16 de agosto de 2012

Uma Igreja sem Deus?



Ou uma Igreja com um falso deus?
Ou uma Igreja que adora um deus que não é deus, mas se faz passar como tal?
Ou uma Igreja que diz adorar um Deus, mas na prática adora outro?
Ou o deus que não é deus, mas é tornado deus pela prática de vida dos crentes de outro Deus?
Ou continuamos a velha briga pelo monoteísmo como no AT?
Mas, que confusão é essa?

J. L. Hromádka - pastor e professor em Praga e falecido em 1969 disse num artigo de 1969: 'Situation im Licht des Evangeliums': "Die christliche Kirche kann heute und in Zukunft nur überleben, wenn sie eine Gemeinschaft von wirklich Gläubigen ist. Ich fürchte nicht so sehr den Atheismus ausserhalb der Kirche wie eine gottlose Kirche, die alles kirchliche Zubehör, alle historischen Hierarchien, alle liturgischen Formen und sakramentalen Akte bewart hat, deren äussere Struktur aber völlig leer ist. Stellen sie sich das schreckliche Bild des Allerheiligsten und seines Altars vor - ohne Gott. Dies ist natürlich ein Schreckensbild, das aber in der gegenwärtigen Situation des formalen Christentums seine Berechtigung hat."

Na Europa nos anos 60 se falava da morte de Deus. E Hromádka fala aqui de uma Igreja sem Deus. Ele lembra que o problema maior não é o ateísmo fora da Igreja, mas a Igreja sem Deus. Uma Igreja que carrega tudo o que ela produziu durante séculos consigo, mas não tem mais Deus dentro dela. Frei Betto dizia que o problema para a Igreja não são os ateus fora dela, mas os fariseus que nela estão.

Este é um problema da Europa do passado e quem sabe do presente, mas não é um problema brasileiro. Aqui a Igreja Cristã está cheia de Deus e aqui Deus nunca morreu. Por aqui nunca se falaria de uma Igreja sem Deus e da morte de Deus. Deus sempre esteve presente nas Igrejas Cristãs brasileiras, pois 95% da população brasileira crêem em Deus. Como diz o povo: "Deus é brasileiro'' e "Deus é o mesmo". Eu sempre ouvia isto (Deus é o mesmo) quando uma família luterana saída de nossa Igreja para entrar na Igreja Católica ou Congregacional, porque ali a contribuição era mais barata, eu dizia: Não é bem assim. Hoje eu concordo: Deus é o mesmo, mesmo!

A questão é de que Deus estamos falando? Deus, em maiúsculo, ou deus, em minúsculo? A Igreja Brasileira está cheia do deus, em minúsculo, e é este o mesmo deus do povo, com suas devidas exceções. Deus é o mesmo, dos católicos, dos crentes, dos luteranos, etc. Qual Deus? Javé/Jesus Cristo/Espírito Santo? Não, o deus capital. É este o deus brasileiro. É este o deus da esmagadora maioria dos cristãos. O povo sempre diz que deus é brasileiro. É verdade, deus é brasileiro, mas é este deus, o capital, que é o deus dos brasileiros: dos católicos, dos luteranos, dos pentecostais, etc. Apesar de que sabemos que o deus capital é planetário (porque o capitalismo é inviável num país só, como também o socialismo), não universal. Como posso dizer isto? Porque é a teologia do deus capital que predomina nas pregações das igrejas brasileiras. Só se fala, normalmente, o que os capitalistas que mandam na igreja permitem. Até prova em contrária continuo afirmando isto. Normalmente, pregação pura e reta do Evangelho de Jesus Cristo na Igreja é história para boi dormir. A teologia da prosperidade no meio pentecostal (e de outras igrejas), que, diga-se de passagem, o IBGE demonstrou e desmontou a sua eficácia mostrando no último censo que os pentecostais continuam pobres. O Censo reitera o crescimento do pentecostalismo na base da pirâmide social: 64% dos pentecostais ganham até um salário mínimo (são miseráveis), 28% recebem entre um e três salários - são pobres (somando temos 92% dos pentecostais que são pobres), 42% têm ensino fundamental incompleto. Não preciso nem olhar as estatísticas do IBGE para saber disto, pois o capitalismo explica isto: não dá para todos serem ricos no capitalismo. Ninguém fica rico por ter sido abençoado por Deus, só se fica rico roubando parte do trabalho feito e que não foi pago para a classe trabalhadora (Tg 5). Todo rico é ladrão ou filho de ladrão, dizia João Crisóstomo, bispo de Antioquia que morreu no exílio em 407 d.C. por não falar a linguagem do imperador.

