O lema da Teologia da Libertação diz: "Sem insurreição, não há ressurreição".
Esta afirmação fala da salvação por obras? Eu me insurjo contra a opressão capitalista e por isso serei salvo? Não, ela fala da salvação de graça por meio da fé em Jesus Cristo. Como? Pelo fato de eu já ter sido salvo de graça pela fé é que me insurjo contra a nossa sociedade injusta e opressora. Fui liberto por Jesus Cristo (Gl 5.1) para me insurgir contra o capitalismo, por ser obra do diabo. Paulo diz em 1 Co 9.19: “Porque sendo livre de todos, fiz-me escravo de todos, a fim de ganhar o maior número de pessoas” para a insurreição contra o capitalismo como tarefa na participação na construção do Reino de Deus. Lutero conclui dizendo: “Um cristão é senhor livre sobre todas as coisas e não está sujeito a ninguém. Um cristão é servidor de todas as coisas e sujeito a todos”. Por que nos insurgimos contra o reino do mundo, hoje o capitalismo? Lutero lembrando Paulo diz que é por causa do amor:
“Em Rm 13.8: “A ninguém fiqueis devendo cousa alguma, exceto o amor com que vos ameis uns aos outros”. O amor é, pois, serviçal e submete aquele em que está posto” (...) “Aqui responderemos a todos aqueles que, escandalizados com nossas afirmações, exclamam: Ah, se a fé é tudo e por si só bastante para a justificação, por que é que foram ordenadas as boas obras? Pois então vivamos a boa vida sem fazer nada! Não, meu caro, assim não. Seria assim se fosses apenas um ser espiritual e interior, coisa que não poderás ser antes do juízo final. Neste mundo tudo é começo e crescimento. O fim será concluído no outro. Por isso é que o apóstolo fala de “Primeiros frutos do espírito” (Rm 8.23). Cabe também aqui aplicar o que antes se disse: O cristão é servidor de todas as coisas e está sujeito a todos. Isto significa que, sendo livre, nada precisa fazer; sendo servo, deve fazer muitas e diversas. Vejamos como isto acontece: Ainda que a pessoa já esteja interiormente, isto é, no que respeita à alma, bastante justificada e de posse de tudo quanto necessita, continua, contudo, na vida corporal e há de governar seu próprio corpo e conviver com seus semelhantes. Aí é que começam as obras. A pessoa, deixando de lado a ociosidade, será obrigada a guiar e disciplinar moderadamente o seu corpo com jejuns, vigílias e trabalho. E exercitando-se a fim de sujeitar-se e igualar-se à pessoa interior e à fé, de modo que não seja impedida, nem faça oposição como acontece quando não se está obrigado. A pessoa interior está unida a Deus, feliz e alegre por Cristo que tanto fez por ela, e seu maior e único prazer é, por sua vez, servir a Deus com um amor desinteressado e voluntário”. (Lutero. Da Liberdade Cristã)
A insurreição é exigência do Evangelho que parte do amor e é conseqüência da fé e da salvação que já me foi dada de graça pela fé em Jesus Cristo. Insurjo-me contra o reino deste mundo, o capitalismo, porque não preciso ter medo de nada, pois já fui salvo de graça pela fé. Assim, a insurreição contra o capitalismo é exigência do Evangelho do Reino de Deus. Não se insurgir contra o capitalismo, que é o reino do mundo, é lutar contra o Reino de Deus e isto é lutar contra o próprio Deus que está construindo este Reino. Não lutar contra o capitalismo é trair a Jesus Cristo, como Judas o fez.
Paulo fala disto em Efésios 2.4-10 – destaco os v.v.: 8-10: “Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus; não de obras, para que ninguém se glorie. Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas obras, as quais Deus de antemão preparou para que andássemos nelas”. A insurreição são as boas obras que brotam da fé e da salvação que já nos foram dadas de graça. Como diz Tg 2.22: “Vês como a fé operava juntamente com as suas obras; com efeito, foi pelas obras que a fé se consumou”. As obras são conseqüência da fé e se há fé é porque já houve a salvação que foi dada de graça por Jesus Cristo. As boas obras, não são o que entendemos por mera caridade distribuindo sopões aos pobres, para que continuem pobres e dependentes de nós e de nossa caridade farisaica e para que não se organizem contra o capitalismo, mas são o processo de entendimento da realidade e organização do povo em direção desta nova sociedade que Jesus chama de Reino de Deus. A salvação de graça é pura subversão, pois no capitalismo nada é de graça, tudo tem que ser pago.
