"Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará." (Jo 8.32)
18 de março de 2013
O vale tudo pela manutenção da coalizão de governo
A análise da Conjuntura da Semana é uma (re)leitura das Notícias do Dia publicadas diariamente no sítio do IHU. A análise é elaborada, em fina sintonia com o Instituto Humanitas Unisinos – IHU, pelos colegas do Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores – CEPAT, parceiro estratégico do IHU, com sede em Curitiba-PR, e por Cesar Sanson, professor na Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN, parceiro do IHU na elaboração das Notícias do Dia.
Sumário:
No lugar do embate ideológico, acertos
Ruralista na Comissão do Meio Ambiente
A agenda dos ruralistas
Homofóbico na Comissão dos Direitos Humanos
Ortodoxia da bancada evangélica
Agenda social e governabilidade
No lugar do embate ideológico, acertos
Nos 10 anos do PT no poder, o partido de Chico Mendes trocou as bandeiras da defesa do meio ambiente e das minorias pela governança política. As nomeações de Blairo Maggi para a Comissão do Meio Ambiente e de Marco Feliciano para a Comissão de Direitos Humanos são demonstrações simbólicas e práticas de que vale qualquer tipo de aliança pela manutenção da coalizão de sustentação ao governo.
A tomada de assento pelas forças conservadoras e reacionárias em duas comissões historicamente hegemonizadas pelas forças progressistas e instrumentos importantes na defesa das minorias, revela que agora em primeiro lugar vêm os acordos políticos-eleitorais. O conteúdo e a temática das mesmas já parecem não ter importância significativa para a esquerda, ou ao menos para parte dela.
O governo calou-se. As ministras do Meio Ambiente Isabel Teixeira e dos Direitos Humanos Maria do Rosário não esboçaram reação, aceitaram as indicações dos parlamentares ‘motosserra de ouro’ e homofóbico. O PT na Câmara dos Deputados esboçou tímida reação, mas sucumbiu ao argumento que no pacto da distribuição do poder cabiam ao PR e ao PSC as indicações pelos cargos.
Não está distante o dia em que a bancada ruralista e a bancada evangélica tomarão conta dos Ministérios do Meio Ambiente e dos Direitos Humanos. Pelo ‘andar da carruagem’ e dos reiterados recuos – Código Florestal, PNDH3 – o governo e o partido dão mostras que se renderam ao pragmatismo. No lugar do embate ideológico, os acertos.
Blairo Maggi e o pastor Marco Feliciano, entretanto, não significam apenas adequações ao jogo do poder. São sintomas de algo mais profundo: Concessões na agenda de políticas públicas inclusivas para as minorias e desistência da agenda do meio ambiente como estratégica para um projeto de nação.
As nomeações do pastor Marco Feliciano e Blairo Maggi para as Comissões, as eleições de Renan Calheiros para a presidência do Senado e de Eduardo Henrique Alves para a Câmara dos Deputados e, ainda mais, a recém mini-reforma ministerial de Dilma Rousseff indicam que se trata de garantir a qualquer custo a manutenção do amplo leque de partidos na base de apoio do governo.
Na análise do Conselho Indigenista Missionário – Cimi, o cenário é ainda pior. Segundo a organização as eleições de Feliciano e Maggi “refletem simbolicamente no Legislativo a aproximação entre a presidenta Dilma Rousseff e a senadora Kátia Abreu no Executivo. Fica evidente que a ascensão destas forças de direita vem sendo alimentada e subsidiada pelas opções político-econômicas do governo brasileiro e dos principais partidos que lhe dão sustentação”.
Está em curso uma aliança estratégica entre as bancadas evangélica e ruralista com o objetivo de bloquear as reivindicações das "minorias" na Câmara dos Deputados e fazer avançar sua pauta no executivo. Assiste-se a uma aliança em que mutuamente se apoiam na defesa de suas agendas e fustigam a agenda dos setores progressistas.
O governo ao não reagir a essa articulação e ao abrir espaços às bancadas ruralista e evangélica paga um preço alto que é debitado para o conjunto da sociedade. O preço, entre outros, é o retalhamento da agenda ambiental, o abandono das causas indígenas e concessões na área de Direitos Humanos. Doravante essas agendas subordinam-se aos acertos políticos.
A agenda dos ruralistas
A chegada de Blairo Maggi, à presidência da Comissão do Meio Ambiente é demonstração de força dos ruralistas na defesa dos interesses do agronegócio.