O pior é que tem pastores/as da IECLB namorando a teologia pentecostal, alguns até já se casaram com ela. Quem deveria enxergar isto não vê nada. Por que? Porque tem medo do deus capital e de seus fiéis seguidores que mandam na Igreja e que se assentam nos primeiros bancos da igreja. Na Igreja se adora Jesus Cristo na forma teológica do deus capital. Fala-se de Jesus Cristo a partir da teologia do deus capital para legitimá-lo e reproduzi-lo. Transformou-se a teologia em ideologia. Isto que nós da teologia da libertação sempre fomos acusados pela direita de fazermos isto porque denunciamos a idolatria do capital. É a inversão da realidade que a teologia do deus capital faz para enganar o povo. O termo diabo vem do grego que significa: aquele que inverte as coisas, aquele que embaralha as coisas. O deus capital faz isto, porque é este o papel do diabo. Disto tiramos a conclusão que na igreja se prega a teologia do diabo e se adora o diabo como se fosse Deus, pois não se permite questionar o capitalismo e nem dizer que ele não é um instrumento de Deus, mas do diabo. Pois o papel do diabo é impedir pelo capitalismo que o Reino de Deus seja construído. O capitalismo é um instrumento, entre outros, que o diabo usa para tentar impedir a construção do Reino de Deus, que é a tarefa e a mensagem central de Jesus Cristo. Através da Igreja o diabo procura redirecionar a fé do cristão para a teologia do capital para que não participe da construção do Reino de Deus que é a desconstrução do capitalismo. A essência da fé em Jesus Cristo é insurgente e revolucionária e o diabo usa a Igreja para tornar a fé em Jesus Cristo acomodadora à realidade e à dinâmica do capital, tornando a fé reacionária.

Falando em dados estatísticos de 2010 (de pessoas de 10 anos a mais), eles nos mostram que temos redondos 270.451 ricos no Brasil, que recebem acima de 30 salários mínimos mensais, temos 159 milhões de pobres, que recebem até três salários mínimos e 2,4 milhões de classe média que recebem de 10 a 30 salários mínimos. De 3 a 30 SM são 16,6 milhões. 51% da população economicamente ativa recebem até 1 salário mínimo que somam 44,4 milhões, são os miseráveis. Os homens recebem mensalmente em média R$ 963,65 e as mulheres recebem em média apenas R$ 559,85. O Patriarcado é um grande aliado do capitalismo. Menos de 1 SM é indigente, 1 SM é miserável e até 3 SM é pobre; temos ainda 14 milhões de remediados que ficam entre os 3 SM e os 10 SM, que são a classe C de consumo (que nada tem a ver com Classe Média). Temos estes belos números apesar do ganho real do SM de 65% no governo Lula, que ao assumir o governo tínhamos o salário mínimo valendo 30,7% do valor de 1940 e em 2010 ele já valia 48%. Isto significa que ele ainda tem condições de recuperar os outros 52% que faltam para empatarmos com 1940 e depois disto tornar o Salário Mínimo num salário digno. Vemos, assim, que temos muito caminho pela frente.

Houve um aumento do valor do SM e isto não gerou inflação, o que sempre se dizia nos anos 80/90. Não dá para valorizar o SM, pois isto gera inflação. Lula mostrou que isto é uma mentira. O Brasil continua com o menor SM da América Latina. Perdemos até para o Paraguai. Isto que o SM hoje vale quase 300 dólares, quando no tempo do FHC valia 75 dólares e a grande propaganda de campanha era chegar aos 100 dólares, coisa que parecia impossível, ouvindo os empresários. 

Em se falando da terra, a realidade é a mesma. As propriedades de grande porte que somam 1,9% detêm 51,7% da terra. A Reforma Agrária? O capitalismo já a sepultou (e o PT também), o que não significa que devemos parar de lutar por ela porque existem 228 milhões de hectares de terra improdutiva (40% do total) segundo o Censo de 2006, que usa os dados de produtividade de 1975. Se usasse dados atualizados haveria mais terra ainda disponível para Reforma Agrária. Precisamos desapropriar apenas 69 mil fazendeiros de um universo de 5 milhões de propriedades. O agronegócio que fica guspindo alto quando fala de sua produção para exportação esquece-se de dizer que por hectare de terra a agricultura camponesa produz o dobro: 677 reais contra 358 reais da agricultura patronal por hectare. Agora esse pessoal do agronegócio, falando de sua 'grande capacidade produtiva' (que é a metade da agricultura camponesa, tanto nos valores produzidos por hectare como pela manutenção de mão de obra que é de 1,7 para 15,3 a cada 100 hectares de terra da agricultura camponesa) quer se adonar das terras indígenas e reservas naturais e impedir que surjam novas áreas colocando o Congresso Nacional na jogada pela PEC 215 e a Portaria 303 da AGU.