Segundo o espiritismo, que legitima o capitalismo, até os pecados tem que ser pagos. Mas segundo o Evangelho de Jesus Cristo os pecados são perdoados de graça pelo arrependimento (Rm 3.24: “sendo justificados gratuitamente, por sua graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus”). Somos tornados justos diante de Deus, de graça. Somos salvos de graça pela fé como diz em Rm 3.28: “Concluímos, pois, que o homem é justificado pela fé, independentemente das obras da lei”. Isto tudo é uma agressão ao capitalismo onde nada é de graça e tudo se paga, pois ele visa o lucro. O Reino de Deus também é graça de Deus, pois não visa lucro, mas vida plena, livre e digna. Os povos de fala hispânica dizem para a palavra lucro: ganância. Esta é uma palavra bastante reveladora. A essência do capitalismo é a ganância (1 Tm 6.10). O capitalismo está construído em cima da ganância e a teologia da prosperidade legitima esta ganância. Com isto legitima todo massacre armado sobre a classe trabalhadora. Como se configura este massacre? Se configura desde os 47% do orçamento da união para 2012, que são destinados ao pagamento da dívida interna e externa e assim é retirado este valor, que poderia ser investido para melhorar a vida do povo, para os especuladores, e continua, por causa disto, na existência do trabalho escravo nas terras do agronegócio porque não há fiscais o suficiente para uma fiscalização mais rigorosa, e vai até a má qualidade do ensino, passando pelos 4 milhões de crianças que tem que trabalhar para a família sobreviver, não esquecendo que o Bolsa Família existe por causa disto e assim por diante.
Eu me insurjo contra esta sociedade capitalista opressora porque já fui salvo de graça pela fé. Eu me insurjo contra esta sociedade capitalista porque pela salvação que já me foi dada de graça pela fé eu luto pela construção do Reino de Deus e não pela manutenção das estruturas opressoras do reino do mundo: o capitalismo. Lutando pela construção do Reino de Deus eu inevitavelmente tenho que me insurgir contra o capitalismo e toda a sociedade construída em cima e a partir dele. Quem não se insurge contra o mundo, hoje o capitalismo, não participará da ressurreição. Aí entra a teologia da cruz: quem se insurge contra o mundo será perseguido (Mt 5.10-12). Por isso Paulo fala da loucura da pregação da cruz de Cristo (1 Co 1.18), pois ela é essencialmente insurreição. Só um louco se bota a lutar contra o poderoso capitalismo, mas Paulo também diz em 1 Co 1.25: “Porque a loucura de Deus é mais sábia do que os homens; e a fraqueza de Deus é mais forte do que os homens”. Esta loucura da insurgência é construída por Deus a partir dos fracos que nada são: “Deus escolheu as coisas humildes do mundo, e as desprezadas, e aquelas que não são, para reduzir a nada as que são”, diz Paulo em 1 Co 1.28. Quais as coisas humildes, desprezadas e fracas? Paulo responde em 1 Co 4.11-12: “Até à presente hora, sofremos fome, e sede, e nudez; e somos esbofeteados, e não temos morada certa, e nos afadigamos, trabalhando com as nossas próprias mãos”. Estas são “as coisas”. As pessoas tornadas “coisas” no processo produtivo. No tempo de Paulo os escravos, os camponeses, os estrangeiros, os diaristas sem terra não passavam de “coisas”. No capitalismo de hoje os trabalhadores também são meras “coisas” que se necessita para produzir o lucro. Além disto, “as coisas” podem ser descartadas quando não servem mais ao processo produtivo: quando ficaram aleijadas ou depressivas pelo trabalho embrutecido. Estas pessoas tornadas “coisas”, pelo sistema opressivo, é que vão fazer a grande insurreição do Reino de Deus. Esta é a loucura de Deus!