Vitoriosos na flexibilização do Código Florestal e na aprovação de projeto que submete ao Congresso os critérios pelos índices de produtividade utilizados na reforma agrária, os ruralistas não escondem outros interesses.
Destacam-se, entre outros, a aprovação das PEC 38; PEC 237; PEC 215; apoio à portaria 303, revisão das leis do trabalho rural, revisão da PEC do trabalho escravo. Os ruralistas acompanham ainda com interesse o debate em torno do novo código de mineração.
Uma breve descrição dos conteúdos de interesse dos ruralistas:
PEC 38: De autoria do senador Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR) dá ao Senado Federal competência para aprovar processos de demarcação de terras indígenas e determina que a demarcação de terras indígenas ou unidades de conservação ambiental respeite o limite máximo de 30% da superfície de cada estado. Ao justificar a PEC, o senador afirmou que têm sido demarcados territórios desproporcionais às populações indígenas a que se destinam, o que torna amplas áreas dos estados brasileiros inaproveitadas para a exploração econômica. Ele disse que isso está inviabilizando o desenvolvimento de alguns estados.
PEC 237: De autoria de Nelson Padovani (PSC-PR) permite a posse indireta de terras indígenas por produtores rurais. A PEC acrescenta um parágrafo à Constituição para determinar que a pesquisa, o cultivo e a produção agropecuária nas terras tradicionalmente ocupadas pelos índios poderão ocorrer por concessão da União, tendo em vista o interesse nacional. O argumento do deputado é de que “a vida financeira dos índios se deteriora cada vez mais. A miséria, as doenças, o tráfico de drogas e o consumo de álcool avançam em terras indígenas” e ao utilizarem o território indígena os ruralistas poderiam contribuir com a qualidade de vida dos mesmos com a geração de renda.
PEC 215: De autoria do deputado Almir Sá (PPB/RR), está entre as principais prioridades dos ruralistas. O projeto de emenda constitucional propõe transferir do Poder Executivo para o Congresso Nacional a demarcação e homologação de terras indígenas e quilombolas, além de rever os territórios com processo fundiário e antropológico encerrado e publicado. Caso aprovado significa o fim da demarcação das terras indígenas e quilombolas que se arrastam há mais de uma década. Segundo a Constituição de 1988, o processo de demarcação das terras indígenas no país deveria ter sido terminado em 1993. Até agora muito pouco foi feito.
Portaria 303: De iniciativa da Advocacia-Geral da União (AGU), a portaria coloca em vigor as 19 condicionantes pelo STF definidas para demarcação e direito de uso de terras indígenas após o julgamento da Terra Indígena (TI) Raposa Serra do Sol. Entre os pontos polêmicos da portaria, estão a proibição da ampliação de terras indígenas já demarcadas e a garantia de participação de estados e municípios em todas as etapas do processo de demarcação. A portaria também confirma o entendimento do STF de que os direitos dos índios sobre as terras não se sobrepõem aos interesses da política de defesa nacional, ficando garantida a entrada e instalação de bases, unidades e postos militares no interior das reservas. A expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas energéticas e de “riquezas de cunho estratégico para o país” também não dependerão de consentimento das comunidades que vivem nas TIs afetadas, de acordo com as regras. Ou seja, se colocada em prática, a portaria significa porteira aberta para os interesses do agronegócio.
Revisão das leis do trabalho rural: A bancada ruralista no Congresso Nacional começou a articular um trabalho para a revisão da atual legislação trabalhista rural, considerada por ela como atrasadas e impeditiva do desenvolvimento agrícola brasileiro. Atualmente, a Lei 5.889 de 1973 regula o trabalho rural. Para o que não está previsto naquela lei, aplica-se a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), de 1943. A ideia é rever alguns aspectos das duas e elaborar uma espécie de "CLT rural" específica para o setor. Para tanto, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) contratou um escritório de advocacia que fará um levantamento das propostas de interesse do setor e sugerirá novos projetos. É evidente o interesse dos ruralistas em flexibilizar os direitos dos trabalhadores rurais assalariados.