A partir desta realidade estamos falando de Deus na Igreja. Na verdade na IECLB não se fala mais a partir destes dados da realidade, pois se prega a partir das nuvens ou a partir do mero individualismo (salvação individual sem compromisso coletivo que parte da fé para acolher as vítimas do sistema opressor no qual vivemos), como se a pessoa vivesse no espaço sideral, e não no Planeta Terra, especificamente num país chamado Brasil. Por que? Porque isto está proibido pela classe capitalista que manda na Igreja. Onde esta proibição está escrita e onde isto foi decidido? Não está escrito em lugar nenhum, mas todos/as pastores/as que são minimamente espertos sabem que esta decisão é real. Se infringir esta decisão o facão do TAM e da Avaliação come solto, sem, no entanto, se referir à esta decisão; acha-se qualquer outro motivo banal como: o pastor estava estendendo roupa no varal e isto não é trabalho doméstico que um pastor pode fazer. Olha que isto aconteceu de fato em Ijuí, RS, na Paróquia chamada 'da Paz'. Imagina se esta paróquia se chamasse 'da Discórdia'? Isto é de chorar em alemão, como fala o povo daqui. E como dizia o profeta Amós: "Am 5.13: Portanto, o que for prudente guardará, então, silêncio, porque é tempo mau." Por isso a teologia da prosperidade, que é a teologia do engodo, como mostram os dados do IBGE, pois os pentecostais não saíram da pobreza, é tão atrativa. Quem o povo brasileiro vai adorar nas igrejas? Jesus Cristo? Não, o deus capital, jurando de pés juntos que estão indo adorar a Jesus Cristo. O deus capital promete, mas nunca cumpre suas promessas, no entanto, é muito bom e eficiente na sua propaganda e no seu mecanismo de persuasão: não falou o que agrada ao deus capital vai para a rua, senhor/a pastor/a e senhor padre. A CPT não fala o que o deus capital exige, então o bispo, à serviço do deus capital, a proíbe, do alto de seu poder hierárquico feudal, em sua diocese.

Numa reunião de uma comunidade da IECLB o presidente da comunidade distribuiu os 'santinhos' de seu filho candidato a vereador pelo PSD (partido originário da ARENA, via PP e DEM. Aquele partido que legitimou e apoiou a Ditadura civil-militar de 64 que matou 457 pessoas que lutavam pela democracia, mais 370 camponeses, mais 5 mil indígenas e torturou outras 30 mil pessoas, tudo como sendo política de estado. É bom sempre de novo lembrarmos disto; apoiar esta turma é apoiar assassinos e torturadores e é legitimar o passado opressor.), mas em reunião ou encontro do movimento popular ou sindical o/a pastor/a não pode participar porque isto é fazer política, pois fazer política de esquerda é proibido na Igreja. Fazer política de direita sempre foi permitido na Igreja, pois para eles isto não é fazer política, é normal (afinal a Igreja não está aí para defender e reproduzir o capital?), é isto que se tem que fazer. Hipocrisia e cara de pau, sempre foram o forte na Igreja onde manda o deus capital dizendo ser Jesus Cristo.

O pastor Baeske uma vez contou esta história:
"Certa vez, o diabo quis oferecer auxílio a Martim (cristão do século 4, caridoso e militante na fé; após a morte virou um dos santos mais populares). Daí o diabo lhe apareceu na figura de um rei majestoso e falou: “Martim, eu te agradeço por tua fidelidade. Experimenta agora como eu sou fiel a ti. Por isso, agarra firme em mim”.
Martim perguntou: “Mas quem és tu afinal?”
“Eu sou Jesus, o Cristo”, respondeu o diabo.
Martim retrucou: “Onde estão os teus ferimentos?”
O diabo: “Eu venho da glória do céu e lá não tem ferimento nenhum”.
Ao que Martim concluiu: “Não quero ver o Cristo sem ferimentos. Pois não posso me agarrar no Cristo que não carrega os sinais da cruz”."