Marx diz em relação a isto no Manifesto Comunista: “A burguesia não só fabricou as armas que representam sua morte, como produziu também os homens que manejarão essas armas - o operariado moderno os proletários”. “Para continuar existindo e dominando, torna se imprescindível para a burguesia a acumulação da riqueza nas mãos de particulares, a formação e o crescimento do capital; e a condição essencial para existir esse capital é o trabalho assalariado. E este precisa exclusivamente da concorrência dos operários entre si. O desenvolvimento industrial, embora incentivado passivamente pela burguesia, vai substituindo o isolamento dos operários que se dividem pela competição e só se unem, através das associações próprias para sua luta revolucionária. Portanto, a evolução da indústria moderna abala as próprias bases em que a burguesia edificou seu sistema de produção e de apropriação. Desse modo, a burguesia produz seus próprios coveiros. Tornam se inevitáveis a queda e a vitória do proletariado”.
Para impedir isso faz-se necessário transformar o Evangelho em Religião! O Evangelho é insurgente e a Religião é alienante e, por isso, acomodadora. Para entender o papel da Religião sempre cito Napoleão Bonaparte:
“No que me toca, eu não vejo na religião o segredo da encarnação, mas o segredo da ordem social: A religião empurra a idéia da igualdade para o céu, o que impede que os ricos sejam massacrados pelos pobres. A religião é como uma espécie de vacinação, conseqüentemente uma vacina, que sempre beneficia os charlatões e vilões, pelo fato de satisfazer a nossa queda pelo milagroso. Os sacerdotes são mais valiosos que muitos Kants e todos os sonhadores alemães. Como se pode manter a ordem num Estado sem religião? A sociedade não pode subsistir sem uma desigualdade das riquezas, relativamente, de bens, e a desigualdade das riquezas, relativamente, de bens, não pode subsistir sem a religião. Se uma pessoa morre de fome enquanto que seu vizinho nada em fartura, então lhe é impossível achar uma explicação para esta desigualdade, se não há uma autoridade que lhe diz: Deus quer que assim seja; tem que existir ricos e pobres no mundo; mas na eternidade finalmente tudo será dividido de maneira diferente!”. (Casalis, Georges. Methodologische Überlegungen zu einer Theologie der Befreiung für Westeuropa. Página 77; in: Geschichte – Theorie – Praxisberichte. 5 ed. Münster, 1992)
A salvação de graça por meio da fé em Jesus Cristo é subversiva e revolucionária, pois leva à insurreição contra o capitalismo no sentido de participar da construção do Reino de Deus. Quem vai construir o Reino de Deus é o próprio Deus, nós apenas somos seus convidados especiais pela fé e pelo batismo. A missão do Evangelho do Reino de Deus é de Deus. Quem faz missão é Deus, nós apenas somos seus colaboradores nesta tarefa de insurgência contra o reino do mundo. É por causa da missão de Deus é que nós participamos de sua missão, pois a missão de Deus pelo Evangelho de Jesus Cristo nos converteu para o projeto do Reino de Deus. A minha conversão é obra de Deus, não obra minha. É heresia pura quando alguém diz: “Eu me converti no ano tal e no dia tal”. Dizer isto é entender que eu me salvo a partir da obra da minha conversão. Quem me converte é o Evangelho de Jesus Cristo. Paulo em I Co 1.18 diz que salvação por graça e fé é a “loucura da pregação do evangelho da cruz de Cristo”, pois coloca a salvação “extra nos” (fora de nós). Não temos poder sobre a nossa salvação, ela depende única e exclusivamente de Deus.