Revisão da PEC do trabalho escravo: Depois de 11 anos tramitando no Congresso a PEC do trabalho escravo foi aprovada estabelecendo que as propriedades rurais e urbanas onde forem localizadas a exploração de trabalho escravo ou culturais ilegais de plantas psicotrópicas [drogas] serão expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação popular. O projeto diz que os proprietários não terão direito a indenização e continuarão sujeitos às punições previstas no Código Penal. Os ruralistas nunca aceitaram a aprovação da PEC e reclamam que não há definição clara em lei sobre o que é trabalho escravo e que os proprietários de terras ficam à mercê dos fiscais do Ministério do Trabalho. "Vamos definir o que é trabalho escravo, trabalho degradante e jornada exaustiva e incrementar essas definições da proposta de emenda constitucional (PEC) do Trabalho Escravo, que está no Senado", defende o vice presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária – FPA, deputado Luiz Carlos Heinze (PP-RS). Segundo os ruralistas, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), se comprometeu a colocar os projetos na pauta.
Novo código de mineração: Os ruralistas acompanham com interesse o debate em torno da legislação da exploração mineral. Apoiam o Projeto de Lei 1610 de autoria do senador Romero Jucá (PMDB-RR) que prevê a mineração em terras indígenas. Por outro lado, também tramita no Congresso o Projeto de Lei da criação do Estatuto dos Povos Indígenas que estabelece que a decisão sobre a extração dos recursos em terras indígenas seja dos próprios nativos. Depois do Código Florestal trata-se da “nova batalha anunciada”, como destaca Egon Heck.
Homofóbico na Comissão de Direitos Humanos
A eleição do deputado Marco Feliciano, do Partido Social Cristão (PSC), para presidir a Comissão de Direitos Humanos e Minorias, assim como a nomeação de Blairo Maggi para a Comissão do Meio Ambiente, evidencia a total ausência de limites nas tramoias, conchavos, alianças e acertos políticos no Congresso Nacional.
Feliciano é pastor e presidente da Igreja Assembleia de Deus – Ministério do Avivamento. Popularizou-se por meio de uma leitura fundamentalista da bíblia, tornando-se homem de palestras e de pregações pelo país. Figura emblemática na bancada evangélica, o deputado acaba de protagonizar uma dura queda de braço com os parlamentares e militantes que lutam pelos direitos das minorias, uma vez que seu histórico em nada o credencia para presidir uma Comissão tão importante como esta.
Pesa contra Feliciano o conteúdo preconceituoso e racista de suas próprias palavras. Segundo reportagem de Mario Coelho, publicada no sítio Congresso em Foco, o deputado, em 2011, em seu Twitter, chamou os negros de “descendentes amaldiçoados de Noé” e contra os homossexuais afirmou que “a podridão dos sentimentos homoafetivos levam (sic) ao ódio, ao crime, à rejeição”. No início deste ano, o procurador geral da República, Roberto Gurgel, o denunciou por homofobia, isto sem contar que já é alvo de processo por estelionato no Supremo Tribunal Federal, em razão de faltar num evento pelo qual já havia recebido. Além de fechar a questão, sem chances para o debate, quando o assunto é o casamento igualitário e o aborto.
Feliciano costuma confundir o seu mandato parlamentar com a sua opção religiosa. Entre as muitas das suas polêmicas declarações públicas, já teria afirmado que encara o seu mandato político como extensão de seu ministério, “cuja responsabilidade maior é dignificar o nome de Jesus Cristo”. É autor de um projeto que obriga a Casa da Moeda a inscrever a expressão “Deus seja louvado” nas cédulas de real e, também, é o proponente de um projeto que cria o Programa Nacional Papai do Céu na Escola. Feliciano considera que é preciso “resgatar o ensino religioso em nosso País de maneira sábia, simples, coerente e contínua. Queremos ver os filhos desta Nação olhando para a imensidão do cosmos e dizendo: Há um papai do céu que cuida de nós”. Como se não bastasse, o deputado-pastor defende a internação de “estupradores contumazes”, com a possibilidade de castração química.
Ao defender o seu próprio nome para a presidência da Comissão, Feliciano já se comparou até mesmo com Martin Luther King, lembrando que este era um pastor pentecostal que lutava pelos direitos humanos. Considerando-se um perseguido religioso, vítima da “cristofobia”, Feliciano já havia dito, antes de sua nomeação, que desejava acabar com o que considera privilégios da comunidade LGBT na Comissão de Direitos Humanos, considerando que o país vive uma ditadura gay.
A verdade é que com a nomeação de Marco Feliciano, todo o Congresso Nacional só vê aumentar ainda mais a desmoralização nacional dos parlamentares. Se o país já conta com um ascendente processo de descrença em seu sistema representativo, nomear alguém que nada entende de Direitos Humanos, com suas posturas fundamentalistas, para ocupar uma função tão cara aos movimentos sociais é mais do que um insulto.