Na IECLB a maioria das comunidades prefere o Cristo sem a Cruz, pois na maioria de suas igrejas não encontramos um crucifixo, apenas uma cruz vazia. É a teologia da glória em detrimento da teologia da cruz, defendida por Lutero, que aprendeu esta teologia de Paulo. Na igreja em Carazinho temos um crucifixo enorme atrás do altar, o que é correto, bom é termos uma cruz vazia e um crucifixo, porque não dá para separar a Sexta Feira Santa da Páscoa. O Cristo ressurreto quando aparece aos discípulos é sempre o Cristo crucificado que mostra as marcas dos pregos (Lc 24.36-43) e come algo para mostrar a ressurreição do corpo e não da alma somente. Pastor que tira do altar o crucifixo, a cruz vazia, as velas tem que ingressar numa igreja pentecostal, ali é o seu lugar. Uma Igreja que não consegue ter uma teologia litúrgica clara e viabilizá-la deixa de ser Igreja de Jesus Cristo, pois é pela liturgia, vestes litúrgicas e símbolos que a Igreja se apresenta visivelmente, juntamente com o seu trabalho diaconal de andar junto com o povo explorado pelo capital em suas lutas concretas por melhores salários, moradia digna, por Reforma Agrária, melhores preços para os produtos dos camponeses, na organização no todo da classe trabalhadora, etc. Uma destas igrejas que não tem sensibilidade para com a miséria do povo, das quais fala Hromádka, é uma Igreja sem Deus, ou melhor, uma igreja do deus capital, onde 'Deus é o mesmo' da igreja e do shopping center. Não estou falando da IECLB, pois ali temos clareza na prática teológica e litúrgica! Na IECLB os membros do Rio Grande do Sul que eventualmente freqüentarem um culto no Nordeste ou no Sínodo Centro-Sul Catarinense se reconhecerão nela pela liturgia, pelas vestes litúrgicas, pelos hinos, pela pregação, tudo pura tradição evangélica luterana! Tudo impecável! Pois temos uma direção da igreja que zela pela pureza litúrgica e teológica evangélica luterana na igreja, a começar pelos pastores sinodais!

J. L. Hromádka lembra ao falar de Jesus Cristo: "Die Priester und Rabiner in der Synagoge schlossen ihn aus ihrem Kreise aus. Er lebte mit den Sündern dieser Welt, mit Trinkern um Zöllnern. Er kam nicht, einen Kreuzug gegen Sündern, Skeptiker und Atheiste zu organizieren. Er verabscheute nicht die säkulare, sündige Welt, sondern vielmehr die Tempel und Synagogen, Pharisäer und öffentlichen Vertreter de Religion. Nur wenn wir ihn auf gewöhnlichen Strassen und Wegen, in Gesellschaft gewöhnlicher, schwacher und irrender Männer und Frauen sehen, können wir sein Kampf für den Menschen verstehen.
… Es besteht keine Hoffnung für unsere Kirche, wenn sie ihr Ansehen und ihre Privilegien, ihre Routinen und Traditionen aufrechtzuerhalten versuchen, wenn sie das tiefste Elend und die menschliche Sünde nicht verstehen und wenn sie heute keine Verantwortung für die unglücklichen Menschen übernehmen, ohne Rücksicht darauf, ob sie gläubig sind oder nicht, ob sie formal Mitglieder unserer Gemeinden sind oder nicht. Für Jesus hatte sein Dienst keine Grenzen. Für die Kirche hat ihr Dienst keine Grenzes."

Por isso o Concílio Geral de 1982 a IECLB decidiu fazer um trabalho de base com formação teológica com o povo explorado pelo capital: "- assumir e defender com responsabilidade evangélica as reivindicações dos movimentos sociais, fazendo um trabalho de base com associações de bairros, atingidos por barragens, colonos sem terra, bóias-frias, sindicatos, proteção ambiental, além de inúmeras outras formas de atuação onde o amor de Deus quer se tornar vivo e real entre as pessoas."

Decidir fazer e fazer são duas coisas totalmente diferentes, como sabemos, pois a correlação de forças em benefício do capital dentro da Igreja impediu que este serviço evangélico diaconal se realizasse. E o diabo dá risada! Feliz da vida. Ganhou mais essa batalha com o auxílio dos assim chamados cristãos convertidos da IECLB favorecendo o seu projeto, o projeto do capital. Cristãos mais fiéis do que os da IECLB o diabo não precisa.

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