Por isso as prioridades da ação da Igreja de Cristo são três, segundo o P. Albrecht Baeske:
1ª prioridade da ação eclesial: é a tarefa da proclamação evangélica profética de que a pessoa e toda a sociedade são e permanecem pecadoras (Mc 1.15) e de que Deus justifica (Rm 8.33), salva (1 Co 1.21) e recria (2 Co 5.17) a pessoa arrependida (Rm 1.16-17) pela mediação verbal (Mc 2.1-12; Mt 9.22), e também, pela mediação palpável e degustável dos sacramentos em meio a comunidade (Mt 28.18-20; Mt 26.26-28);
2ª prioridade da ação eclesial: é a explicação e o estudo do significado do sacerdócio geral de todos os crentes com a comunidade, conseqüentemente também o ensaio e a execução, na própria comunidade, do sacerdócio das pessoas que crêem (I Pe 2.5 e 9) e foram batizadas, e, por isso, exercitam o sacerdócio comum (de todos os batizados crentes), mútuo (um é sacerdote para com o outro) e em conjunto (toda comunidade tem o ministério sacerdotal via batismo: o ministério da reconciliação - II Co 5.18-19; Jo 20.21-23);
3ª prioridade da ação eclesial: é toda luta por justiça em favor da construção desta nova sociedade que Jesus chama de Reino de Deus em que nós nos engajamos a partir da fé em Jesus Cristo porque já fomos salvos de graça pela fé e por isso nada temos a temer (Mt 10.28; Rm 8.33: “Quem intentará acusação contra os eleitos de Deus? É Deus quem os justifica”; 1 Jo 2.1: “temos Advogado junto ao Pai, Jesus Cristo, o Justo”.). Este Reino de Deus já começou (Lc 17.21: “Porque o reino de Deus está no meio de vós”.), mas ainda não está completo e o será apenas na volta de Cristo no Dia do Juízo Final.
Nesta prioridade é que acontece a santa insurreição contra o capitalismo. Jesus foi crucificado por que se insurgiu contra o sistema deste mundo (Lc 23.2,5; Jo 11.47-48; Lc 13.31-32). Esta é a loucura da pregação do evangelho da cruz de Cristo (1 Co 1.18-21) que cabe a nós pessoas batizadas proclamar (Mt 28.18-20) e viver no processo da insurreição (Lc 4.18-19) contra o capitalismo, que é o instrumento que o diabo usa para tentar impedir a construção do Reino de Deus. Como diz Lutero: “Por isso o pregador deve conhecer o mundo muito bem e reconhecer que ele é desesperadamente mau, propriedade do diabo, na melhor das hipóteses”. Aí é que reside o problema, pois tem milhões de cristãos batizados, que se dizem convertidos, defendendo a propriedade do diabo com unhas e dentes. Não só isso, mas tendo, por isso mesmo, a prática do diabo em relação às pessoas (explorando-as no processo produtivo e até mesmo escravizando-as nos latifúndios do agronegócio) e em relação à natureza criada por Deus (exaurindo os recursos naturais e acabando com a biodiversidade tendo em vista apenas o lucro que é privado, mas o prejuízo é público). O povo através do Estado, que pelos impostos recolhidos, vai ter que custear a recomposição dos biomas depredados, alguns vão ser impossíveis de recompor como também a biodiversidade extinta, e pagar as contas das internações dos trabalhadores no SUS e das aposentadorias precoces por causa das lesões no trabalho insalubre, repetitivo e exaustivo a que estavam sujeitos no processo de produção das mercadorias, pois é neste processo que se cria o mais valor, o lucro, pela parte do tempo trabalhado e que não foi pago. Para aumentar este mais valor é que se aumenta o ritmo de trabalho com novas máquinas (novas tecnologias) e trabalho repetitivo. Se um trabalhador/a adoecer, se aposentar compulsoriamente devido a invalidez ou morrer neste processo explorativo põe-se outro no lugar, para isto existe o Exército de Reserva de Mão de Obra, os desempregados, que ainda ajudam a baixar o preço da mão de obra pela concorrência exercida entre eles. Tudo favorece ao capital! O capitalismo não existe sem este processo, mesmo o imperialismo baseado no setor financeiro especulativo, cuja origem vem deste processo.