Sociedade civil e movimentos sociais reagem
Diante de uma nomeação tão esdrúxula, as manifestações contrárias aos acordos parlamentares não tardaram. O Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic) elaborou uma nota contra a nomeação do deputado, expressando “repúdio ao processo que levou à escolha do deputado Marco Feliciano (PSC), por suas declarações públicas, verbais e escritas de conteúdo discriminatório, de cunho racista e preconceituoso contra minorias, pelas quais responde a processos que tramitam no Supremo Tribunal Federal”.
O presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), Carlos Magno, também lamentou a indicação de Marco Feliciano, considerando este fato “um retrocesso para o País”, já que a comissão é tida como estratégica para os gays.
Ainda mais profundo foi o posicionamento do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), que considerou que a nomeação do deputado responde a “acordos pré-estabelecidos entre forças conservadoras e fundamentalistas, de diferentes matizes, presentes e fortalecidas no Congresso Nacional – ao contrário dos grupos que tradicionalmente buscam defesas e garantias de direitos e afirmação na Comissão de Direitos Humanos”. A preocupação do CIMI é a de que os povos indígenas, quilombolas, ribeirinhos, pescadores artesanais, camponeses, homossexuais, mulheres, negros, vítimas da ditadura militar, trabalhadores em situação análoga à escravidão, familiares de vítimas de grupos policiais de extermínio e defensores do meio ambiente sejam ignorados por um canal institucional que existe para defendê-los e não para ser ocupado por forças reacionárias e avessas ao reconhecimento da diversidade sociocultural.
Contudo, a cobrança dos movimentos não recaiu somente sobre o parlamento, um grupo de 47 organizações assinou um documento no qual cobram um posicionamento da Secretaria dos Direitos Humanos (SDH) frente à nomeação de alguém publicamente considerado racista, sexista e homofóbico. No parecer destas organizações, “a SDH deveria questionar interna e publicamente medidas do próprio governo que retrocedem na garantia dos direitos humanos e fortalecem o fundamentalismo religioso, em uma clara violação da laicidade do Estado”.
Os arranjos políticos e a ortodoxia da bancada evangélica
O deputado Marco Feliciano não se deixou intimidar pelas pressões da sociedade, sendo respaldado pelo seu partido. O PSC ratificou o nome do deputado, ignorando as pressões sociais e pautando-se na prerrogativa de direito à vaga, fruto de acordo feito entre lideranças partidárias que dividiram as 21 comissões permanentes da Câmara.
Todo este processo ocorreu com o aval do Partido dos Trabalhadores (PT), que tradicionalmente era responsável pela Comissão de Direitos Humanos. Crítico desta manobra, o deputado Jean Wyllys (PSOL) afirmou que tudo “leva a crer que houve um acordo de bastidor. Na véspera de uma eleição presidencial, em que há candidatos (da oposição) que não são favas contadas, o governo precisará dos evangélicos. A reeleição (de Dilma) não pode correr risco”.
Afora os interesses majoritários do PT, o secretário nacional de Movimentos Populares do partido, Renato Simões se posicionou contrário à nomeação de Feliciano, dizendo que este “se arrogou como propagandista de posturas político-ideológicas contrárias aos direitos humanos consagrados na Constituição e nos documentos internacionais do Sistema de Direitos Humanos referendados pelo Brasil”. Segundo Simões, o episódio deveria servir de lição ao PT para que “negociações interpartidárias levem em conta o perfil do partido e dos seus indicados para a presidência de uma instituição tão cara aos movimentos sociais”.
Como de costume, a interferência religiosa no campo político continua aparentando ser uma questão intransponível na cultura política brasileira. Nos últimos anos, tem se fortalecido ainda mais a instrumentalização religiosa para fins eleitorais. O pano de fundo da nomeação de Marco Feliciano está relacionado com a formação das alianças políticas de sustentação governista e com as costuras eleitorais para 2014. O governo não pode abrir mão do diálogo e parceria com a bancada evangélica, sob o risco de fracassar em muitas das suas ambições.
Na opinião do sociólogo Ricardo Mariano, “a presença e o ativismo político dos pentecostais vêm ganhando terreno a passos largos. Trata-se de um ativismo político recheado de moralismo e corporativismo e, desde a Constituinte, marcados por escândalos”. Em prol desta tese, Mariano destaca uma pesquisa feita pela ONG Transparência Brasil, revelando “que 95% dos membros da bancada evangélica estão entre os mais faltosos do Congresso Nacional e, em sua maioria, são objetos de processos judiciais, enquanto, segundo o DIAP, 87% deles constam entre os “mais inexpressivos”.
