdadeira, e que certamente ainda não provaste a ti o favor e a obra de Cristo”.

4. A Metodologia Bíblica
Vamos ver como acontece a luta de classes na Bíblia e como ela determina a ação de Javé: Dt 6.20-23: “Quando teu filho, no futuro, te perguntar, dizendo: Que significam os testemunhos, e estatutos, e juízos que o Senhor, nosso Deus, vos ordenou? Então, dirás a teu filho: Éramos servos de Faraó, no Egito; porém o Senhor de lá nos tirou com poderosa mão. Aos nossos olhos fez o Senhor sinais e maravilhas, grandes e terríveis, contra o Egito e contra Faraó e toda a sua casa; e dali nos tirou, para nos levar e nos dar a terra que sob juramento prometeu a nossos pais”.

Aqui vemos como a luta de classes é o motor da história do povo de Deus. Javé é reconhecido na luta de classes ao optar pela classe oprimida: a classe camponesa sem terra escrava no Egito. Javé age a partir da luta de classes existente. “Eu sou o que sou”, diz Javé para Moisés em Ex 3.14. Significa: eu sou o que faço. O que Javé faz, qual sua práxis? Ele se coloca na luta de classes ao lado dos oprimidos, junto à classe oprimida e contra a classe opressora. Israel o tornou seu Deus por causa de sua prática na luta de classes: contra o Estado e a favor da classe camponesa escrava e a condução para a construção de uma nova sociedade sem Estado onde os meios de produção pertencem à todos – a terra, pois ela é de Deus – e sem templo (apenas uma tenda móvel onde se celebrava o culto e a assembléia popular), pois templo é um instrumento do Estado (1 Rs 5). A teologia de Javé é determinada pela sua prática a partir da luta de classes que há na sociedade. E sua prática é lutar contra os opressores e seu projeto de dominação propondo com isso uma nova proposta de sociedade construída a partir dos oprimidos libertos: uma sociedade sem classes sociais (Dt 15.4: para que entre ti não haja pobre), sem estado, sem templo (templo é coisa do estado para legitimar a opressão da classe que controla o estado; por isso foi o Templo de Jerusalém que prendeu Jesus (Jo 18.1-11) e o condenou à morte (Lc 22.66-71) em aliança ao estado romano – Lc 23.24-25).

Jesus Cristo parte da Práxis (da realidade da vida do povo oprimido) para depois abordar a Teoria (a teologia – sua teologia está construída a partir e em cima da realidade opressiva – Lc 4.18-19 – para acabar com ela). Qual é a Práxis de Jesus? Ele é Deus encarnado como empobrecido (II Co 8.9) na classe camponesa (Lc 1.48) para libertá-la da opressão (Lc 4.18-19) pela construção do Reino de Deus (Lc 8.1), que já começa aqui e agora (Lc 17.21: “Porque o reino de Deus está no meio de vós”.) e somente se completa com a segunda vinda de Cristo no Dia do Juízo Final (1 Co 15.24-28). Sua Práxis começa na manjedoura (lugar de trabalho e de luta do camponês – também Deus se revelou à Moisés no local de trabalho) fora da cidade (onde mora o rei e fica a administração do Estado) e passa pela cruz (julgado na cidade e crucificado para morrer fora da cidade), porque para o sistema ele é um subversivo (e de fato o é, pois o Evangelho do Reino de Deus propõe construir uma nova sociedade em oposição à atual), e tem seu apogeu na ressurreição do corpo na Páscoa. O corpo ressuscita, portanto não pode ser oprimido por ser sagrado (I Co 1.1: aos santificados em Cristo Jesus; II Co 1.1), algo revolucionário dentro do conceito de corpo na sociedade greco-romana, onde o corpo do escravo era mero objeto descartável, mesmo sendo a base da economia. Sua prática de inserção nas lutas do povo oprimido o leva à cruz, mas vence o sistema deste mundo (Jo 16.33; I Jo 5.5) se opondo e invalidando o decreto de morte do Estado (Jo 18.16) ressuscitando dos mortos (Lc 24).

A Teoria responde às necessidades da Prática. A teologia se constrói a partir da vida (da Práxis duplamente libertadora: Mt 15.21-28 – quem liberta também é libertado), das necessidades e contradições da vida, dos conflitos, da luta de classes existente, para transformar e valorizar a vida (Jo 10.10). Jesus parte da realidade da vida (da Práxis: Lc 18.41: “Que queres que eu te faça? Respondeu ele: Senhor, que eu torne a ver”.) e não da teologia (da Teoria) como o fazem os fariseus.

O texto bíblico é a Teoria (teologia – segundo momento) sobre uma Prática anterior havida (ação de Deus ou de Jesus na história – primeiro momento) que requer uma nova Prática (Mc 1.15 arrependei-vos e crede no evangelho – terceiro momento). Assim, a Bíblia está construída em cima da Metodologia Prática-Teoria-Prática. O texto escrito é o relato de uma ação na história que a avalia e aponta para uma nova ação: o verbo se fez carne (Jo 1.1) – Prática – é a ação de Deus em Jesus que levou ao relato de João – Teoria – que exige uma nova postura – uma nova prática – que é o Reino de Deus (uma nova ação – uma nova Prática).