Quando falamos da ressurreição estamos falando da ressurreição do corpo, como confessamos no Credo Apostólico. Esta história da ressurreição do corpo é pura insurgência contra o capitalismo, pois ela diz que o corpo é tão sagrado, por ser criação de Deus a sua imagem e semelhança, que o corpo todo vai ressuscitar. Se o corpo é tão sagrado que vai ressuscitar então não dá para agredir esta criação de Deus pela exploração no trabalho para gerar o mais valor para o capitalista e nem dá para escravizar o corpo, pois ele é sagrado e morada do Espírito Santo. Explorar o corpo e escravizar o corpo é, pois, explorar e escravizar o próprio Deus porque o corpo é santuário do Espírito Santo. Paulo diz em 1 Co 3.17: “Se alguém destruir o santuário de Deus, Deus o destruirá; porque o santuário de Deus, que sois vós, é sagrado”. Por isso Deus vai destruir o capitalismo, porque ele está destruindo os corpos da classe trabalhadora pela superexploração de sua mão de obra e pela escravidão que o capital sujeita esta classe. A maneira do capitalismo destruir o corpo das pessoas é pelo trabalho exaustivo e repetitivo, por tornar o corpo uma mercadoria, uma coisa, um objeto, destrói o corpo pela guerra, pela fome, pela destruição da natureza que Deus criou para que os corpos criados por ele pudessem ter vida plena, abundante e livre. Sem os corpos da classe trabalhadora o capitalismo não sobrevive. É a contradição inerente ao sistema: o mesmo corpo que é destruído pelo capitalismo este o necessita para se reproduzir e perpetuar. Assim como no escravismo o sistema matava de tanto trabalhar quem o sustentava: o escravo. Assim, a vida do sistema opressor se mantém a partir da morte. Por isso o sistema precisa do aparelho ideológico para iludir as pessoas para que não vejam e nem entendam como são exploradas e mortas. A Religião faz parte deste aparelho ideológico. O Evangelho, não, este se insurge contra o sistema produtivo e ideológico opressor.
Por isso urge que em nossas igrejas haja novamente no altar um crucifixo, pois este denuncia como hoje o corpo das pessoas é crucificado pela dinâmica do capital. O Cristo crucificado denuncia todo sistema opressor que crucifica as pessoas que se insurgem contra o mesmo. O crucifixo denuncia a opressão do reino do mundo, hoje o capitalismo. Como a grande maioria dos cristãos defende o capitalismo elas não querem que haja no altar um crucifixo que os denuncia em sua prática de opressão e legitimação do sistema sustentado pelo diabo. O crucifixo denuncia a crueza do projeto do mundo, que não hesita em usar o aparelho do Estado e usar a própria religião para torturar e matar para se reproduzir. O período da Conquista das Américas nos mostra isto de forma muito clara, como também o mostram as ditaduras militares implantadas a partir dos anos 60 pelos USA, que prenderam, perseguiram, torturaram e mataram quem à elas se opunha. Estas ditaduras foram apoiadas pela grande maioria dos cristãos, que por sua vez, crêem na ressurreição da alma, que legitima a opressão, a tortura e a matança daqueles que defendem a vida e crêem na ressurreição do corpo. Crer na ressurreição da alma é dizer que o corpo é menos importante que a alma, portanto pode ser usado para gerar o mais valor e se negar a isto pode ser torturado e assassinado, pois o importante é que a alma seja salva. O corpo se deixa para os capitalistas usarem a seu bel prazer. Crer na ressurreição da alma é negar todo o Evangelho de Jesus Cristo, pois o centro da fé cristã é que Jesus morreu pelos nossos pecados e ressuscitou com o corpo, como diz Paulo no credo de 1 Co 15.3-4. Mesmo após a ressurreição até a ascensão Jesus pregou o Reino de Deus à seus discípulos e discípulas (At 1.3: “A estes também, depois de ter padecido, se apresentou vivo, com muitas provas incontestáveis, aparecendo-lhes durante quarenta dias e falando das coisas concernentes ao reino de Deus.”).
A ressurreição do corpo é a insurreição de Deus contra o sistema deste mundo que tenta matar o próprio Deus para se eternizar. Na Páscoa Deus se insurge contra o Estado e o Templo de Jerusalém ressuscitando a Jesus Cristo dos mortos numa clara afronta à lei e ao direito romano. Lc 24.39 diz: “Vede as minhas mãos e os meus pés, que sou eu mesmo; apalpai-me e verificai, porque um espírito não tem carne nem ossos, como vedes que eu tenho”. Lucas é claro em seu relato em falar da ressurreição do corpo de Jesus. Não estava diante dos discípulos um espírito, mas um corpo ressurreto, com carne e ossos. Na tentativa de acabar com o Projeto do Reino de Deus o próprio Império se corta na carne, pois a ressurreição do corpo é a proposta viva contra a escravidão que sustentava o Império. A ressurreição do corpo de Jesus coloca o corpo no centro da discussão. Pois é da escravidão do corpo que o sistema econômico vive. A ressurreição de Jesus Cristo liberta de todas as escravidões: das escravidões em vida e da escravidão da própria morte (1 Co 15.19-26). Se o corpo ressuscita é porque ele é sagrado e o sagrado não dá para profanar. A escravidão profana o corpo dos escravos: tirando-lhes a liberdade e usando os seus corpos para o enriquecimento individual pela exploração, rebaixando-os a objetos, a mercadorias. A ressurreição traz à luz a sacralidade do corpo das pessoas que se insurge contra a prática econômica escravista romana. A ressurreição se insurge, também hoje, contra a exploração capitalista que também transforma o corpo das pessoas em coisa, em mercadoria, comprado e vendido no mercado de trabalho para gerar lucro para o patrão.
No entanto, quando este corpo sagrado não age segundo os princípios do imperialismo estadunidense acontece o que publicou o jornal Brasil de Fato nº 463:
“Na virada do ano foi assinada a Lei de Autorização da Defesa Nacional (National Defense Authorization Act). Com este instrumento, os militares estadunidenses podem prender e manter presos quaisquer cidadãos por tempo indefinido, dentro e fora dos EUA, sem que seja necessário processo ou acusação formal. O que significa que Obama, ao invés de cumprir promessa eleitoral de fechar a base militar de Guantánamo, universalizou a sua lógica e institucionalizou os seus princípios”.
É a continuidade da política do Bush de: humanizar a tortura. O tigre, segundo a raça, muda a cor de sua pele, mas não perde o gosto pela matança. Um tigre é sempre um tigre. Nada de ilusões, mesmo que tenha ganho um Prêmio Nobel da Paz. É o Estado imperialista agindo como se fosse deus: tenho todo o poder e sou impune. Mas o Apocalipse desmonta esta teoria dizendo em 18.6-8: ”Dai-lhe em retribuição como também ela retribuiu, pagai-lhe em dobro segundo as suas obras e, no cálice em que ela misturou bebidas, misturai dobrado para ela. O quanto a si mesma se glorificou e viveu em luxúria, dai-lhe em igual medida tormento e pranto, porque diz consigo mesma: Estou sentada como rainha. Viúva, não sou. Pranto, nunca hei de ver! Por isso, em um só dia, sobrevirão os seus flagelos: morte, pranto e fome; e será consumida no fogo, porque poderoso é o Senhor Deus, que a julgou”.
Não esquecer, que somente Deus é eterno e imortal (1 Tm 6.15-16: “há de ser revelada pelo bendito e único Soberano, o Rei dos reis e Senhor dos senhores; o único que possui imortalidade”). O capitalismo não é eterno, ele nasceu, se desenvolveu e vai morrer; também o imperialismo estadunidense. O capitalismo não é imortal como também a alma não é imortal, pois não dá para separar a alma do corpo, os dois são indivisíveis, são uma unidade. Alma significa a vida que há no corpo. Não há vida fora de qualquer corpo. Quando a pessoa morre, morre tudo: corpo e alma, pois a vida deixou de existir. Acaba a vida que há no corpo e tudo perece: vida e corpo. A ressurreição recria um novo corpo, recria uma nova vida, como lemos em 1 Co 15 (sugiro ler todo o capítulo várias vezes), que agora não mais morrerá e viverá eternamente no Reino de Deus agora já completo.
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