O sociólogo aponta ainda que “à medida que correm atrás de apoio, voto e legitimação providos por líderes e rebanhos religiosos, nossos políticos, partidos e governantes contribuem para reduzir a autonomia da política em relação aos poderes eclesiásticos e a seus rompantes moralistas, integristas e fundamentalistas”. Desta forma, impede-se que “questões públicas fundamentais sejam tratadas e debatidas a partir de visões de mundo, expertises e conhecimentos seculares radicados na ciência, na medicina, na saúde pública, nos direitos humanos e daí por diante. Impedem, portanto, a secularização do encaminhamento e tratamento de uma série de problemas”.
É bom lembrar que, junto a outras forças conservadoras da sociedade, a bancada evangélica sempre foi uma forte opositora ao Programa Nacional de Direitos Humanos 3 (PHN-3), fazendo uso político-eleitoral desta oposição. Em 2010, o Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH) precisou divulgar uma nota pública em defesa do Programa. Na oportunidade, o MNDH salientou que a oposição ao PNH-3 deve-se ao fato do mesmo tocar “em temas fundamentais e substantivos que fazem com que caia a máscara antidemocrática destes setores”.
Assim, estas posições conservadoras podem ser entendidas como “posturas refratárias aos direitos humanos, ainda lamentavelmente tão disseminadas e que se manifestam no racismo que discrimina negros, ciganos, indígenas e outros grupos sociais; no machismo que mantém a violência contra a mulher; no patriarcalismo que violenta crianças e adolescentes; no patrimonialismo que quer o Estado a serviço de interesses e setores privados; no revanchismo de setores militares, que insistem em ocultar a verdade sobre o período da ditadura militar [...]; na falta de abertura para a liberdade e a diversidade religiosa que impede o cumprimento do preceito constitucional da laicidade do Estado; no elitismo que se traduz na persistência da desigualdade como uma das piores do mundo, enfim, na criminalização da juventude e da pobreza e na desmoralização e criminalização de movimentos sociais e de defensores de direitos humanos.
Quando alguém como Marco Feliciano ocupa uma cadeira tão importante como a da presidência da Comissão dos Direitos Humanos, percebe-se o quanto são fortes os interesses reacionários e que as investidas em favor dos direitos humanos e das minorias ainda são muito tímidas, já que a conciliação política sempre tem neutralizado o acesso aos direitos que a Constituição garante ou deveria garantir para todos.
Governabilidade e agenda social
Para não melindrar sua base de apoio político, o governo vai se desfigurando sempre mais. Tudo se tornou negociável. As nomeações de Blairo Maggi para a Comissão do Meio Ambiente e de Marco Feliciano para a Comissão de Direitos Humanos é mais um capítulo das reiteradas concessões do governo aos setores conservadores.
Em outras análises já destacamos as contradições do governo. Uma dessas demonstrações, dentre outras, se deu com a nomeação do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) para o ministério das Cidades e a manutenção do ministro Fernando Bezerra de Souza Coelho (PSB-PE) no ministério da Integração Nacional após intenso tiroteio de acusações de corrupção. Os dois ministros, outros poderiam ser citados, são lídimos representantes das velhas oligarquias – como destaca o sociólogo Werneck Vianna, - que se mantêm no poder desde a época do coronelismo.
A porção do Brasil atrasado na coalizão do governo não se manifesta, porém, apenas através das oligarquias ligadas ao latifúndio. A camisa de força imposta pelo modo aliancista de governar adotado pelo PT se mostra ainda no retrocesso em outras temáticas como se viu no debate do kit anti-homofobia e do aborto.
O governo de coalizão, amplo, gelatinoso e de espectro ideológico diverso na base do governo Dilma Rousseff é justificado como necessária e indispensável para a manutenção da governabilidade. Nessa equação de poder perdem os setores mais vulneráveis e sem voz ativa e representativa no parlamento.
As nomeações do ruralista Blairo Maggi e do homofóbico Marco Feliciano indicam que o governo não quer briga com os grupos que considera importantes para a governabilidade. Via de regra os seus pedidos ou lobbies avançam junto ao governo. Já os grupos sociais como indígenas, sem terra, quilombolas e ambientalistas, entre outros, como não ameaçam a governabilidade podem esperar sempre um pouco mais.
http://www.ihu.unisinos.br/noticias/518492-conjuntura
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário